Cinema com Rapadura

Colunas   terça-feira, 22 de maio de 2018

Han Solo e a importância das histórias Star Wars

Com um passado intrigante, Han Solo é muito mais do que um mero contrabandista ou aventureiro: ele traz a perspectiva das pessoas comuns em uma galáxia destinada a se dividir.

Você o conhece. É aquele cara que está sentado na mesa no canto da cantina, longe da confusão do bar. É lá que ele brilha, e todos sabem que é ali que o encontrarão. A expressão séria só desaparece após tudo dar certo, quando entra um meio-sorriso fulminante que já derreteu inúmeros corações galáxia afora. Em um universo definido pelo embate místico entre bem e mal, luz e escuridão, o que Han Solo quer é simples: fazer o que gosta e sobreviver. Com o lançamento de “Han Solo: Uma História Star Wars” se aproximando, o Cinema Com Rapadura preparou um resumo das origens do nosso canalha (do inglês “scoundrel“, como dito pela própria princesa Leia em “O Império Contra-Ataca“) favorito não apenas a partir do novo cânon estabelecido pela Lucasfilm em 2012, mas também pelo antigo Universo Expandido (agora chamado Legends).

O Universo Expandido

Quem começa a acompanhar a saga hoje em dia pode ficar surpreso, mas as “histórias Star Wars” que se tornaram filmes vinham sendo contadas em diversas outras mídias: livros, quadrinhos, videogames, etc. Isso ocorreu desde 1976, um ano antes do lançamento de “Uma Nova Esperança“, quando a Marvel lançou o primeiro quadrinho da série. Desde então, um universo gigantesco passou a ser povoado por personagens cada vez mais esquisitos e interessantes, os protagonistas dos filmes tiveram seus passados (e futuros) aprofundados; se consolidava, então, o chamado Universo Expandido.

Mas em termos de Han Solo, um fato salta à vista: inicialmente, ele era um personagem à parte dos demais, com sua participação em “O Império Contra-Ataca” sendo definida apenas na etapa de pré-produção do filme. Os primeiros materiais do Universo Expandido exemplificam isso: o livro “Splinter of the Mind’s Eye“, de Alan Dean Foster, e a trilogia “The Han Solo Adventures“, de Brian Daley. No primeiro, Solo foi totalmente excluído de uma história que trazia Luke Skywalker, Leia Organa, Darth Vader e até Obi-Wan Kenobi, enquanto o segundo trouxe três aventuras dele apenas com seu companheiro Chewbacca a bordo da Millennium Falcon. Em seguida, no entanto, ele foi definitivamente incorporado ao trio de protagonistas, e passou a integrar as principais histórias publicadas.

Em 1997, as origens de Solo como anti-herói com coração de ouro começaram a ser exploradas de fato com o lançamento de “Armadilha do Paraíso“, primeiro livro da “Trilogia Han Solo” de Ann C. Crispin. Nele, vimos o pequeno órfão Han ser recrutado pelo gângster Garris Shrike, começando a bater carteiras nas ruas de seu planeta natal Corellia. É sob a tutela de Shrike que ele aprende a pilotar, atirar e a falar shyriwook (a língua dos wookiees). Mas este crescimento não veio sem sua carga de sofrimento para o jovem Solo, levando-o a finalmente abandonar Shrike e tentar a sorte como piloto independente no planeta Ylesia, onde conhece seu primeiro amor: Bria Tharen. Após desmascararem um esquema local de contrabando de minério, ambos são forçados a seguir seus rumos separadamente, e Han decide entrar para a Academia Imperial.

Ainda em 1997, o segundo livro da trilogia é lançado, “The Hutt Gambit” (ainda sem tradução para o português). Nele, vemos Han ser expulso da Academia após se recusar a executar um prisioneiro wookiee insubordinado chamado Chewbacca. Tentando encontrar emprego, ambos vão para Nar Shaddaa, conhecida como “a lua dos contrabandistas” – um lugar não muito amigável, mas onde certamente haverá emprego para a dupla. É nesta fase que Solo conquista suas principais inimizades: Boba Fett e Jabba the Hutt. Mas é também quando ele conhece aquele que viria a se tornar seu melhor amigo, Lando Calrissian, e pilota pela primeira vez um cargueiro corelliano YT 13-000 de nome Millennium Falcon. Algum tempo depois, ele ganharia a nave do próprio Lando em um torneio de sabacc (jogo de cartas parecido com pôquer) em Bespin.

Um ano depois, em 1998, é lançado o último capítulo da trilogia de origem de Han, “Rebel Dawn“. Nele ocorre um dos episódios-chave do Universo Expandido: a famosa corrida de Kessel pela Millennium Falcon. Precisando de dinheiro rápido, Han aceitou um trabalho de Jabba para contrabandear uma carga na região, que abriga um cinturão de asteroides dentro de uma nebulosa próxima a um círculo de buracos negros, forçando quem se aventura a pilotar praticamente às cegas. Usando todos os diversos fluxos gravitacionais a seu favor, ele consegue cortar o tempo de travessia de 18 para 12 parsecs, estabelecendo um novo recorde. No entanto, ele foi forçado a abrir mão da carga que transportava por ser abordado por um Star Destroyer durante o trajeto, o que lhe rendeu a fúria de Jabba que se vê na trilogia de filmes original.

Ao desembarcar em Tatooine para negociar sua dívida com o Hutt, Solo descobre que Bria Tharen se tornou uma agente da Aliança Rebelde, tendo comandado a operação que roubou os planos da Estrela da Morte, que lhe custou a vida. Enquanto digeria a notícia – entregue justamente por sua nêmese Boba Fett -, Han decide tomar um drinque em uma cantina em Mos Eisley, onde é abordado por um ancião e um jovem fazendeiro buscando passagem para o planeta Alderaan. O resto é história.

O novo cânon

Em 2012, quando a compra da Lucasfilm pela Disney se concretizou, seu primeiro passo foi declarar que um novo cânon seria construído, com o antigo Universo Expandido deixando de integrar as histórias oficiais e sendo renomeado como Legends (“lendas”, em inglês). Foi criado o Story Group, um conjunto de pessoas com profundo conhecimento da saga que são até hoje os responsáveis pelos rumos que ela toma. Novos personagens foram criados e novas aventuras passaram a ser escritas. E Han Solo não poderia ficar de fora.

Enquanto as partes mais importantes de seu passado serão mostradas em “Han Solo: Uma História Star Wars”, já se sabe um pouco sobre ele. Muito de sua origem foi mantida: ele continua sendo um órfão nascido em Corellia que conduzia roubos para sobreviver, continua tendo excelentes habilidades como piloto (mesmo sem ser sensível à Força, ao contrário de Anakin e Luke Skywalker) e continua com sua personalidade forte. Mas sabe-se mais sobre sua vida após a trilogia original do que antes – ele abriu mão de sua patente militar após a vitória da Nova República sobre o Império em Jakku, criou muitos dos procedimentos de pilotagem do novo regime, comandou uma equipe de corrida e sempre se considerou um péssimo pai para seu filho Ben, sendo que as consequências disso já são conhecidas.

Ainda assim, há informações que, a princípio, não estarão em seu filme solo (com o perdão do trocadilho), com a maior e mais relevante delas sendo o fato de ele já ter sido casado, supostamente. Na sexta edição da série “Star Wars” publicada pela Marvel – situada entre “Uma Nova Esperança” e “O Império Contra-Ataca“-, Han e Leia, em fuga de uma pequena frota imperial, buscam refúgio na nebulosa Monsua. Lá, no entanto, eles são encontrados por Sana Starros, uma colega de profissão de Solo que afirma ser sua ex-esposa. Ele jura que este suposto casamento, na verdade, foi apenas parte de um roubo que ambos conduziram no passado.

Então o que esperar de “Han Solo: Uma História Star Wars”?

Apesar de a Lucasfilm ter renegado o antigo Universo Expandido e estabelecido um novo cânon, as antigas histórias continuam a inspirar em muito as novas. Grandes acontecimentos nos materiais lançados desde então buscaram inspiração no anteriores, com até mesmo personagens sendo trazidos inteiros para o cânon – como o grande almirante Thrawn, da série “Star Wars Rebels“. Mesmo nos filmes, eventos relevantes como a queda de Ben Solo (Adam Driver) ao lado negro da Força ou o exílio de Luke Skywalker (Mark Hamill) já tiveram seus correspondentes publicados entre os anos 1990 e 2000.

Com Han Solo não será diferente, ao que tudo indica. Como vem sendo mostrado nos trailers publicados até agora, a essência da interpretação de Alden Ehrenreich permanece no personagem eternizado por Harrison Ford. A Qi’ra de Emilia Clarke emite ecos do que foi Bria Tharen nos antigos livros, com o Tobias Beckett de Woody Harrelson lembrando uma versão atenuada de Garris Shrike.

No entanto, a principal expectativa para “Han Solo: Uma História Star Wars” não reside necessariamente na origem dos personagens ou na qualidade das interpretações, mas na grande oportunidade de se expandir este que já é um universo imenso. Em 2016, “Rogue One” inovou ao contar uma história que não tinha na Força ou nos Skywalker seu ponto de equilíbrio, apesar de todo o peso das cenas com Darth Vader. Agora, a chance é de se deixar a política galáctica totalmente de lado e abstrair a dicotomia entre Aliança Rebelde (bem) e Império (mal), com um conto focado em uma faceta nova e praticamente inexplorada de “Star Wars” que é o submundo do crime. Sem sabres de luz ou indivíduos com habilidades sobrenaturais, ele traz algo muito mais próximo à realidade do espectador: pessoas comuns que querem apenas trilhar seus caminhos e viver suas vidas nesta galáxia eternamente dividida por suas guerras internas.

Julio Bardini
@juliob09

Compartilhe


Conteúdos Relacionados