Cinema com Rapadura

Colunas   sábado, 02 de junho de 2012

Metragem: Curta nacional aborda a pornografia na internet

"Memórias Externas de uma Mulher Serrilhada", de Eduardo Kishimoto, discute a exposição na grande rede.

Foram quase dois anos para a realização de “Memórias Externas de uma Mulher Serrilhada”, mas o trabalho do cineasta Eduardo Kishimoto (do curta “A Psicose de Valter”) começou bem antes. Leituras e pesquisas sobre a internet e as novas tecnologias fizeram parte do cotidiano do diretor para tematizar a privacidade dos internautas em um curta-metragem. Em competição na Janela Internacional, do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba, o curta foi bastante comentado por sua ousadia de linguagem e pela pretensão em repescar um tema aparentemente batido.

Mas o que Kishimoto cria em “Memórias Externas de uma Mulher Serrilhada” é uma releitura sobre a exposição e o assédio na web, agora que há facilidade para registrar fatos cotidianos direto de uma câmera de celular e outros dispositivos de filmagem. Na trama, Josi (Ana Georgina Castro, de “O Céu de Suely”) é mais uma vítima de um homem que supostamente “vazou” um vídeo contendo relações íntimas do casal na grande rede. Após o incidente, a vida da moça se transforma em um inferno.

Em conversa com o Cinema com Rapadura, Kishimoto conta que um dos pontos mais curiosos do curta é a reação do público assistindo à projeção.

“A maioria das pessoas acessa pornografia na internet, mas quando vemos uma história que nos é familiar sendo contada no cinema, a gente se distancia. As pessoas passam por uma espécie de constrangimento coletivo”, disse.

Formado em Cinema e Vídeo pela ECA-USP, Kishimoto se considerava old school para investir em uma linguagem tão moderna quanto as novas tecnologias. O curta é inteiramente filmado com webcams, câmeras fotográficas e celulares, em uma montagem frenética que dá a sensação de estar acompanhando um reality show.

“Fizemos de uma forma diferente da convencional. Não chegávamos às locações com claquetes, por exemplo, para aproveitar a naturalidade do ‘cenário'”, contou.

A experiência mais tradicional no cinema de Kishimoto não atrapalhou na realização deste novo projeto. A temática, sempre atual, é apenas uma parcela da eficácia do curta, que abusa dos modos de fazer e resulta em uma maravilhosa experiência cinematográfica. Para chegar ao último corte, o filme precisou ser milimetricamente construído. As dificuldades de finalização existiram pela diversidade de imagens que o cineasta conseguiu, e o resultado impressiona.

“Tive que me reciclar na linguagem cinematográfica, mas trouxe comigo a experiência de set e o cuidado em fazer vários testes antes de rodar, além de pesquisas de campo, testes de luz e câmera. Conseguimos revelar bons trechos em 35mm para testar como ficaria na telona, já que a maior dificuldade era alinhar os vários tipos de câmera, luz e sons”, finalizou.

A falta de privacidade, que anda junto com o avanço da tecnologia e o espírito voyeur das pessoas, desperta na protagonista um terceiro ato memorável, onde ela expõe toda a sua revolta e, ao mesmo tempo, a incapacidade de controlar tais situações externas. É o que justamente acontece: o controle sobre os conteúdos virtuais é limitado, cada vez mais as pessoas mostram suas vidas na web e chega-se a um ponto em que a terra de todos pode preocupar.

Disparando como um dos favoritos aos prêmios do Olhar de Cinema, o curta realiza boas campanhas em festivais nacionais, sempre elogiado por público e crítica.  Assista ao trailer abaixo:

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O Cinema com Rapadura está em Curitiba (PR) a convite do evento.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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