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Colunas   quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

A carreira de Aaron Sorkin – Diálogos dos bastidores da vida “real”

O experiente roteirista, que inicia seu trabalho como diretor este ano com "A Grande Jogada", é conhecido por seus rápidos e longos diálogos e pela preferência por histórias sobre os bastidores das profissões.

“Na minha infância, durante os jantares com a minha família, qualquer pessoa que usava uma palavra quando poderia ter usado dez simplesmente não estava tentando o suficiente”.

“Todos na minha família são mais inteligentes do que eu, todos os meus amigos são mais inteligentes, todos os meus amigos de quando eu estava crescendo eram mais inteligentes do que eu, e eu comecei a apreciar o som de pessoas inteligentes discutindo entre si. E eu queria imitar esse som”.

Durante uma entrevista no programa Jimmy Kimmel Live!, para promover o filme “Steve Jobs” (2015), o roteirista Aaron Sorkin conseguiu resumir o que distingue seu trabalho dos demais, assim como o que faz com que seus roteiros autorais sejam facilmente reconhecidos: os extensos diálogos entre personagens inteligentes.

Aaron começou sua carreira de escritor nos teatros, criando algumas peças no cenário off-Broadway. Um dia, após uma conversa com sua irmã advogada sobre um caso no qual ela estava trabalhando (a defesa de dois oficiais da Marinha que quase mataram um colega durante um trote ordenado por um superior), Sorkin teve a ideia que originou sua peça mais bem-sucedida: “Questão de Honra”. O sucesso do drama atraiu a atenção das produtoras e seus direitos de adaptação foram comprados pela Castle Rock Enterteniment, onde Aaron conseguiu seu primeiro trabalho como roteirista, adaptando sua própria peça para o cinema.

“Questão de Honra”, drama jurídico de 1992, dirigido por Rob Reiner (“Conta Comigo”) e estrelado por Tom Cruise (“A Múmia”), Demi Moore (da série “Empire”) e Jack Nicholson (“O Iluminado”), foi indicado a quatro categorias do Oscar, incluindo Melhor Filme e Melhor Ator Coadjuvante, e a cinco Globos de Ouro, incluindo Melhor Diretor e Melhor Roteiro.

O cenário de tribunal possibilitou que Sorkin explorasse o que faz de melhor. Todo o julgamento, assim como sua preparação, são recheados de diálogos e monólogos proferidos por profissionais considerados os melhores em seus trabalhos, com senso moral incorruptível. Segundo a American Film Institute, o filme detém o título de 29° citação mais conhecida do cinema americano, presente na icônica cena na qual o personagem de Nicholson está sendo interrogado por Cruise no tribunal.

“Você quer a verdade? Você não aguenta a verdade!”.

Desde então, a frase já foi referenciada em diversas outras produções da cultura pop como “Os Simpsons”“House” e “Seinfeld”.

Ainda sob contrato com a Castle Rock, Aaron escreveu mais dois roteiros: “Malícia”, drama médico de 1993 (que Sorkin dividiu os créditos com o roteirista Scott Frank, de “Logan”), e “Meu Querido Presidente” (1995), repetindo a parceria com Rob Reiner e sendo mais uma vez indicado ao Globo de Ouro de Melhor Roteiro.

Quando seu contrato com a produtora chegou ao fim, Sorkin resolveu se aventurar no mundo da televisão. Em 1998, ele criou e roteirizou “Sports Night”, série que teve muitos episódios dirigidos por Thomas Schlamme (da série “The Americans”). A trama acompanhava os bastidores de um programa de esportes e o relacionamento de seus integrantes. Apesar de ter durado apenas duas temporadas, a série foi bem recebida pelo público e pela crítica. Sorkin e Schlamme se reuniram novamente em dois outros projetos na TV: “The West Wing – Nos Bastidores do Poder” e “Studio 60 on the Sunset Strip”.

“The West Wing” foi ao ar de 1999 a 2006 e se tornou uma das séries mais premiadas da televisão americana, ganhando nove Emmys em sua temporada de estreia e sendo indicada para a categoria de Melhor Série Dramática em todas as suas sete temporadas. A história mostra os acontecimentos da Ala Oeste da Casa Branca, onde trabalham o presidente (interpretado por Martin Sheen, da série “Grace e Frankie”) e seus assessores. Já “Studio 60 on the Sunset Strip” não teve tanta sorte. A comédia dramática que acompanhava os bastidores de um programa humorístico similar ao “Saturday Night Live” não teve uma audiência tão boa e foi cancelada ainda em sua primeira temporada.

Em entrevista para o The Feed, Thomas Schlamme afirmou que, ao ler os roteiros de TV de Sorkin ele sentia tanta energia que não conseguia ficar parado. E ele resolveu transformar essa energia presente no texto no que ficou conhecido como “Walk and Talk”, técnica que pode ser traduzida como “andar e falar”. Para dar mais dinamismo a uma cena com longos diálogos, os personagens aparecem andando, literalmente “levando” a cena para algum lugar. Essa técnica pode ser percebida hoje em diversas séries da atualidade.

Sorkin retornou aos cinemas em 2007, com o filme “Jogos de Poder”, mais uma vez abordando o tema dos bastidores da política. Baseado em uma história real do deputado americano Charles Wilson (Tom Hanks, de “The Post: A Guerra Secreta”), o filme fala sobre a Operação Cyclone, um programa que organizou e patrocinou os mujahidin afegãos em sua resistência à ocupação soviética do Afeganistão.

Em seguida, vieram “A Rede Social” e “O Homem que Mudou o Jogo”, que proporcionaram a Sorkin duas indicações seguidas a categoria de Melhor Roteiro Adaptado no Oscar, em 2011 e 2012. E foi a cinebiografia do criador do Facebook que lhe rendeu sua primeira estatueta. Os dois filmes são exemplos claros do estilo do roteirista: histórias baseadas em fatos sobre pessoas extraordinariamente boas em sua linha de trabalho e que revolucionam o modo de pensar da indústria, através de longos e rápidos diálogos e monólogos. Sorkin repetiria novamente a fórmula em 2015, contando a história do criador da Apple de modo peculiar em “Steve Jobs”.

>>[CRÍTICA] Steve Jobs (2015): drama mostra o homem por trás do gênio

Aaron fez um rápido retorno a televisão na série “The Newsroom” exibida de 2012 a 2014. O drama acompanha os bastidores de um programa jornalístico e aborda diversas questões éticas do jornalismo e sobre o direito da informação.

O estilo de Sorkin, a fórmula por trás de seus roteiros e repetição de certas frases “de efeito” são algumas das razões pelas quais o roteirista é identificado facilmente em seus trabalhos. Um canal no Youtube chegou até a compilar os “Sorkinismos” presentes em suas obras:

O experiente roteirista faz sua estreia na posição de diretor este ano com “A Grande Jogada”. Baseado em uma trama real, o filme conta a história da esquiadora Molly Bloom (Jessica Chastain de “Armas na Mesa”) que, após perder a chance de participar dos Jogos Olímpicos, decide tirar um ano de folga dos estudos e ir trabalhar como garçonete em Los Angeles. Através de circunstâncias curiosas, ela acaba se tornando milionária e famosa por organizar os mais exclusivos jogos de pôquer da região. Apenas pela sinopse, já é possível sentir a essência de Sorkin no roteiro, contando novamente os bastidores de uma história real através de uma pessoa que, apenas com a inteligência, conseguiu revolucionar um meio.

>>[CRÍTICA] A Grande Jogada (2017): a dinâmica de uma mulher poderosa

E você, gosta do estilo que Aaron Sorkin adota em suas obras? Qual dos filmes dele é o seu preferido? Acha que ele vai ser tão bom diretor quanto roteirista? Deixe um comentário para nós!

Lívia Saenz
@saenz_livia

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