Lutar, cair, levantar, repetir: a vida segundo Rocky Balboa e Adonis Creed
Ser o vencedor nem sempre é o que a vida propicia a quem se dispõe a lutar. Mas, para quem acompanha a saga de Rocky Balboa, a vitória é apenas um detalhe.
Quem acabou de ler o título desta coluna pode ter achado estranho a ausência do verbo “vencer”. Afinal, estamos falando de ninguém menos que Rocky Balboa e Adonis Creed, não? Se existem duas pessoas que entendem de lutar e vencer, são eles. Mesmo assim, a vida lhes ensinou que a vitória nem sempre é o resultado que você terá, independente do seu esforço. Aliás, talvez a vitória não seja sequer o objetivo final, mas sim provar que você consegue ficar de pé e de cabeça erguida sempre – seja levando uma saraivada de golpes de um gigante russo em um ringue em Moscou ou indo de porta em porta em busca de um emprego que cause um pouco menos de dano corporal.
Sylvester Stallone criou seu melhor amigo Rocky Balboa em 1975, quando era apenas um aspirante à carreira artística sem muitas perspectivas. 43 anos depois e já consagrado por seus papéis em diversos filmes de ação, ele fará sua nona aparição como o Garanhão Italiano (“the Italian Stallion“, no original em inglês) em “Creed II“. Agora, ele deverá treinar Adonis Creed (Michael B. Jordan), filho de seu antigo rival e amigo Apollo (Carl Weathers), em mais um grande desafio, que colocará à prova a capacidade de ambos de seguir em frente, não importa o quanto apanhem. Para ficar em dia com a franquia, o Cinema Com Rapadura preparou uma retrospectiva de seus filmes e da vida de Rocky e Adonis, que tanto diz sobre a nossa própria. Agora vamos voar!
Rocky (1976)
“Eu não era ninguém. Mas isso não importa. Não importa se eu perder essa luta. Porque tudo que eu quero é ir até o final. Ninguém nunca foi até o final com Apollo Creed. E se eu conseguir, se aquele sino tocar e eu estiver de pé, eu terei certeza, pela primeira vez na vida, que eu não era só outro moleque do bairro.”
Sylvester Stallone não era muito conhecido no início da década de 1970. Aliás, talvez não fosse nem um pouco conhecido, mas não desistia. Em uma situação financeira precária, o aspirante a ator e roteirista tinha acabado de vender seu cachorro e melhor amigo Butkus na porta de uma loja de conveniências, porque precisava do dinheiro para sobreviver. Alguns dias depois, assistindo uma luta entre Muhammad Ali e Chuck Wepner, ele teve a ideia de escrever uma história sobre alguém na mesma situação que ele, mas um boxeador – alguém que literalmente lutava para sobreviver. Nascia ali Robert “Rocky” Balboa.
Um rapaz humilde da Filadélfia, Rocky não aspirava a muito na vida. Ele trabalhava como “cobrador de dívidas” para o chefe da máfia local, treinava boxe usando pedaços de carne em um açougue como sacos de pancada e paquerava a caixa de uma petshop do bairro, Adrian (Talia Shire). Um dia, surge uma oportunidade daquelas que a vida só apresenta uma vez: uma luta contra o campeão mundial Apollo Creed (Carl Weathers), que quer se provar frente a sangue novo no circuito do boxe. Precisando do dinheiro – e da motivação -, Rocky aceita o desafio, mesmo tendo certeza de que irá perder a luta.
Para se preparar, Rocky se ampara em Adrian, seu amigo Paulie (Burt Young) e seu treinador Mickey Goldmill (Burgess Meredith). Seu principal trunfo, no entanto, é algo que vem de dentro: sua determinação. Durante o embate com Apollo, fica claro que a técnica do Garanhão Italiano não se compara à do Mestre do Desastre, mas sua resistência e vontade de aguentar até o final é muito superior, chegando a assustar seu adversário pela capacidade de levar diversos socos e não cair. A luta vai até o último round com ambos de pé, e Creed acaba vencendo por pontos. Mas para Rocky, o objetivo não era vencer – não se vence um campeão mundial logo de cara -, era apenas ir até o final e provar para si próprio que ele era sim capaz de fazê-lo.
Num ano que teve filmes como “Todos os Homens do Presidente“, “Taxi Driver“, “Rede de Intrigas” e “Carrie, a Estranha“, apostar no azarão “Rocky” para os principais prêmios da temporada soa até um pouco engraçado. Mas foi dele a vitória nas categorias Melhor Filme e Melhor Diretor, com John G. Avildsen. Stallone foi indicado a Melhor Ator e Melhor Roteiro, Talia Shire a Melhor Atriz e Burt Young e Burgess Meredith a Melhor Ator Coadjuvante.
Rocky II (1978)
“Você tem uma segunda chance, Rocky, de conquistar o maior título do mundo. E vai estar trocando socos com o lutador mais perigoso do mundo. E tudo isso vai acontecer logo logo e você não está pronto. Nem perto da velha forma. Por que você não levanta e enfrenta esse cara de verdade? Como você fez antes! Aquilo foi lindo!”
Às vezes podemos até prometer que não faremos certas coisas, não cometeremos certos erros… E vamos lá e fazemos o oposto logo em seguida. “Rocky II” tinha tudo para ser um destes erros, não fosse o carisma de Rocky e Apollo e o esforço de Stallone em enxergar, produzir e dirigir uma nova etapa para seu protagonista.
Seu objetivo era ir até o final e provar para si mesmo que era capaz de conter o adversário, e foi cumprido. Ele não é só mais um moleque do bairro, já provou o que tinha que provar e agora é hora de crescer. Então Rocky coloca em prática as próximas etapas do que ele acha que é o seu caminho: pede a mão de Adrian em casamento, compra uma casa, abandona o boxe e vai atrás de emprego em alguma empresa (os famigerados “office jobs“, no inglês). Mas crescer não é necessariamente se adaptar ao que você acha que querem de você, e sim encarar quem você é. E Rocky é, bem, um lutador.
Do outro lado do ringue, Apollo vive uma crise diferente. Já um campeão e com carreira consagrada no esporte, sua credibilidade caiu bastante após ter que contar com a decisão dos juízes para vencer um novato como Rocky. Apesar de ter prometido que não haveria revanche, ele agora está determinado a provar que o que aconteceu foi uma anomalia, sorte de principiante do adversário. Para isso, é preciso tirar Rocky de sua toca e provocá-lo a aceitar esse novo desafio.
Fora de forma e acomodado, Rocky está bem relutante. Ao buscar o conselho de seu mentor e treinador, Mickey Goldmill, ele ouve que, do jeito que está, jamais duraria um round contra Apollo. E o tempo está passando. O jeito é levantar, sacudir a poeira das derrotas do que ele achava que seria essa tal “vida adulta” e começar a se preparar para voltar ao ringue. Não é fácil, e há resistência dentro de casa, com Adrian grávida e descontente com a ideia do marido de voltar a lutar. Apenas ao ver seu filho nascer é que Rocky olha para sua vida e entende que seu destino é lutar, como sempre fez.
Agora com o apoio de seus amigos, sua esposa e de sua cidade (Filadélfia é sempre um personagem em si nestes filmes), Rocky aceita o desafio não só de enfrentar Apollo, mas de enfrentar a si mesmo também. Após muito treinamento, ambos se encontram no ringue para a revanche que juraram que não fariam. E, novamente, a luta se dá golpe a golpe e vai até o final. Desta vez, no entanto, a vitória não é por pontos, mas sim por nocaute: Rocky derruba Creed e se sagra campeão mundial dos pesos pesados.
Rocky III (1982)
“Olha, cara, quando você me venceu, doía o corpo todo e eu não queria saber de mais nada – nem mesmo meus filhos. Todo lutador sabe que dói, e ficamos doentes por dentro tentando viver com isso, então não volte atrás agora. Conserte isso para você, ou vai acabar arrependido depois. […] Quando nós lutamos, você tinha aquele olhar de tigre, cara. Uma fome. E agora você precisa conseguir isso de volta, e o jeito para isso é voltar ao começo. Entende?”
Quem começa a assistir os filmes da franquia pode se surpreender logo de cara por não ouvir a icônica canção “Eye of the Tiger“, da banda Survivor. Atualmente, basta tocar essa música para muita gente já levantar os braços ou arriscar golpes de boxe, tamanha a identificação com Rocky. Mas foi apenas em no terceiro capítulo da franquia que ela aparece pela primeira vez. E não é nem mesmo o próprio que a menciona, mas sim seu melhor amigo Apollo.
Após estabelecer uma carreira de sucesso e conquistar diversos títulos nos ringues, nosso protagonista sente que seus desafios estão exigindo cada vez menos dele. Até mesmo para campanhas publicitárias ele perdeu a vergonha, veja bem. Não há mais o que conquistar, e o caminho parece claro: pendurar as luvas. É quando surge um adversário com uma ascensão quase tão meteórica quanto a do próprio Rocky: Clubber Lang (interpretado pelo aqui terrível Mr. T, com o perdão do trocadilho).
Um jovem com ânsia de provar suas capacidades, Lang lembra muito o próprio o Rocky no início de sua carreira, mas com uma ressalva importante: sua raiva. Grunhindo e provocando todos seus adversários o tempo todo – beirando a falta de educação e o desrespeito -, ele é talvez o mais caricato dos adversários de Balboa em toda a franquia. Ao provocá-lo em uma cerimônia pública, Lang consegue a luta que queria e começa a colocar dúvidas na cabeça de Rocky.
Após se desentender com Mickey, Rocky decide aceitar o desafio de Clubber. Sua determinação, no entanto, não está como de costume, e ele se sente, pela primeira vez em sua carreira, mais inseguro do que confiante sobre o desafio. No dia da luta, nos corredores a caminho do ringue, Clubber perde a cabeça e chega ao ponto de atacar o próprio Mickey – um senhor já com bastante idade – que vem a falecer pouco depois. Rocky, totalmente desestabilizado emocionalmente e incapaz de se concentrar, perde o duelo e o cinturão dos pesos-pesados.
É quando surge uma das amizades mais emblemáticas do cinema. Então adversário, Apollo Creed também tem sua rusga com Clubber Lang. Determinado a ensinar o devido respeito a um jovem indisciplinado, ele sabe que não conseguiria ganhar no ringue, mas conhece quem poderia. Sabendo que Rocky acabara de perder seu treinador, Apollo se dispõe e preencher esse vácuo na equipe de seu rival histórico, enfatizando o tempo todo que ele precisa voltar às suas raízes e restaurar seu “olhar de tigre”. Rocky aceita, mas o caminho é árduo até sua recuperação física e mental.
Após um longo treinamento em Los Angeles nos ginásios de periferia onde Apollo começou sua carreira, Rocky começa a resgatar sua sede de vitória e compreende melhor o significado da luta contra Lang: provar novamente que não é apenas um lutador que deu sorte, além de prestar uma última homenagem a Mickey Goldmill. Quando chega o dia da revanche, a luta é novamente dura, mas ambos os lados compreendem que a vitória de Rocky é apenas questão de tempo.
“Rocky III” é talvez o filme com a premissa mais interessante de toda a franquia. Após conquistar tudo, Rocky tem a chance de enfrentar um lutador como ele, ansioso para se provar no ringue e alcançar seu lugar entre os melhores do esporte. A caracterização de Lang, no entanto, é o que compromete essa visão. Em detrimento de um jovem esforçado e com princípios, ele acabou escrito de forma rasa, sendo apenas um cachorro raivoso que late para quem passa em sua calçada.
Rocky IV (1985)
“A verdade é que, às vezes, eu fico mesmo com um pouco de medo. Quando estou no ringue levando golpes e meus braços doem tanto que nem consigo levantá-los, às vezes penso ‘queria que esse cara me desse um soco no queixo para que eu não sentisse mais nada’. Mas aí há outro lado, que não está com tanto medo, que quer levar mais e aguentar outro round. Porque aguentar mais um round quando você acha que não consegue é o que faz toda diferença na sua vida.”
Sentindo os sintomas da chamada “década perdida” e da paranoia causada pela Guerra Fria, Stallone decidiu que os próximos passos para Rocky seria mergulhar de cabeça nesse complexo conflito ideológico. Mas não há como simplificar mais do que colocando dois lutadores, cada um representando um lado, em cantos opostos de um ringue. Apesar de não ser um primor, “Rocky IV” é talvez o filme com mais coração em toda a franquia justamente por tentar mostrar que ringues devem apenas ser usados para esportes, nunca para política.
O boxe começa a sentir os efeitos da abertura soviética para a profissionalização de seus atletas em diversas modalidades esportivas. A entrada do gigante Ivan Drago (Dolph Lundgren), campeão olímpico, abala o cenário do boxe profissional. Mesmo começando agora sua carreira profissional, ele já tem bagagem suficiente para amedrontar até os pugilistas mais experientes. É o que acontece com ninguém menos que Apollo Creed.
No auge da referida paranoia, o governo soviético faz de Drago seu garoto propagando oficial, preparando uma turnê pelos EUA para exibir sua visão de atleta perfeito. Creed, que sempre lutou com calções nas cores americanas e se apresentava ao ringue vestido de Tio Sam, sentiu esse movimento em um nível pessoal. Mesmo aposentado, ele se desafia a enfrentar o tal gigante russo em uma luta amistosa e mostrar que ele não terá vida fácil. Receoso, seu amigo Rocky o aconselha a não levar a ideia adiante, não levando a sério a ameaça da dominação soviética no esporte. Mas como bom amigo, promete apoiar Apollo seja qual for sua trajetória.
O que ninguém esperava era que essa trajetória fosse acabar em tragédia. Após armar um verdadeiro “alçapão ianque” para intimidar Drago, a luta entre ambos começa a ganhar contornos mais dramáticos a cada golpe desferido pelo gigante. Mesmo em um ginásio lotado em plena Las Vegas e em um embate que não valia pontos ou cinturões, com tudo a seu favor, Apollo não aguenta, mas se recusa a desistir. Sua insistência em não jogar a toalha culmina em sua morte. Apollo Creed, o Mestre do Disastre, perde para Ivan Drago por um nocaute que veio a lhe tomar a vida.
Rocky, que apoiou seu amigo durante toda a preparação, o viu falecer em seus braços em plena longa do ringue. Se antes a presença de um lutador como Drago não era nada de mais para ele, agora era pessoal, principalmente após a declaração do adversário ao fim da luta: “se morrer, morreu“. Mas como derrotar um homem assim? Como sequer começar a se preparar? Sem técnico, sem Mickey, sem Apollo?
A resposta é a mesma de sempre: olhando para dentro, encontrando a motivação e treinando. Contrariando a vontade de sua esposa Adrian, Rocky decide levar seu treinamento a um novo patamar e se muda temporariamente para a Rússia, visando focar apenas neste novo desafio. Ele passa todo o rigoroso inverno local treinando e acaba ganhando uma motivação extra quando Adrian decide se juntar a ele. A luta ocorrerá em Moscou e não fará parte do calendário oficial do boxe. Oficialmente, é uma exibição; mas quem acompanhou o drama de Apollo Creed sabe que o embate será pessoal.
Se antes o alçapão era ianque, agora ele é vermelho. Com a presença de toda a alta cúpula do governo soviético e abarrotado de fãs, Rocky sobe no ringue trajando os calções de seu velho amigo Apollo: listras brancas e vermelhas com barras em azul. As cores norte-americanas. Drago, por sua vez, mantém a tradicional frieza e falta de expressão. Sua ansiedade e tensão só vêm a tona na hora de cumprimentar Rocky, quando o faz perder o equilíbrio tamanha a força que usou ao tocarem as luvas.
O que segue é a maior sequencia de luta da franquia, com cada lutador fazendo uso de suas principais características, que se mostram opostas. Se Drago é forte e direto, Rocky é resiliente e tático. E é nisso que o Garanhão Italiano investe, desestabilizando gradualmente o adversário, que sente o baque a cada golpe. Drago chega ao cúmulo de desabafar para seu treinador que “é como bater em um pedaço de ferro, ele não é humano“, algo que até pouco tempo atrás dizia-se dele próprio. No fim, o nocaute: o imbatível gigante russo finalmente vai à lona, e Rocky vinga a morte de seu melhor amigo. Sua mensagem final, no entanto, não é de mágoa nem de raiva, mas de conciliação entre os lados do embate, tanto pessoal quanto político: “se eu posso mudar e nós podemos mudar, então todos podem mudar“.
Rocky V (1990)
“Medo é o melhor amigo de um lutador, e isso não é nada para se ter vergonha. Medo te mantém afiado, te mantém acordado e te faz querer sobreviver. Entende? Mas a questão é que você precisa aprender a controlá-lo. Certo? Porque medo é como fogo, e fica queimando lá no fundo. Se você o controlar, vai te deixar aquecido. Mas se deixar que ele te controle, vai queimar você e tudo ao seu redor.”
Cinco anos após “Rocky IV”, Stallone decide deixar o posto de diretor para o quinto filme da franquia. Quem assume é ninguém menos que John G. Avildsen, consagrado com o Oscar que ganhou pelo primeiro “Rocky” e pelo sucesso de “Karatê Kid“. Para os fãs, era a combinação perfeita, o retorno de um velho campeão ao ginásio que o consagrou. Mas o resultado acabou não sendo o que todos esperavam.
Como todos os filmes da série (exceto o primeiro, obviamente), “Rocky V” começa logo após o final do episódio anterior. Retornando aos Estados Unidos depois de vencer Ivan Drago em Moscou, Rocky imediatamente passa a receber diversas propostas de luta, principalmente de um empresário particularmente insistente chamado George Washington Duke (Richard Gant); todas são prontamente recusadas. Isso muda quando Paulie descobre que Rocky, sempre muito confiante naqueles ao seu redor, havia conferido poderes para que seu contador realizasse investimentos em seu nome. Com isso, toda a fortuna que os Balboa juntaram foi rapidamente consumida por más escolhas e aplicações.
Determinado a resolver esse problema aceitando apenas algumas lutas, Rocky ouve uma segunda notícia devastadora: seu médico recomenda a aposentadoria do campeão, afirmando que há dano cerebral permanente e risco de morte caso o quadro se agrave. Adrian, que já apoiava a ideia mesmo antes da luta com Drago, enfim consegue convencer o marido. A família se muda para o bairro periférico da Filadélfia onde tudo começou, Adrian retoma seu antigo emprego na petshop e Rocky tenta reabrir o antigo ginásio de Mickey Goldmill.
É quando surge um elemento que ninguém havia previsto. Um rapaz de Oklahoma chamado Tommy Gunn (interpretado pelo boxeador Tommy Morrison) procura Rocky em busca de conselhos e orientações sobre a carreira nos ringues. Para alguém forçado a se aposentar, é a oportunidade perfeita para ele retornar aos ringues, ainda que apenas como treinador. Rocky decide, então, acolher e treinar Tommy, apostando todas suas fichas no futuro do pupilo. Enquanto isso, a vida familiar dos Balboa vai se tornando cada vez mais complicada, com Adrian tendo que se dedicar ao emprego, Rocky passando muito tempo fora de casa e o pequeno Rocky Jr. enfrentando problemas na escola, sem apoio dos pais.
Apesar da presença constante de Rocky ao seu lado, Gunn é aliciado por George Washington Duke, e passa a pensar somente no sucesso e dinheiro que virão junto com uma carreira de sucesso nos ringues. A relação entre treinador e pupilo se deteriora rapidamente, chegando ao ponto de Gunn e Duke irem à residência dos Balboa em plena véspera de Natal para anunciar como serão as coisas dali em diante: Rocky treina, Gunn vence e Duke lucra, em suma. Mesmo com todo o apelo de Rocky, seu pupilo o ignora e abandona.
O que segue é a ascensão meteórica de Tommy Gunn ao estrelato no circuito do boxe. Após derrotar o campeão mundial Union Cane (Michael Williams) sob vaias, ele e Duke vão a público desafiar o próprio Rocky a uma luta oficial. Segundo eles, Cane não seria o campeão de fato, visto que herdou o título após a aposentadoria inesperada de Balboa. Rocky volta a recusar os desafios, até que, novamente, Gunn e Duke ultrapassam os limites ao abordá-lo em um bar, acompanhados de uma equipe de televisão.
Após Gunn agredir Paulie, Rocky aceita o desafio, mas diz que seu ringue agora “é lá fora”, chamando Gunn para uma briga de rua. Seu antigo pupilo aceita, apesar das negativas de Duke dizendo que seria ideal manter a briga dentro dos ringues. Como sempre, o protagonista apanha bastante antes de revidar. Quando a memória de Mickey vem à mente, Rocky nocauteia Gunn quase que instantaneamente. No dia seguinte, finalmente livre daqueles que queriam usá-lo para benefício próprio, Rocky decide levar seu filho Rocky Jr. ao Museu de Arte da Filadélfia, que ele nunca havia visitado, apesar de ser onde está sua estátua. Determinado a reconstruir sua vida e estar próximo de sua família, o futuro do eterno campeão ainda reserva muitas surpresas.
Rocky Balboa (2006)
“O mundo não é só sol e arco-íris. É um lugar ruim que vai te bater até você ficar de joelhos e que vai te deixar assim permanentemente se você permitir. Nem eu, nem você, nem ninguém vai bater tão forte quanto a vida. A questão não é o quão forte você bate, mas sim o quanto você aguenta apanhar e continuar seguindo em frente. É assim que se vence.”
“Se você sabe o seu valor, então vá lá e conquiste o seu valor!”
Onze anos após seu último filme e de seu desempenho pífio em termos de crítica e bilheteria, todos achavam que a carreira de Rocky estava, enfim, encerrada. Com seu criador e intérprete Sylvester Stallone já com 60 anos, era praticamente inconcebível ver o retorno do Garanhão Italiano aos ringues. Mas, fazendo jus à sua fama de resiliente, ele voltou uma última vez. Muito do que conhecíamos da franquia já não está mais lá: não há mais Adrian, Mickey ou Apollo. Grande parte da mitologia se foi. Ainda assim, foi impossível não torcer para nosso campeão uma última vez.
Rocky Balboa agora vive uma vida pacata na Filadélfia. Ele é dono de um pequeno restaurante italiano (como não poderia deixar de ser) e está sempre presente no cotidiano do lugar, garantindo um padrão de qualidade. Mas o que ele mais gosta é de conversar com os clientes, garantir sua satisfação e contar as histórias de seu passado nos ringues noite afora. Tudo com a companhia de seu amigo, cunhado e fiel escudeiro Paulie.
Mas nem tudo vai bem. Adrian faleceu quatro anos antes, vítima de câncer, no que talvez tenha sido o golpe mais duro que Rocky já sofreu. A relação com seu filho Robert (que se recusa a ser chamado de Rocky Jr.) vai de mal a pior, já que o rapaz não consegue sair debaixo da vasta sombra de seu pai. E Paulie, que nunca foi um modelo de irmão para Adrian, se ressente pela forma com que a tratava em vida.
As coisas começam a mudar quando Rocky reencontra Marie (Geraldine Hughes), uma mulher que, quando jovem, vivia se metendo em confusões com as gangues do bairro. Trinta anos antes, ele a escoltava de volta para casa sempre que possível (como visto brevemente no primeiro “Rocky”). Agora, Marie é uma mãe solteira de um rapaz adolescente chamado Stephenson (James Francis Kelly III), mas que prefere ser chamado de “Steps”. Esse reencontro acaba se mostrando bom para todos, que precisavam de amparo para suas angústias, encontrando-no na amizade reestabelecida.
Enquanto isso, no circuito profissional de boxe, o atual campeão é Mason “The Line” Dixon (Antonio Tarver). Mesmo com talento e resultados, o principal adversário que ele ainda não conseguiu derrotar é sua impopularidade, havendo até quem conteste seus títulos alegando que ele nunca enfrentou um adversário à sua altura. É quando um programa esportivo apresenta uma simulação de como seria uma luta entre ele e Rocky, cada um em seu respectivo auge. E Rocky vence.
Do outro lado, Rocky também assiste a simulação. Parado há anos, ele vê no retorno ao boxe a oportunidade ideal de preencher o vazio que vem sentindo. Quando ele renova sua licença para praticar o esporte profissionalmente, a mídia vai à loucura, acreditando que o embate pode de fato vir a acontecer. É quando seu filho Robert (Milo Ventimiglia) retorna a Filadélfia para implorar ao pai para não voltar aos ringues. Em uma fala cheia de frustração, ele desabafa que nunca conseguiu viver sua própria vida por conta da sombra de seu pai, mesmo trabalhando no ramo empresarial. Rocky ouve tudo que o filho tem a dizer, mas responde dizendo que, talvez, sua frustração seja consigo mesmo por nunca ter se dado o valor que merece. Esta é uma das falas mais icônicas de toda a franquia (retratada acima).
No fim, a luta ocorre na forma de um desafio amistoso em Las Vegas, com todos os lucros sendo revertidos para caridade – mas ninguém que fazer feio. Rocky passa a treinar com Duke (Tony Burton), antigo treinador de Apollo Creed, e tenta retomar o máximo possível de sua velha forma física. Ele e Robert ainda se reconciliam em frente ao túmulo de Adrian. O vigor, no entanto, continua lá. Dixon, por sua vez, volta ao ginásio onde começou sua carreira como atleta e retoma a parceria com seu primeiro treinador, em uma tentativa de voltar às raízes.
Como todos os embates da franquia, a luta é extremamente disputada, e vai até o final com ambos os lutadores em pé. A vitória por pontos é dada a Dixon, no entanto. Rocky, sem ligar muito para o resultado final, parabeniza o adversário, afirmando que ele tem todas as características de um verdadeiro campeão. Independente de ganhar ou perder, Rocky queria o que sempre quis: provar que é capaz de lutar. Com seus amigos e filho ao seu lado, qualquer resultado é positivo.
Creed (2015)
“[Rocky aponta para Adonis no espelho] Este é o maior adversário que você vai enfrentar na sua vida.”
Ele já lutou. Já foi campeão. Já se aposentou. Já voltou da aposentaria. Abriu um restaurante onde conta suas histórias. Quando ninguém esperava que a franquia “Rocky” pudesse render mais, eis que ela ressurge com o sucesso estrondoso de “Creed”. Tendo sido anunciado inicialmente como um spin-off, pela primeira vez um filme da franquia não traz Rocky Balboa como protagonista – ainda que ele seja peça fundamental na trama.
Não obstante, é também o primeiro filme em que Sylvester Stallone está apenas como ator. Mesmo tendo auxiliado na escrita do roteiro, a maior parte de sua participação foi em frente às câmeras. A cadeira de direção aqui fica a cargo de Ryan Coogler, cujo sucesso anterior em “Fruitvale Station: A Última Parada” trazia excelentes credenciais. Com a história focando em um filho perdido de Apollo Creed, Coogler recorreu ao protagonista de seu último filme, com quem sempre manteve uma boa relação de trabalho: Michael B. Jordan. E o resultado foi tão bom que catapultou as carreiras de ambos, além de render a Stallone um Globo de Ouro.
Em 1998, Adonis “Donnie” Johnson cumpre sua pena em um centro de detenção juvenil. Ele é filho de Apollo Creed em um relacionamento extra-marital, mas ainda assim é adotado por Mary Anne Creed, sua madrasta, que o cria como se fosse seu próprio. Apesar de crescer a partir dali com a melhor educação, o sonho de Donnie sempre foi seguir os passos de seu pai nos ringues. E, assim como seu pai, ele também enfrenta grande resistência de Mary Anne em relação à essa decisão. Após deixar seu emprego em uma corretora financeira e ser recusado no ginásio que a família de Duke – antigo treinador de Apollo – mantém, Donnie decide apostar uma última ficha, e embarca para a Filadélfia.
Ao reencontrar o melhor amigo de seu falecido pai, Rocky Balboa, Donnie também encontra resistência à ideia do boxe. Rocky teve uma carreira longa e vitoriosa, mas lida com as consequências de dano cerebral, artrite e com seus próprios demônios. Mas talvez essa seja a última chance de treinar um pupilo, alguém realmente esteja engajado no esporte, então ele acaba concordando.
Adonis se muda para Filadélfia para dar início aos seus treinamentos, com o apoio de diversos dos antigos amigos de Rocky. Mais que isso, ele começa a se adaptar à vida local e até arruma uma namorada, a cantora e compositora Bianca (Tessa Thompson). Tudo vai bem, e Donnie começa a participar de pequenas lutas no circuito local. Mas era inevitável que, cedo ou tarde, a verdade sobre sua ascendência se tornasse assunto. Isso ocorre quando Rocky recebe uma ligação do treinador do então campeão mundial “Pretty” Ricky Conlan (o boxeador Anthony Bellew), que terá de se aposentar precocemente para cumprir pena na cadeia. A condição para a luta, no entanto, é clara: Adonis terá de lutar com o sobrenome Creed. De início, ele se revolta afirmando que quer construir sua própria história e legado, mas depois concorda.
Agora com um desafio imenso pela frente, Adonis e Rocky elevam o nível do treinamento. A luta não será mais contra adversários locais, e sim contra o campeão mundial em sua própria cidade natal, Liverpool. Mas se o adversário de Donnie já é complicado, Rocky descobre que terá um ainda pior pela frente. Ainda no início dos treinos, ele é diagnosticado com linfoma de Hodgkin, que o forçaria a fazer quimioterapia. Ele se lembra que isso não foi o suficiente para salvar sua esposa Adrian quando ela teve câncer de ovário, e começa a contemplar sua própria mortalidade ao lembrar que já perdera também Paulie, Mickey e o próprio Apollo. Donnie, desesperado por ver seu mentor tão abalado, implora que Rocky faça o tratamento necessário, se comprometendo a manter o treinamento e afirmando que ambos vencerão seus desafios juntos. Relutante, Rocky concorda.
Quando chega o dia da luta entre Adonis e Conlan, o estádio que recebe o evento está lotado. Sob vaias estrondosas, Donnie entra no ringue trajando os icônicos shorts de seu pai, com a palavra “CREED” bordada na cintura. Como é de se esperar de um discípulo de Rocky Balboa, a luta é longa e baseada, principalmente, na resiliência física dos adversários. Cada um foi à lona uma vez, sempre se levantando em seguida. Após o décimo round, Conlan é declarado vencedor da luta em uma decisão acirrada dos juízes, mas, conforme o comentarista da transmissão televisiva, “se Conlan ganhou a luta, Creed ganhou a noite”. Tendo conquistado o respeito de seu adversário e a simpatia do público, Adonis está pronto para enfim seguir os passos de seu pai.
Falta apenas uma coisa: subir a icônica escadaria do Museu de Arte da Filadélfia, que faz junto com Rocky. Como prometeram, ambos superaram seus desafios. Juntos.