Cinema com Rapadura

Colunas   sexta-feira, 02 de março de 2018

Gafes no Oscar: 8 escolhas questionáveis na categoria de Melhor Filme

Saiba quais produções fizeram história na premiação por não "merecerem" a maior honraria do mundo do cinema.

O Oscar pode até ser a maior premiação do cinema, mas isso nem sempre quer dizer que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas acerta em suas escolhas, principalmente, na categoria de Melhor Filme. De maneira geral, a votação é fortemente influenciada por fatores externos, como politicagem e investimentos financeiros milionários. Isso quer dizer que, quase sempre, a estatueta de melhor filme do ano será dada àquele com a melhor (e mais cara) campanha da temporada de premiações.

Na maioria das vezes, essa prática não chega a ser um grande problema, porque a produção premiada costuma ser inofensiva, aquela que agrada indústria, público e crítica, que não divide opiniões ou coloca a Academia em bola dividida. Em outras palavras, o Oscar valoriza o consenso, e não filmes que geram reações fortes, sendo essas positivas ou negativas. Até porque o conceito de “bom” é relativo, e atribuir valor de “melhor” a algo não é tarefa fácil, especialmente em uma categoria tão subjetiva como a de Melhor Filme. O problema começa quando a Academia decide contrariar o consenso e premiar filmes inexpressivos, sem nenhuma justificativa plausível.

Com isso em mente, o Cinema com Rapadura listou algumas das maiores gafes cometidas pela premiação na escolha de melhor filme do ano. Veja:

“Crash – No Limite” (2004)

O filme de Paul Haggis é, de longe, a escolha mais fácil e óbvia desta lista. Se houvesse uma votação para eleger os maiores erros da história da Academia, “Crash – No Limite” provavelmente estaria no topo da lista. A revolta de muitos críticos e fãs de cinema não é infundada, basta dar uma olhada nos demais indicados ao Oscar de 2005 para perceber a injustiça cometida. O favorito absoluto era “O Segredo de Brokeback Mountain”, longa de Ang Lee sobre o amor proibido entre dois cowboys, uma história que a ala conservadora da Academia não estava disposta a premiar. No fim, a vitória polêmica de “Crash” acabou sendo boa, pois gerou um significativo debate sobre homofobia dentro da instituição.

Para piorar um pouco a situação do vencedor do Oscar, os outros três indicados a melhor filme eram “Capote”, “Boa Noite e Boa Sorte”, e “Munique”. Com uma lista de peso como essa, não é difícil apontar “Crash” como o mais fraco entre os concorrentes, nem mesmo para o diretor Paul Haggis. Em 2015, dez anos após vencer o Oscar, Haggis disse ao site HitFix que não tinha certeza de que seu filme era o melhor daquele ano.

Era o melhor filme do ano? Eu acho que não […] Estou muito feliz de ter aqueles Oscars. Eles são adoráveis. Mas você não deveria me perguntar qual era o melhor filme do ano, porque eu não votaria em Crash – No Limite, simplesmente porque vi arte presente nos outros filmes”, declarou o diretor.

“Shakespeare Apaixonado” (1998)

Assim como “Crash – No Limite”, “Shakespeare Apaixonado” também fez história no Oscar ao se tornar uma das escolhas mais questionadas para a estatueta de Melhor Filme. A diferença é que o longa de John Madden não foi massacrado pela crítica como o de Paul Haggis. A maioria até gosta da obra, classificada como um filme divertido, despretensioso e carismático, mas colocá-lo entre as grandes produções de 1998 parece um pouco absurdo.

O maior problema de “Shakespeare Apaixonado” foi ter competido contra aquele que se tornaria um dos grandes filmes de guerra da história do cinema, “O Resgaste do Soldado Ryan”, dirigido por ninguém menos que Steven Spielberg. E quando pensamos no legado que esses dois filmes poderiam deixar para o cinema, o romance estrelado por Gwyneth Paltrow e Joseph Fiennes parece facilmente esquecível, a não ser pelo fato de ter protagonizado uma das maiores mancadas da Academia.

“Como Era Verde o Meu Vale” (1941)

Dirigido por John Ford, um dos mais renomados diretores do cinema norte-americano, “Como Era Verde o Meu Vale” mostra as dificuldades de uma família que luta para se manter unida em uma pequena cidade mineradora, durante a virada do século XIX. O longa foi indicado a 10 estatuetas e seria tudo o que a Academia procura no melhor filme do ano, se não fosse o fato de “Cidadão Kane” estar na mesma categoria.

Sucesso de público no ano de sua estreia, “Cidadão Kane” é frequentemente citado, nos dias de hoje, como o melhor filme de todos os tempos, e também confere a Orson Welles um status inabalável de gênio do cinema. É válido ressaltar que o longa de Welles não era tão aclamado em 1941 quanto é hoje, mas, em retrospecto, faz a Academia parecer amadora por não ter reconhecido seu potencial.

Há quem diga que “Cidadão Kane” não ganhou o Oscar porque Welles se inspirou em William Randolph Hearst, empresário americano e dono de uma enorme rede de jornais, para criar o protagonista. Hearst não gostou do resultado final e usou sua influência para pressionar a Academia a não premiar o longa. Ele também impediu seus jornais de citarem o filme em críticas e reportagens. Sendo esse o real motivo ou não, o fato é que “Como Era Verde o Meu Vale” é lembrado até hoje, quase 80 anos depois, como o vilão que tirou o Oscar de “Cidadão Kane”.

“Dança com Lobos” (1990)

E já que estamos falando de vilões, é difícil não lembrar que “Dança com Lobos” também entende um pouco do assunto, afinal, foi o responsável por desbancar “Os Bons Companheiros” na cerimônia de 1991. Apesar de sua popularidade à época do lançamento, a estreia de Kevin Costner na direção não conseguiu impedir o desprezo por parte dos mais aficionados pelo clássico de Martin Scorsese, considerado um dos melhores filmes de gângster de todos os tempos.

Os demais indicados na categoria eram “Ghost – Do Outro Lado da Vida”, “O Poderoso Chefão: Parte 3” e “Tempo de Despertar”. O fato de a Academia esnobar nas indicações os queridinhos “Edward Mãos de Tesoura” e “Louca Obsessão” também não contribuiu para a popularidade de “Dança com Lobos”.

“O Discurso do Rei” (2010)

O ano de 2010 marcou a mudança no número de indicados a melhor filme, que deixou de ser cinco e passou a ser dez (e, a partir de 2012, até dez). Com uma lista mais extensa, é natural que um filme ou outro não agrade tanto, mas, em 2011, a lista dos concorrentes à estatueta dourada chamou atenção pela alta qualidade das produções. Dito isso, não é segredo para nenhum cinéfilo que “O Discurso do Rei“, vencedor daquele ano, é um dos mais fracos entre os dez finalistas.

Assim como quase todos os citados nesta coluna, não há nada de (muito) errado com o filme, o problema só fica evidente quando se olha o contexto geral. Produções como “A Origem”, “Cisne Negro”, “A Rede Social” e “Inverno da Alma” são muito mais originais e lembradas nos dias de hoje do que o filme estrelado por Colin Firth. Há até quem argumente que o restante dos indicados, como “Toy Story 3”, “127 horas” e “O Vencedor”, mereciam mais a honraria. A lista contava ainda com “Minhas Mães e Meu Pai” e “Bravura Indômita”. Esse foi mais um dos casos em que a Academia exagerou ao optar pela opção segura e conservadora.

“Argo” (2012)

Não bastasse a escolha inexpressiva de “O Discurso do Rei”, em 2011, a Academia não se conteve e fez algo semelhante dois anos depois com “Argo“, suspense histórico que mostra o resgate de seis diplomatas americanos durante a crise de reféns no Irã, em 1979. A preferência da indústria pelo filme foi vista com mais estranheza ainda pelo fato de Ang Lee ter vencido na categoria de melhor diretor, por “As Aventuras de Pi” (que também concorria a melhor filme), enquanto Ben Affleck nem sequer foi indicado.

Até 2013, apenas três vezes, nos 84 anos de história da premiação, uma produção havia recebido a estatueta de melhor filme sem ter seu diretor indicado, sendo a última delas em 1990, com “Conduzindo Miss Daisy“. Por isso, a vitória de “Argo” acabou gerando bastante discussão em Hollywood e é vista como o reflexo de uma crescente tendência na Academia de separar os premiados das duas maiores categorias (filme e direção).

Além dos já citados, os outros indicados a melhor filme eram: “Amor”, “Indomável Sonhadora”, “Django Livre”, “Os Miseráveis”“Lincoln”, “O Lado Bom da Vida” e “A Hora Mais Escura”.

“Gigi” (1958)

Embora não seja visto como uma escolha desastrosa da Academia, “Gigi” aparece com mais frequência do que gostaria em listas de filmes que não mereceram o Oscar. Por mais carismático que seja, o longa de Vincente Minnelli passa batido facilmente quando se fala da história da premiação e, principalmente, do ano de 1958, responsável por lançar duas obras-primas do cinema: “Um Corpo Que Cai”, de Alfred Hitchcock, e “A Marca da Maldade”, de Orson Welles. Nenhum dos dois foi sequer indicado ao Oscar.

Dentre os concorrentes à estatueta daquele ano, a derrota do aclamado “Gata em Teto de Zinco Quente”, de Richard Brooks, foi a mais sentida. Os longas “A Mulher do Século”, “Acorrentados” e “Vidas Separadas” também estavam indicados.

“Chicago” (2002)

A vitória de “Chicago“, na premiação de 2003, não foi uma grande surpresa. Indicado a 13 estatuetas, o filme estrelado por Catherine Zeta-Jones apenas confirmou o favoritismo evidente durante toda a temporada de premiação. O que talvez seja um pouco mais surpreendente é o fato de um filme altamente aclamado como “O Pianista” não ter tido a menor chance contra o musical de Rob Marshall, ainda mais se levada em conta a inesperada vitória do diretor Roman Polanski na mesma cerimônia.

Tirando o talentoso elenco de estrelas e a propensão da Academia a premiar filmes sobre as artes cênicas, “Chicago” não tem força suficiente para ser colocado entre os melhores do ano, mas ainda assim levou a estatueta dourada para casa. Além de “O Pianista”, os outros indicados foram: “O Senhor dos Anéis: As Duas Torres”, “As Horas” e “Gangues de Nova York”. Embora tenha levado o Oscar de melhor animação daquele ano, “A Viagem de Chihiro”, avaliado como melhor produção do ano pela crítica especializada, foi uma ausência notável na categoria principal.

É claro que, se tratando de uma premiação que já dura 90 anos, muitas outras injustiças podem ter acontecido. Para você, qual foi a maior gafe cometida no Oscar? Deixe sua opinião nos comentários!

Sarah Lyra
@sarahlyra

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