Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Dupla Jornada (Netflix, 2022): ação de algoritmo é o novo clichê

Jamie Foxx protagoniza a primeira obra dirigida por J.J. Perry, que peca com exageros e roteiro fraco.

Não é de hoje que a Netflix produz obras de ação feitas exclusivamente para divertir. As críticas para o tal algoritmo acabam justificáveis com a grande quantidade de repetições de certos itens, como por exemplo, a famosa dupla improvável, composta por um assassino pronto para a ação e um novato atrapalhado — eles começam se odiando e um conquista a amizade do outro. Cerca de um mês depois do lançamento de “O Homem de Toronto”, chega na plataforma de streaming “Dupla Jornada”, com uma proposta muito parecida. A diferença é que a nova trama conta com vampiros no roteiro. Trata-se do primeiro longa-metragem de J.J. Perry, que tem longa carreira de dublê. Ele trabalhou em aproximadamente 150 filmes nessa função, por isso, está mais do que acostumado com coreografias de luta e cenas de ação.

A trama é sobre Bud Jablonski (Jamie Foxx), que finge trabalhar com limpeza de piscinas, mas tudo é um pano de fundo para sua verdadeira profissão: caçador de vampiros. Uma luta com uma idosa sanguessuga logo de início já demonstra o que vem pela frente, com ação frenética e uma pegada de filmes gore. Bud está separado da sua esposa, Joss (Meagan Good), que está pensando em vender a sua casa para ir morar com a filha Paige (Zion Broadnax) na Flórida, pois não está dando conta da parte financeira da família. Assim, Bud tem cinco dias para arranjar cerca de US$ 10 mil para pagar a escola, plano odontológico e outros gastos cotidianos da filha antes da possível mudança.

Big J (Snoop Dogg), outro folclórico assassino de vampiros, ainda trabalha para o Sindicato, uma agência que reúne diversos matadores e cuja qual Bud foi expulso depois de uma centena de incidentes. Com a ajuda do amigo, o protagonista consegue mais uma chance de trabalhar no turno da manhã, que paga muito mais do que o comércio ilegal. As duas condições são que ele vá acompanhado para as missões com Seth (Dave Franco) e não cometa mais erros. Acostumado a trabalhar na parte burocrática, Seth é um garoto medroso que precisa ir a campo para ser os olhos e ouvidos do chefe Ralph Seeger (Eric Lange), que só espera um motivo para demitir Bud de forma definitiva. Enquanto isso, ele tem que lidar com Audrey (Karla Souza), uma vampira que trabalha como corretora de imóveis e tem o desejo de dominar a região da Califórnia.

“Dupla Jornada” não se leva a sério, e isso é ótimo. Porém, o problema é mais básico do que parece: as motivações, tanto do protagonista quanto da vilã, são muito fracas, e o diretor passa do ponto em certos momentos. Alguns exageros nas lutas acabam diminuindo as cenas, como se o diretor se empolgasse com as acrobacias, chutes e mortes, que acabam virando piada, quando claramente eram mais direcionadas para ação do que para comédia. Por mais que a intenção do gore seja a do exagero, aqui, vira vergonha alheia de vez em quando.

Com um orçamento mediano, os efeitos visuais ficam entre o regular e o bom, o suficiente para cumprir a proposta em conjunto com efeitos práticos e uma boa maquiagem. Além de Perry, o roteirista Tyler Rice também estreia em longas-metragens e divide o texto com Shay Hatten, este já experiente em filmes de ação como “John Wick 3: Parabellum” e “Army of the Dead: Invasão em Las Vegas”.

O filme é mais um lançamento que vai atrair público para a Netflix, e isso não é ruim. Certas produções não precisam ser obras de arte. O que incomoda é a repetição de estruturas e de arcos em relação aos exclusivos do mesmo gênero da própria plataforma. Talvez, “Dupla Jornada” não mereça tantas críticas, mas que sirva como um desabafo. Não é nem engraçado quanto “Amor e Monstros” e nem se leva a sério quanto “Agente Oculto”. Tem uma agência de assassinos mais simples que “O Homem de Toronto”, as cenas de ação são piores em comparação com “Resgate” e os vampiros são menos interessantes do que em “As Passageiras“. É um conjunto de elementos de outros filmes. Tem quem pague, tem público e tem quem goste. É legal, mas tão empolgante quanto estar com fome e só ter gelatina sem sabor no armário da cozinha.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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