A Netflix tem potencial para produzir séries com o mesmo padrão de qualidade da HBO?
Empate entre Netflix e HBO no Emmy 2018 acirrou ainda mais a disputa entre as duas.
O mundo do entretenimento, assim como tantos outros, é marcado por rivalidades. Seja nos cinemas ou na TV, é simplesmente natural que existam disputas sadias entre empresas que pretendem desbancar suas concorrentes e atrair o público para o seu lado, precisando sair de suas zonas de conforto para conseguirem encontrar novas formas de elevar o padrão de qualidade de seus produtos e se sobressaírem em um mercado cada vez mais competitivo. Na última semana, uma rivalidade em particular atraiu os holofotes para si: a disputa entre Netflix e HBO.
A 70ª edição do Emmy Awards foi o palco da batalha mais recente do confronto entre as duas, e os resultados demonstram que essa disputa deve ficar ainda mais acirrada daqui em diante. Embora a HBO tenha conquistado o principal troféu da premiação, com sua série “Game of Thrones” sagrando-se como a vencedora na categoria Melhor Série Dramática, a gigante do mercado de streaming acabou conseguindo superar as expectativas ao empatar com a HBO em número de premiações, com cada uma levando 23 estatuetas para casa.
A premiação ocorreu poucos dias após Randall Stephenson, o CEO da AT&T, dona da HBO, afirmar à Variety que a Netflix é o Walmart dos serviços de vídeo por assinatura, ao passo em que a HBO seria a Tiffany & Co. Com essa comparação, Stephenson claramente afirmou que a Netflix, apesar do seu vasto catálogo de produções, ainda está longe de alcançar o padrão de excelência visto nas séries da HBO, que costumam ser verdadeiras queridinhas tanto do público quanto da crítica especializada.
Todavia, o empate na edição desse ano da premiação mais importante da televisão americana demonstra que a disparidade existente entre as duas está longe de ser tão grande quanto o CEO da AT&T sugeriu em seu comentário. Assim, muitos começaram a se questionar se a Netflix já não teria alcançado o mesmo padrão da HBO, ou se ela pelo menos teria potencial para produzir séries com o mesmo nível de qualidade dos seriados de sua concorrente.
O excelente resultado obtido pela Netflix no Emmy 2018 mostra que a mesma está no caminho certo para se notabilizar no imaginário popular não apenas como uma empresa que produz uma grande quantidade de conteúdo, mas como uma empresa conhecida por ofertar ao público produtos de qualidade elevada. Esse avanço gradual é uma consequência direta do aumento do investimento da Netflix nos últimos anos em suas produções originais, com um exemplo claro sendo o da série “The Crown“.
Com um orçamento de aproximadamente 130 milhões de dólares por temporada, “The Crown” não apenas é a série de custo mais elevado da Netflix, como também é a série de TV mais cara da história. A Netflix claramente não mediu esforços para que o seriado que narra os dramas vividos pela rainha Elizabeth II se tornasse um sucesso de público e crítica, e já está colhendo os frutos desse investimento.
A primeira temporada da série foi o grande destaque da edição de 2017 do Globo de Ouro, levando os prêmios de Melhor Série de Drama e de Melhor Atriz de Série Dramática para Claire Foy (“Uma Razão Para Viver“). Ainda em 2017, o seriado acabou faturando o Emmy de Melhor Ator Coadjuvante em Série Dramática pela atuação de John Lithgow (“Pai em Dose Dupla 2“). Por sua vez, o segundo ano da série também se destacou no circuito de premiações, especialmente no Emmy 2018, em que levou os prêmios de Melhor Atriz de Série Dramática para Claire Foy e Melhor Direção em Série de Drama pelo trabalho de Stephen Daldry (“Trash – A Esperança vem do Lixo“) no episódio “Paterfamilias”.
Com mais duas temporadas já confirmadas, “The Crown” mostrou à Netflix que vale a pena despender valores elevados em suas séries, com esse investimento dando um retorno significativo em um curto período e ajudando a Netflix a expandir e valorizar sua marca em nível mundial. Assim, não chega a ser nenhuma surpresa que a empresa esteja determinada a investir cada vez mais em suas produções originais, já tendo anunciado diversas novas séries que devem contar com orçamentos expressivos e que têm potencial para se tornarem verdadeiros sucessos.
Dentre os projetos futuros da Netflix, um que tem chamado bastante atenção é o seriado “The Witcher“, adaptação da série de livros homônima do escritor Andrzej Sapkowski. A saga do bruxo Geralt de Rívia se popularizou internacionalmente com a ajuda da trilogia de jogos desenvolvida pela CD Projekt RED, especialmente com o lançamento de “The Witcher 3: Wild Hunt“, em 2015, que se tornou um verdadeiro fenômeno entre os aficionados por jogos eletrônicos.
Logo, trata-se de um material que já conta com uma base de fãs consolidada. Fãs que há anos esperam para ver essas histórias finalmente ganharem uma adaptação live-action, e que finalmente tiveram sua paciência recompensada quando a Netflix anunciou que iria produzir uma série baseada nos livros. A Netflix certamente está consciente de que tem em suas mãos uma verdadeira mina de ouro pedindo para ser explorada, e sabe que o sucesso desse empreendimento dependerá, dentre outras coisas, de atender às expectativas dos fãs da saga.
Um dos aspectos mais fascinantes de “The Witcher“, seja nos livros ou nos jogos, é justamente o seu mundo fantástico, repleto de criaturas mágicas e marcado por grandes batalhas. Um mundo que certamente custará um montante elevado para ser transposto para a TV com a qualidade esperada pelos fãs. Embora o orçamento da produção ainda não tenha sido divulgado, a postura recente da Netflix sugere que ela está disposta a tomar todas as medidas necessárias para assegurar o sucesso da série, tendo inclusive escalado um grande astro dos cinemas para protagonizá-la: ninguém menos do que Henry Cavill (“Liga da Justiça“).
Fã assumido do material, Cavill foi o escolhido para dar vida ao bruxo Geralt na série, uma escolha que demonstra que a Netflix realmente está investindo na produção e se esforçando para entregar um produto que seja capaz de agradar aos fãs e atrair a atenção do público em geral.
Outro projeto da Netflix que tem todos os ingredientes necessários para se tornar um grande sucesso é a recém anunciada série live-action baseada na animação “Avatar: A Lenda de Aang“. Exibido entre 2005 e 2008 pela Nickelodeon, o desenho conseguiu atrair fãs de todas as idades, que a cada episódio se encantavam ainda mais pela história graças ao carisma de seus personagens e ao tom épico da jornada de seu herói.
A animação já foi adaptada para os cinemas em 2010 no filme “O Último Mestre do Ar“, escrito e dirigido por M. Night Shyamalan (“Fragmentado“). Entretanto, o longa acabou sendo não apenas um fracasso de crítica, mas uma verdadeira decepção para os fãs do desenho. Desse modo, a Netflix tem o desafio de fazer os fãs superarem o trauma causado pelo filme e passarem a ter esperanças de que a animação possa enfim ser adaptada com dignidade.
Não é uma tarefa fácil, e a produção exigirá um grande investimento por parte da Netflix para ter condições de ser bem sucedida, mas os primeiros passos para garantir a qualidade do seriado já foram dados. Isso porque já foi anunciado que a série contará com Bryan Konietzko e Michael DiMartino, os criadores da animação, como seus produtores, o que deve assegurar que a série adapte com fidelidade a história do desenho.
Esses são apenas alguns exemplos do que a Netflix tem reservado para os próximos anos em termos de grandes produções, mas o questionamento persiste: teria a Netflix o potencial para produzir séries com a mesma qualidade das produções da HBO?
A resposta não poderia ser mais simples. A Netflix não só tem o potencial para fazer séries do mesmo nível das da HBO, como já o faz. “The Crown” é um retrato claro dessa realidade, mostrando que uma produção da Netflix pode sim competir com as séries da HBO em termos de qualidade. Quanto ao futuro, é inegável que a Netflix conta com propriedades com um potencial imenso em suas mãos, bastando agora efetuar os investimentos necessários para fazer delas os sucessos que podem ser.
Se a Netflix realmente vai aproveitar todo o seu potencial e, quem sabe, até mesmo superar a HBO, só o tempo dirá, mas sua postura recente demonstra que ela não entrou nesse jogo para perder. Em contrapartida, a HBO certamente não vai querer ficar para trás nessa disputa, e para se manter no topo vai precisar elevar ainda mais seu padrão de qualidade. E no final das contas, o grande vencedor acaba sendo o público, que pode ter uma certeza: enquanto existirem rivalidades como essa, o futuro do mundo do entretenimento continuará sendo promissor.