Rogue One – ou A Arte de Mudar Sem Perder a Essência
Falamos sobre o que Rogue One trouxe para a franquia Star Wars. A Disney tem feito um bom trabalho?
Quando a Disney comprou a Lucasfilm por mais de 4 bilhões de dólares em 2012, nós sabíamos que a Casa do Mickey tinha grandes planos para a franquia Star Wars. O medo se espalhou entre os fãs que ficaram receosos com as mudanças, como seres humanos costumam fazer. O mercado começou a especular qual caminho o estúdio seguiria com as produções, contrastando o sucesso da trilogia original com a contribuição discutível da nova trilogia; o posterior anúncio de uma nova série de filmes, bem como derivados paralelos à trama principal, aguçou ainda mais a atenção e o temor de todos.
Enquanto isso, do alto de seu cargo da presidência da Lucasfilm, Kathleen Kennedy e seu estúdio imitavam Lenine e pediam aos fãs um pouco mais de paciência. Mudanças viriam, é claro, mas eles sabiam qual era o segredo para o sucesso.
Quando “Star Wars: O Despertar da Força” chegou aos cinemas, descobrimos que eles estavam certos. A roupagem era nova – desde a representatividade presente no filme até o compasso da narrativa e o ar saudosista que permeia os produtos culturais de 2010 para cá. Essa linguagem diferenciada atraiu novos públicos, e pais subitamente viram seus filhos pedindo que seus aniversários de 5 anos não fossem mais da Peppa Pig, mas de Star Wars, e que trocassem as máscaras de porquinha por Darth Vaders. Uma franquia com quase 40 anos alcançou uma nova geração para se perpetuar por mais décadas vindouras.
Mas isso não seria o suficiente, e a Disney sabia disso. Os efeitos especiais avançados não convenceram os fãs à época de “A Ameaça Fantasma”, e a aproximação do roteiro de “A Vingança dos Sith” da trilogia original não salvou o filme das duras críticas (até porque tinha o Hayden Christensen, convenhamos). Mais do que capturar novas audiências, era preciso fazer com que o público anterior se sentisse em casa novamente, resgatando a sensação que os filmes da década de 70 causaram.
Nos dois casos – no alcance de novos públicos e na manutenção dos antigos -, a Disney sabia, desde o primeiro momento, que seria necessário resgatar a essência de Star Wars.
O “Episódio VII” veio e foi, e percebemos que o dever de casa estava cumprido. Lá estavam as pessoas que amávamos, do jeito de que tanto sentíamos falta, com uma história focada não em uma longa e enfadonha dinâmica política, mas nas personagens e no seu universo – os reais trunfos da saga espacial. Ainda assim, o roteiro de “O Despertar da Força” havia trilhado um caminho seguro e consideravelmente previsível, mas o que esperar de “Rogue One: Uma História de Star Wars”?
Com as primeiras notícias e posteriores trailers, vimos de imediato que era uma história pé no chão – literalmente. “Rogue One” se trataria dos soldados de trincheira, aqueles que deram e dariam ainda mais do seu próprio sangue pela rebelião contra o Império, que viveriam e abririam mão de suas vidas para que Luke, Leia e Han Solo pudessem receber as honras e as medalhas. Sem Jedi, sem movimentar coisas com a mente, sem tiros e manobras em ângulos impossíveis com suas naves – em outras palavras, sem os elementos mais famosos de Star Wars.
E ainda assim, “Rogue One” é um sucesso.
Aqui, fica de lado se gostamos ou não do filme, mas vamos além e chegamos ao fato de que o filme é bom, e o público o amou. Já figurando no topo de muitas listas pessoais de “melhores filmes de Star Wars”, “Rogue One” foi bem sucedido pelo mesmo motivo que “Star Wars VII” o foi: porque a essência está mantida.
Os personagens recebem a devida atenção do roteiro, fazendo com que nos identifiquemos com facilidade; robôs possuem falhas de programação e subitamente se tornam mais humanos; uma única pessoa, aparentemente sem nada especial, precisará enfrentar seus demônios e liderar um grupo de renegados para derrotar uma ameaça a nível galáctico – e subitamente você já não sabe se estamos falando de “Uma Nova Esperança”, “O Despertar da Força”, ou de “Rogue One”.
Nesse ponto, fica notável que se trata da arte de mudar a roupagem de algo sem perder a essência que o define – o que é uma lição que nós mesmos deveríamos absorver. Com os percalços e dificuldades que a vida nos impõe, é impossível nos mantermos os mesmos; relacionamentos antigos vão e novos vêm, experiências nos moldam e nos modificam, e nossas esperanças e medos também assumem novas formas. O elemento crítico durante estas transformações é saber o que nos é mais importante em nossas identidades e lutar com unhas e dentes para manter essas características e não nos perdermos. É amadurecer sem perder a infância, ou enfrentar a realidade sem perder a doçura, ou se decepcionar mas não perder a confiança. Se Bruce Lee disse que devemos ser como água, é exatamente porque devemos nos adaptar, mas sem perder de vista o fato de que, apesar da forma, o que somos em essência não pode mudar.
A Disney mostrou por duas vezes consecutivas que, no que tange Star Wars, ela sabe bem disso. Então, quando olhamos para o horizonte da saga e vemos os filmes vindouros do Episódio VIII, o derivado do Han Solo, e o que mais possa vir depois disso, é impossível saber a forma que eles terão.
Ainda assim, podemos ter uma certeza: será Star Wars.