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Colunas   quarta-feira, 09 de fevereiro de 2022

O Livro de Boba Fett | Guerra por Tatooine finalmente eclode no final da temporada

No último episódio, série finalmente entregou o que era esperado desde o início.

Atenção: este texto contém spoilers até o final de temporada de “O Livro de Boba Fett”. Siga por sua conta e risco.

“Por favor, fale livremente.”

Até que enfim. No último episódio da temporada, “O Livro de Boba Fett” finalmente mostrou a que veio e entregou o que era esperado da série desde o início: tiro, porrada e bomba. Não gratuitamente, claro. A ideia era fazer Boba Fett (Temuera Morrison) confrontar seus demônios e se tornar, de fato, o daimyo que pretendia ser para Tatooine. Ainda que essa faceta tenha ficado um pouco rasa pelo roteiro de Jon Favreau, a direção de Robert Rodriguez foi certeira no retrato da violência de uma guerra entre gangues espaciais.

O título do último capítulo, Em Nome da Honra, faz referência clara à situação de Fett e sua disposição de enfrentar todo um exército do Sindicato Pyke para proteger Mos Espa. Afinal, um daimyo que não protege seu povo pode ser deposto a qualquer momento e, após seus anos vivendo entre os Tusken, Fett sabe da importância de proteger aqueles que dependem dele. O título também faz referência ao Credo Mandaloriano, que obriga Din Djarin (Pedro Pascal) a permanecer ao lado de Boba até o fim do conflito, para bem ou para mal.

Na noite anterior aos acontecimentos do episódio, no porto espacial de Mos Eisley, uma X-Wing pousa no hangar de Peli Motto (Amy Sedaris) trazendo o enjeitado mandaloriano favorito de todo mundo, Grogu. Pelo jeito, ele optou pela cota de malha de beskar em vez do sabre de luz, sendo mandado por Luke Skywalker (Mark Hamill) de volta a seu pai adotivo. A escolha foi dada à criança no final do episódio anterior, e agora ficamos por ver como a sensibilidade à Força de Grogu será abordada enquanto mandaloriano.

Na manhã seguinte, no Santuário da finada Madame Garsa Fwip (Jennifer Beals), Boba Fett e toda sua entourage vêem em primeira mão a destruição que uma guerra com um sindicato criminoso causa. Encurralado, o grupo resolve permanecer na cidade em vez de recuar para o palácio do daimyo, já que a população civil precisa ser protegida. Cad Bane (Corey Burton), caçador de recompensas imbatível em duelos de armas de fogo, aparece para provocar Fett e dar um fim prematuro ao conflito todo. O daimyo, no entanto, opta por esperar. Bane foi o antigo mentor de Fett ainda durante as Guerras Clônicas, mas depois eles se tornaram rivais e até inimigos — vale lembrar que a marca no capacete de Fett foi causada por um tiro de Bane, inclusive. A animosidade entre os dois é antiga e se encaminha para um desfecho definitivo.

“Qual é a sua jogada?”

Ao voltar ao Santuário, Boba Fett decide dividir suas forças por Mos Espa, palco do conflito. Os guardas Gamorreanos patrulham o território Klatooiniano, os mods guardam o setor Aqualish e o Wookiee Krrsantan vigia o setor Trandoshano. No quarto episódio, essas três gangues haviam prometido ao daimyo se manter neutras na guerra entre ele e o Sindicato Pyke. Mas como não existe honra entre ladrões, todas as três facções o traem e se voltam contra seus aliados. As cenas das traições são inspiradas em momentos distintos de “O Poderoso Chefão“, com a mais marcante sendo o atentado contra Krrsantan adaptando a cena da execução de Santino “Sonny” Corleone. Felizmente, o Wookiee e os mods sobrevivem. Já os Gamorreanos não têm a mesma sorte.

Com o jogo claramente a favor do Sindicato, Fett e seus aliados são forçados a recuar até conseguirem se reunir. Eles ainda ganham o acréscimo dos guerreiros de Free Town, que resolveu tomar partido após ver seu xerife Cobb Vanth (Timothy Olyphant) baleado por Cad Bane a mando dos Pykes. Eles até conseguem neutralizar os criminosos, mas acabam superados quando têm que enfrentar dois gigantescos droides Scorpenek, cada um com um campo de força super-resistente. Aí não dá, o jeito é recuar para o palácio, mesmo. Enquanto o Mandaloriano dá cobertura à debandada, Boba Fett retorna à sua base para buscar seu novo brinquedo: o Rancor. Mando e Grogu, no meio da correria, conseguem se reencontrar, mas mal dá tempo de aproveitar.

“Ei, Mando! Olha quem está aqui!”

As cenas com o Rancor são o tipo de entretenimento que poderia ter sido usado nessa série desde bem antes, já que contém o tipo de ação que cabe perfeitamente em “Star Wars“. Boba Fett cavalga o monstro durante a luta com os droides, num embate que se assemelha bastante ao antigo Godzilla enfrentando sua versão robótica, Mechagodzilla. Fett os derrota, mas acaba jogado para longe do Rancor por Cad Bane. A besta passa a causar destruição desenfreada por Mos Espa ao melhor estilo kaiju. Controlá-la terá que ficar a cargo dos mods e do Mandaloriano, já que o daimyo terá que enfrentar Bane, que aparece para o duelo final.

Como mencionado antes, a animosidade entre Boba e Bane é antiga. Eles já foram aliados, concorrentes, rivais e, agora, são inimigos. Com armas de fogo, o pistoleiro é imbatível — e logo prova isso. Mas Fett é agora um Tusken, fazendo uso de suas novas habilidades para derrotar seu antigo mentor. A estratégia é válida, já que um cajado gaderffiii é uma das poucas armas com as quais Bane nunca teve contato na franquia, e não sabe contragolpear. Isso destaca ainda como o duelo, na verdade, tem profundidade emocional para Boba Fett. Ele conseguiu derrotar seu maior inimigo usando o que aprendeu vivendo em comunhão com outros seres. Bane, por outro lado, havia aconselhado o exato oposto anteriormente: viva sozinho e faça tudo por si mesmo. A galáxia já não é mais a mesma para quem fica preso aos velhos hábitos. O fim chega até para Cad Bane, o maior caçador de recompensas que a galáxia já viu.

Apesar de toda a destruição, o Rancor acaba domado e acalmado por Grogu. Mando, os mods, Krrsantan e todo o resto tentam atirar no monstro e acabam apenas o deixando mais atiçado, mas a criança tem uma abordagem diferente. Ele encara o Rancor de frente, acalma o bicho e o coloca para dormir. Essa habilidade da Força é típica dos Jedi, e Grogu deve tê-la aperfeiçoado com Luke. O menino capota logo em seguida, como sempre acontece quando ele usa muito de sua energia.

Com o Sindicato Pyke derrotado e expulso de Tatooine, é a primeira vez em muito tempo que o planeta está livre. A população reconhece o papel de Boba Fett como daimyo e líder. Ele, Shand e seu grupo terão que se adaptar à nova vida como exemplos a serem seguidos. Mas honra para isso todos têm de sobra.

Na cena pós-créditos, o mod interpretado pelo músico Steven “Thundercat” Bruner se prepara para operar Cobb Vanth (Timothy Olyphant) após o tratamento de bacta do xerife terminar. É bom ver o líder de Vila Livre vivo. Mas será que ele precisava mesmo de upgrades?

Curiosidades

– No primeiro encontro entre Boba Fett e Cad Bane, o pistoleiro retruca uma alfinetada do daimyo falando: “se não é o Quacta chamando o Stifling de gosmento”. A expressão é o equivalente de “Star Wars” para “o sujo falando do mal lavado”, mas seu uso na cena vai além. No final da segunda temporada de “The Mandalorian“, Fett usa a mesma frase com a mandaloriana Koska Reeves (Sasha Banks), indicando que ele e Bane realmente trabalharam juntos o suficiente a ponto de usarem as mesmas provocações.

– Quando Fett e Din Djarin decidem deixar o Santuário atirando para todos os lados por estarem encurralados, a cena é uma referência ao final de outro faroeste clássico, “As Aventuras de Butch Cassidy e Sundance Kid“, estrelado por Paul Newman e Robert Redford. A manobra acaba tendo um desfecho bem melhor para os mandalorianos, no caso.

– O fato de Luke Skywalker ter permitido a Grogu retornar a seu pai adotivo mostra que ele não está disposto a adotar certos dogmas da antiga Ordem Jedi. Seu pai Anakin, por exemplo, foi obrigado a abandonar a própria mãe à escravidão para poder ser treinado, gerando um dos traumas que mais tarde o encaminharia ao Lado Sombrio da Força. Luke não parece estar disposto a arriscar.

– Os droides Scorpenek usam tecnologia remanescente das Guerras Clônicas, quando a Confederação dos Sistemas Independentes, que comandava o Exército Separatista, usava máquinas chamadas droidekas para combater os Jedi. A única forma de fazer isso era com campos de proteção grossos, bloqueando armas de energia (blasters) e golpes diretos (com sabres de luz). A melhor forma de derrotá-los é usando a Força para danificá-los ou se infiltrando pelo escudo. Ou usando a força bruta de um Rancor, isso também funciona.

– A ideia de um kaiju causando destruição pela cidade não é nova em “Star Wars”. Em “The Clone Wars“, um arco inteiro é dedicado à captura de uma gigantesca besta Zillo pela República. O monstro acaba fugindo e aterrorizando Coruscant por alguns episódios.

– A fruta oferecida a Boba Fett e Fennec Shand no final do episódio é um meiloorun. Ela é antiga na franquia e aparece bastante na animação “Star Wars Rebels” como a comida favorita do Lasat Zeb Orrelios.

Julio Bardini
@juliob09

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