Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 13 de maio de 2019

John Wick 3: Parabellum (2019): abraçando o cinema de gênero

Crescendo sem precisar apelar para megalomanias excêntricas, o terceiro capítulo da franquia se mantém firme na premissa básica e nas cenas de ação enquanto tenta trazer novos detalhes para explorar no futuro.

Quando “De Volta ao Jogo” chegou aos cinemas em 2014, não tinha como saber que dali surgiria uma das mais ricas franquias para o cinema de ação. Não por apresentar um roteiro denso nem por contar com atuações memoráveis, a beleza do filme estava no cuidado que o estreante diretor, Chad Stahelski, dava à sua obra. Com anos de experiência como dublê, ele tinha um conhecimento cirúrgico de como coreografar uma luta. O destaque estava no trato dado à forma como as cenas foram filmadas. Desde então, a história transformou-se em franquia que, em seu terceiro capítulo “John Wick 3: Parabellum”, busca ampliar o universo sem deixar de lado a pancadaria. Começando imediatamente após o acontecimento final do longa anterior, vemos John Wick (Keanu Reeves, “Cópias – De Volta à Vida”) tentando se manter vivo enquanto todos os assassinos de Nova York tentam ganhar a recompensa de 14 milhões de dólares pela sua cabeça.

“John Wick 3: Parabellum” é uma obra que se destaca pelo visual, mas sua beleza não se limita a isso. Existe um cuidado muito evidente com a fotografia, tanto na paleta de cores, sempre ressaltando tons mais contrastados e fortes, quanto no modo como tudo é cuidadosamente bem mostrado, sem movimentos bruscos e cortes excessivos – ao contrário, o que vemos é um preciosismo cativante por longos planos. Acima de tudo fica a dedicação de Stahelski em fazer um filme de gênero como ele deve ser feito. Reconhecendo suas possibilidades e suas limitações, o diretor investe em cenas de ação orgânicas e realistas com uma coreografia cuidadosa e sempre muito bem executada. Não por acaso, o passado de John Wick remete a uma escola de balé.

Mais do que uma simples sequência, este longa serve para estabelecer definitivamente uma franquia. O objetivo aqui é construir conexões, apresentar hierarquias, antecipar conflitos e estabelecer a mitologia, não apenas da personagem título, mas de outras – sejam velhas conhecidas ou não. E para isso o roteiro abre mão de uma lógica narrativa que parte de um ponto A para um ponto B, levando o protagonista numa trajetória para frente. A percepção de que esta produção tem uma função maior dentro do que John Wick se tornou (e dentro do que ainda deve se tornar) é refletida num diálogo do próprio filme, quando o protagonista é indagado sobre atravessar uma jornada para terminar como começou.

Talvez por tal motivo essa sequência seja a mais carregada de cenas de luta, nos mais diversos cenários e com as mais diferentes e criativas variações. Corredores pequenos são colocados, não para sugerir uma dificuldade, mas para reforçar a narrativa de que John Wick é bom no que faz. Embora a batalha que antecede a luta final soe forçada e não possua função alguma na obra, podendo ser ignorada sem afetar em nada o longa, todas as sequências de ação são um espetáculo à parte. Em especial a que conta com a participação de Halle Berry (“Kingsman: O Círculo Dourado”), se destacando dentro da franquia. A atriz, inclusive, surge como uma das melhores adições que os filmes já tiveram, apresentando uma personagem interessante e com camadas colocadas de forma natural.

Embora o terceiro ato deixe a desejar em criatividade conforme avança, é interessante ver como a obra não tem medo de arriscar novas ideias e dar mais profundidade, tanto às pessoas que compõem o universo, quanto ao locais (o Continental Hotel aqui torna-se um membro definitivo da história). As lutas finais poderiam ser melhor tratadas e, se não fosse por esse pequeno inconveniente, estaríamos diante do melhor filme da franquia.

Com um gancho criado sem o imediatismo do que o usado para ligar o longa anterior a este, as sequências de John Wick devem começar a buscar uma grandiosidade cada vez mais intensa e expressiva. É difícil saber para onde o futuro levará, mas enquanto souber se reconhecer como um filme de gênero, respeitar suas limitações e investir em suas qualidades, não há limites possíveis para Chad Stahelski e sua obra.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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