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Colunas   sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

The Mandalorian | Sétimo episódio prepara o terreno para confronto final entre protagonista e moff Gideon

Episódio marca o retorno de Rick Famuyiwa como roteirista e diretor.

Atenção: este texto contém spoilers do sétimo episódio da segunda temporada de “The Mandalorian”. Siga por sua conta e risco.

O penúltimo episódio da temporada de “The Mandalorian” não foi bem o que o público esperava em termos de prelúdio ao capítulo final, mas mantém o alto nível do restante da temporada. A essa altura, um capítulo carregado de ação já é costume, mas, mesmo assim, dentro do esquema costumeiro de cada episódio começar e terminar em si mesma, O Que Acredita supera as expectativas com uma trama extremamente sensível – apesar da ação. Ele ainda traz novas revelações sobre o estado da galáxia, uma nova quebra de barreira para o Mandaloriano (Pedro Pascal) e, nos minutos finais, prepara rapidamente o terreno para o confronto final entre o protagonista e o vilão moff Gideon (Giancarlo Esposito) para resgatar Grogu. Tudo isso acontece pelas mãos de Rick Famuyiwa, que retorna como roteirista e diretor.

No final do episódio anterior, A Tragédia, o Mandaloriano retorna a Nevarro para pedir ajuda a Cara Dune (Gina Carano), agora uma marechal da Nova República. Para conseguir as coordenadas do cruzador Aquitens de moff Gideon, o Mando precisa de um imperial para acessar o sistema, e recorre a seu antigo colega Mayfeld (Bill Burr), que fora preso em O Prisioneiro. Uma vez com ele sob custódia de Dune, o trio segue para o planeta Morak junto a Boba Fett (Temuera Morrison) e Fennec Shand (Ming-Na Wen) a bordo da Slave I.

Morak é o típico planeta da Orla Exterior, com população pobre e infestado de piratas. A pouca presença de um regime político – o Império, no caso – ocorre apenas em interesse próprio, explorando recursos naturais escassos. E é justamente onde há uma refinaria imperial na qual Mayfeld pode acessar as coordenadas necessárias. A instalação é gerida pela BSI, divisão de inteligência imperial que tem o registro de todos os criminosos ou rebeldes que lutam contra eles. Por isso, a única opção para o grupo é o Mando infiltrar a base com Mayfeld, enquanto o restante fornece suporte à distância.

A primeira metade do episódio é uma extensa cena de perseguição, na qual a dupla precisa conduzir um veículo carregado de ridônio, material extremamente inflamável e sensível, até a base do Império, sendo essa a única forma de infiltrá-la. Para isso, o Mandaloriano precisa passar por dois desafios: primeiro é resistir a sucessivos ataques de piratas e, ainda mais importante, fazer isso sem sua armadura mandaloriana, usando trajes de piloto imperial. Apesar dos pesares, tudo dá certo, e a dupla consegue adentrar a base.

Essa sequência é importante para que se coloque em perspectiva os acontecimentos todos do capítulo. Dentro do transporte, Mayfeld provoca Mando por causa de seu suposto idealismo, chegando a afirmar que, para o povo de um planeta como Morak, não faz diferença quem está no poder: “em algum lugar, alguém nessa galáxia manda, enquanto os outros obedecem.” Logo em seguida, quando são atacados por piratas – ou seres que tentam retomar seu planeta? – a dupla acaba sendo salva por dois TIE Fighters, e é mostrado um lado do Império que, por um breve momento, chega até a ser um pouco simpático.

Já a segunda metade do capítulo ocorre dentro da instalação e impõe grandes desafios a nível pessoal para o Mandaloriano e Mayfeld, que é incapaz de acessar o terminal de dados por medo de ser reconhecido por Valin Hess (Richard Brake), oficial que liderava o último batalhão sob o qual servira no Império. A solução então é o Mando acessar o terminal… Sem seu capacete, já que o sistema apenas funciona por meio de reconhecimento facial. Relutante, ele remove o capacete em frente a todos os imperiais presentes e Mayfeld, mas consegue o que precisa. Vale lembrar que, a essa altura, Din Djarin já viu outros mandalorianos sem capacete, entre eles Bo-Katan Kryze (Katee Sackhoff), maior candidata ao posto de líder dos mandalorianos, e Boba Fett (apesar de ainda haver quem coloque em dúvida esse status).

Hess, observando de longe, acha tudo muito estranho e resolve chamar a atenção dos supostos pilotos. Sentados à mesa, o imperial tenta provocar Mando e Mayfeld, com o intuito de desmascará-los. O que segue é uma das melhores cenas de toda a franquia, evocando um pouco a cena do bar de “Bastardos Inglórios“, de Quentin Tarantino. Apesar de Mayfeld ser um personagem secundário (ou nem isso), sua consciência pesa por todo o mal que fizera em seus tempos como oficial do Império, ficando evidente o stress pós-traumático com o qual ele ainda tem que lidar. E, assim como seria em um filme de Tarantino, a cena termina com um tiroteio e resulta na fuga dos dois. Eles são resgatados por Boba Fett abordo da Slave I, que utiliza uma bomba sísmica para destruir os TIE Fighters em perseguição – possivelmente os mesmos que salvaram a dupla principal do episódio anteriormente. Durante a fuga, Mayfeld destrói a base imperial, tirando um pouco do peso de sua consciência.

No fim, Mando e Dune abrem uma exceção para Mayfeld e o deixam fugir em vez de levá-lo de volta ao planeta prisão da Nova República; ele será oficialmente dado como morto nos registros do governo. De volta à Slave I, o Mandaloriano manda uma mensagem para moff Gideon usando as mesmas palavras que o vilão usou para intimidá-lo no capítulo final da primeira temporada, Redenção. Esse epílogo pode servir também como prelúdio do final da segunda temporada, antecipando o confronto entre a equipe liderada por Mando e as tropas imperiais de moff Gideon. Em jogo: o menino Grogu.

O principal problema do episódio reside no mecanismo de reconhecimento facial do Império, que, na verdade, aceita qualquer rosto que não seja de criminosos ou rebeldes. Até o momento, nunca foi mencionado se Din Djarin serviu o Império. Acredita-se que não, mas ele ter seu acesso liberado pelo terminal de dados acende essa dúvida. Ou é apenas um furo de roteiro em prol do andamento da história, algo que não estamos muito acostumados a ver em “The Mandalorian”.

Mesmo assim, há diversos pontos positivos em O Que Acredita. Rick Famuyiwa já havia escrito e dirigido o sexto episódio da primeira temporada, O Prisioneiro, e dirigido o segundo episódio da série, A Criança. Aqui, ele demonstra um conhecimento importante do cânone de “Star Wars” ao introduzir termos como BSI e Operação Cinzas ao live-action. Seus roteiros são marcados por episódios que desafiam o protagonista de alguma forma, seja em suas crenças ou o obrigando a confrontar algum aspecto de seu passado. Aqui temos um exemplo do primeiro caso, com o Mandaloriano removendo seu capacete em público pela primeira vez desde que o conhecemos. A essa altura, sabemos que ele é capaz de praticamente qualquer coisa para resgatar a criança Grogu das garras do Império.

Curiosidades

– BSI é a sigla em português de “Imperial Security Bureau”, divisão de inteligência e polícia secreta do Império que tem estrutura e funcionamento inspirados na SS nazista. Ela foi criada pelo coronel Wulff Yularen, que aparece em “The Clone Wars“, “Star Wars Rebels” e brevemente em “Uma Nova Esperança“, sendo uma das vítimas do ataque rebelde à Estrela da Morte.

– Quando Boba Fett diz que não pode infiltrar a refinaria imperial pelo risco de eles reconhecerem seu rosto, a referência, no caso, não é apenas ao fato de ele ter sido um caçador de recompensas de renome, mas também por ser um clone idêntico aos que formaram o exército da República e, brevemente, do início do Império.

– A Operação Cinzas, mencionada por Mayfeld a Valin Hess, ocorreu logo após a derrota do Império na batalha de Endor em “O Retorno de Jedi”. Ela consistia no extermínio de planetas inteiros para supostamente “limpar” o Império da “fraqueza” que causou sua queda, e foi retratada e mencionada em diversos livros (como a trilogia “Marcas da Guerra” e “Alphabet Squadron“), quadrinhos (“Império Destruído“) e videogames da franquia (“Star Wars Battlefront II“).

– Richard Brake interpreta o oficial do Império Valin Hess. Ele é conhecido por papéis que costumam usar maquiagem prostética, principalmente zumbis. Seus papéis mais famosos, no entanto, são como Joe Chill na trilogia “O Cavaleiro das Trevas“, de Christopher Nolan, e como o Rei da Noite em “Game of Thrones“, nos episódios Hardhome e Oathkeeper.

– As bombas sísmicas da Slave I já apareceram antes. Em “Ataque dos Clones“, Jango e Boba Fett utilizam a arma para tentar despistar Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor) durante a perseguição no cinturão de asteroides do planeta Geonosis.

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O último episódio da temporada de “The Mandalorian” irá ao ar no próximo dia 18 de dezembro no Disney Plus.

Julio Bardini
@juliob09

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