La La Land – ou o Quanto Hollywood Se Ama
O que faz "La La Land: Cantando Estações" receber tanto destaque e favoritismo dentre todos os indicados ao Oscar?
Ter um ego saudável faz bem; se amar e reconhecer suas qualidades e limitações são características relevantes para uma identidade saudável. Dentre todos os seus defeitos, Hollywood já demonstrou que de baixa autoestima ela não sofre: com uma confiança singular, a indústria premia e absorve aqueles que a criticam e eleva à condição de clássicos aqueles que a elogiam.
“La La Land: Cantando Estações” se encaixa no segundo grupo, sendo uma serenata de amor à Hollywood, com suas inúmeras referências e nostalgia imbuída em seu roteiro. A indústria, enquanto isso, como a bem-amada que é, abraçou o filme, dando-lhe 14 indicações ao Oscar.
Obviamente não é o primeiro caso em que Hollywood se ama em público. Na 84ª premiação, em 2011, um longa-metragem mudo e preto e branco levou o Oscar de Melhor Filme com a força da nostalgia. Película francesa, “O Artista” misturava o estilo blasé do povo da Torre Eiffel em uma seresta sem vozes e apaixonada para a história hollywoodiana. Com um orgulho invejável, Hollywood recebeu a carta de amor com a mesma paixão que receberia a acidez três anos depois.
Em 2014, “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” se apresentou como um filme crítico quanto à forma que a indústria mastiga seu atores, extrai fortunas em franquias bilionárias e então os cospe, colocando-os à margem do “cinema-arte” e lançando-os no ostracismo. Com uma direção não-convencional, o filme de Alejandro Iñarritú (Biutiful) foi abraçado por sua estranheza, e sua crítica foi engolida por seus Academy Awards – dado pela mesma indústria que o filme se dedicou a criticar.
O fato de “Birdman” ser um longa-metragem peculiar facilita a assimilação das suas críticas; para Hollywood, é bem menos doloroso receber um bilhete ofensivo se ele for bem escrito. Além de mais aceitável, isso torna o filme mais vendável quando vai para as vitrines das premiações: a estatueta dourada fala para você notar o quão arrojada é a direção, e como Michael Keaton e Emma Stone estão bem no filme, e subitamente a crítica fica em segundo plano. Além disso, se o filme de Iñarritú com uma mão bate na indústria cinematográfica – atacando-a por ser uma fábrica de superherois e robôs e/ou monstros gigantes com pouco respeito pelos atores de sua engrenagem -, com o outro punho Iñarritú bate nos críticos em um momento emblemático do filme. Com todos devidamente atacados, ninguém sai injustiçado, e todos estão felizes.
De certa forma, isso demonstra que “Birdman” e “La La Land” têm mais em comum do que a crescente atuação de Emma Stone, mesmo que o primeiro filme seja bem mais cínico e duro do que o segundo. Quando os personagens de Ryan Gosling (“Dois Caras Legais“) e Stone (“Homem Irracional“) discutem a vida que levam em Los Angeles, Gosling, no papel de Sebastian, diz que “eles adoram tudo e valorizam nada”. Embora uma crítica contundente à cidade que gira em torno da indústria cinematográfica, logo vemos a história de Sebastian e Mia ser construída aos poucos em meio aos cenários de filmes.
Então, como dá para se imaginar, a crítica não fica nem mesmo como segunda voz – principalmente com todas as referências à musicais famosos que saltam aos olhos, e ao som do jazz pulsante que embala o filme. Enquanto transitamos entre canções excelentes e cenas modernas com tons de nostalgia, nos encantamos com a linguagem e absorvemos em cada fala e nota o amor que Damien Chazelle (“Whiplash: Em Busca da Perfeição“) colocou em sua obra enquanto a dirigia.
Estes pontos não tornam os filmes citados melhores ou piores – eles são o que são, com seus defeitos e qualidades. Por outro lado, questiona-se a quantidade de premiações para as quais foram indicadas – e os prêmios que de fato receberam -, levantando a dúvida de se os filmes são tão bons quanto são laureados ou se é somente a indústria se dando tapinhas nas costas mais uma vez.
Seja como for, “La La Land: Cantando Estações” vem para o Oscar com mais do que um recorde de indicações. O filme traz para a premiação, além de sua indiscutível qualidade, a história que a indústria tem em premiar filmes metalinguísticos – no melhor estilo “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. Amado por muitos e tratado com indiferença por alguns, o trabalho de Chazelle representa tudo o que Hollywood ama em si mesma, de forma que é provável vermos mais uma vez os Academy Awards transformados em um adorável museu do saudável ego da indústria.