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Colunas   quinta-feira, 24 de outubro de 2019

De A Noite dos Mortos Vivos a Zumbilândia: Porque gostamos tantos de filmes de zumbis?

Entenda melhor a história dos filmes de zumbis no cinema e o que faz com que o subgênero esteja em alta ainda hoje.

O tema de pós-apocalipse zumbi está presente há mais de 50 anos em Hollywood, tanto que já pode ser considerado um subgênero dos filmes de terror. Mesmo assim, diferente de outros gêneros como musicais e faroeste, produções de zumbis não aparentam ter altos e baixos, pelo menos não com tanta diferença de produções, estando sempre presentes no cinema e na TV desde a popularização do subgênero.

A Parrot Analytics, empresa especializada em análise televisiva, mostrou um estudo mostrando que “The Walking Dead” (mesmo com suas crescentes quedas de audiência) foi a série mais assistida mundialmente em 2018, em plena nona temporada. Os mortos vivos têm uma enorme influência na cultura pop. A seguir, entenda um pouco melhor a história de como eles surgiram e se popularizam no cinema.

Retrospectiva dos zumbis no cinema

Os primeiros filmes de zumbis se inspiraram em histórias antigas, em especial vindas do Haiti, que consistiam nos mortos vivos sendo ressuscitados por um feitiço vudu. Tanto na lenda haitiana quanto nessas primeiras produções, os zumbis eram ressuscitados para virarem servos de quem os trouxe de volta vida.

Os mortos-vivos chegam nas telonas por volta da mesma época que monstros como Frankenstein e Drácula chegam, com o lançamento de “White Zombie” (1932). Mas os zumbis só caíram na graça dos públicos com a chegada de “A Noite dos Mortos-Vivos” (1968) de George Romero. Nos anos seguintes, o diretor ainda trabalharia com mais filmes de zumbis, aumentando a qualidade dos efeitos especiais, tornando as criaturas cada vez mais realistas.

“A Noite dos Mortos-Vivos” (1968)

Romero se inspirou nos filmes que já existiam antes sobre zumbis, mas criou certas regras sobre os mortos vivos que existem até hoje. Como: os zumbis são tomados por uma fome insaciável de comer os vivos; eles só podem ser matados quando são feridos no cérebro; os ataques de zumbis são explícitos, mostrando o corpo humano sendo devorado e mutilado pelas criaturas; e você pode virar um zumbi se for mordido por um.

Os zumbis de Romero também eram devagar, e “A Noite dos Mortos Vivos” retrata um apocalipse em que a vitória para alguém seria sobreviver, além de tratar os mortos vivos como uma infecção. Esses artifícios não foram criados pelo diretor, mas fazem parte da cultura popular em relação às obras de Romero. Uma das maiores diferenças entre o estilo do diretor e os primeiros filmes que abordam o tema é que ele não usou o vudu e o controle dos zumbis em seus longas.

A influência que Romero teve no futuro de produções sobre zumbis é abrangente e explícita, tanto que além de como os mortos vivos funcionam, o enredo principal ainda se mantém o mesmo até nos dias de hoje. Sempre se tratando de que pessoas mortas voltam à vida sem explicação e tentam comer e consequentemente contaminar os vivos, isso faz com que o mundo fique em um cenário pós-apocalíptico e obriga os sobreviventes a se esconderem.

Dos anos 1970 até os anos 2000 foram inúmeros lançamentos, como a trilogia de “Uma Noite Alucinante”, e até mesmo “Fome Animal” (1993) dirigido por Peter Jackson. Durante esse período, a grande maioria dos filmes optaram por mostrar um lado sangrento, recheados com cenas de mortes explícitas. E boa parte deles também trabalhou com orçamento baixo, o que caracterizou uma série de projetis com efeitos especiais feitos da pior maneira possível.

Já no início do novo século, algumas convenções começam a ser quebradas, até mesmo com o remake do filme dirigido por Romero, “Madrugada dos Mortos” (2004) de Zack Snyder, que mostrou zumbis ágeis, por exemplo. “Resident Evil” (2002) mescla elementos do terror com ficção-científica.

“Madrugada dos Mortos” (2004)

“Extermínio” (2002), de Danny Boyle, traz uma inovação que vem se tornando cada vez mais comum: a alternância entre cenas de ação, com ritmo frenético, câmera acelerada durante as cenas de ataque e o ritmo mais lento, mostrando cenas do dia a dia dos sobreviventes e como eles devem se adaptar à um mundo em que estão cercados de mortos-vivos. Na série “The Walking Dead” pode-se ver esse mesmo tipo de alternância entre os enredos, até com os conflitos, dúvidas e medos dos personagens tomando lugar da ação em vários episódios.

“Terra dos Mortos” (2005), a volta de Romero na direção de filmes de zumbis, também mostra uma inovação ao mostrar o surgimento de uma consciência nos mortos vivos e revelar o lado sombrio dos sobreviventes. O próprio diretor já afirmou que neste longa, os zumbis são uma metáfora da classe trabalhadora, enquanto os humanos representam a burguesia. O que nos leva ao próximo tópico do porquê produções que abordam os mortos vivos ainda são tão populares hoje em dia.

Filmes de zumbis não são sobre zumbis

Romero sempre colocou os zumbis como metáforas em seus filmes, no clássico “A Noite dos Mortos Vivos” há uma crítica incisiva sobre o racismo. Até porque, a lenda haitiana previamente falada sobre zumbis, surge de escravos do país. O protagonista e herói é um homem negro, que salva a outra protagonista ainda nos primeiros minutos. E após conseguir sobreviver inúmeras situações com mortos-vivos, o protagonista morre pelo esquadrão de extermínio de zumbis, ao ser “confundido” com um zumbi. Um tiro frio e certeiro que deixa em aberto se foi mesmo uma confusão que ocasionou a morte.

Zumbis também podem ser vistos como uma metáfora para as mudanças climáticas que estão acontecendo no mundo, tornando-se cada vez mais esse lugar inabitável. Além disto, o tema de morte que deixa tantas pessoas em negação é estampado nos filmes desse gênero.

Mas, além das metáforas que um zumbi pode significar, há ainda os personagens humanos, com o qual o espectador tende a se identificar. O cenário pós-apocalíptico é um mundo devastado, sem resquício de civilização. Ou seja, não importa mais quem você era antes do planeta ser infestado por zumbis, agora, qualquer pessoa pode sobreviver. Esse sentimento de “eu posso fazer isso” perpetuado entre os fãs da cultura zumbi é um dos maiores pontos de se identificar com alguém na história. E isso ganha mais força, quando as tramas dos personagens são exploradas mais a fundo, como estão sendo em “The Walking Dead”, por exemplo.

“The Walking Dead”

Porém, essa identificação de “eu posso fazer isso” em um apocalipse zumbi não funciona para todas as pessoas, especialmente porque os personagens têm uma tendência de ser sérios o tempo inteiro. O mesmo “The Walking Dead” que se preocupa tanto em ser visto de maneira realística, peca ao esquecer um dos traços primordiais dos seres humanos: o humor.

Apesar de que na série há cena ou outra que provoca uma risada, raramente esse aspecto é relacionado com o pós-apocalipse, como se fosse um pecado se divertir enquanto se tenta fazer um carro funcionar, por exemplo. O humor nos filmes de zumbi é raramente representado. Nos anos 1980, foram feitas várias paródias do gênero, e o próprio “Todo Mundo Quase Morto” funciona como uma paródia de “Madrugadas dos Mortos” de Snyder, ambos de 2004. Mas há de se entender a diferença aqui. A paródia tira sarro de tudo, inclusive do próprio subgênero de zumbis; o humor que está sendo falado nessa coluna é aquele que deveria ser representado pelos personagens dentro da história.

Então, chega “Zumbilândia” (2009), que é o filme que mais se aproxima em retratar esse sentimento humano. O longa se coloca como uma comédia completa, mas não como uma paródia. Nele, o medo da morte ainda existe, está presente o tempo inteiro, mas não é isso que vai impedir alguém de se divertir, especialmente em um mundo praticamente sem regras (ou com algumas delas…). Tanto que os personagens principais se divertem ao saquear supermercados e destruir carros.

“Zumbilândia” (2009)

Os personagens deixaram tudo para trás, ao ponto de serem identificados por nomes de cidades. As diferenças entre os personagens e esse divertimento de destruir um carro (que sejamos honestos, quem não iria gostar disto?) criam situações cômicas. Mas “Zumbilândia” se destaca porque, quando começamos a pensar sobre a produção, percebemos que ela não fica presa só à comédia. O filme faz questão de mostrar como cada um lida com a realidade do mundo pós-apocalipse zumbi.

Columbus (Jesse Eisenberg) tem como objetivo encontrar uma namorada. O que a princípio pode parecer bizarro e um recurso cômico, também traz uma certa verdade sobre o mundo que está em estado de terror: ele é propício para um clima amoroso. O próprio personagem fala que antes do apocalipse ele já evitava as pessoas, mas não é à toa que casais de namorados se abraçam em cenas de filmes de terror. Infelizmente ou não, o medo é uma forma de aproximação.

Outro personagem, Tallahassee (Woody Harrelson) perde a pose de alguém que parece gostar de fazer matança de zumbis ao buscar uma marca de doce que o traz de volta ao passado. As irmãs Wichita (Emma Stone) e Little Rock (Abigail Breslin) têm visões quase opostas do mundo. A mais velha só se interessa pela sobrevivência, enquanto a mais nova tenta viver a infância que nunca teve.

“Zumbilândia” acerta quando consegue inserir tais problemas em um filme com humor que é ironicamente um tanto quanto realista no pós-apocalipse zumbi, já que o espectador consegue se identificar com algum dos personagens. E o longa mostra que mesmo o mundo estando naquele estado, não é preciso perder sua humanidade. Essa frase, perder a humanidade, para “The Walking Dead”, é colocada para pessoas que matam e torturam outros vivos sem motivo algum. Mas a série de TV não percebe que seus próprios personagens principais perdem o humor que nós temos, e fica difícil se identificar com pessoas assim.

Se você não é tão fã dessa pegada que trata do pós-apocalipse zumbi com mais comédia e prefere o clássico esquema de Romero, não tem problema. Filmes sobre os mortos vivos são inúmeros, diversificados, e por todos motivos já citados aqui nessa coluna, estão longes de acabar.

“Zumbilândia: Atire Duas Vezes”, a sequência do filme de 2009, que chega 10 anos depois do original, estreia nesta quinta-feira (24) nos cinemas brasileiros. Assista ao trailer!

Amanda Gongra
@a_gongra

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