Cinema com Rapadura

Colunas   quinta-feira, 08 de setembro de 2011

Livros: O Outro aborda o tema delicado da traição e como lidar com ela

Com uma narrativa suave e carregada de sentimento, acompanhamos o personagem em sua busca pela identidade daquele com quem dividiu o coração de sua mulher.

Em “O Outro”, Bernhard Schlink, nos apresenta o universo do luto, ao mesmo tempo em que aborda o tema da traição. Como seu personagem irá lidar com a presença do Outro na vida de sua esposa? Como fazer com que as lembranças que ele tem dela não sejam manchadas por um passado que ele não conhecia? Como conseguir lidar com o fato de que a mulher que ele acreditava ser somente sua poderia compartilhar sorrisos, olhares e atenções com outro homem?

Em meio ao luto pela recente perda da mulher para o câncer Bengt, um funcionário público aposentado, se vê em volto em atividades diárias que em nada resultam se não em uma pequena distração daquela dor e ausência constantes. Cuidar dos jardins, limpar a casa, lavar a roupa ou mesmo rir ao telefone com uma conversa agradável o faz se sentir vazio, pois não há com quem conversar depois que a ligação termina. Sua adorada esposa, com quem dividira mais de vinte anos de sua vida se fora.

Foi em um dia de rotina, ao qual ele ainda estava se habituando, que viu o seu mundo, recém construído sem ela, desmoronar. Ao apanhar a correspondência, havia entre as contas e cartas de condolências, uma carta, com caligrafia bonita, endereçada a sua mulher. O que mais o intrigou foi o conteúdo. O remetente, assinando apenas como Rolf, se dirigia a sua mulher como se a conhecesse há muito tempo e, aparentemente, melhor do que ele. A curta carta possuía um tom íntimo, relatando detalhes sobre ela, os quais nem ele recordava ou ao menos não tinha certeza serem daquela forma. Traços da personalidade dela que ele acreditava terem sido dirigidos apenas a ele.

Sentindo-se traído, mesmo que ainda sentisse desesperadamente a falta da mulher, Bengt se vê à procura de descobrir até que ponto existia uma ligação entre o Outro e sua mulher. Ao vasculhar a escrivaninha, onde sabia existir um fundo falso, ele encontra, em meio a cartas de amigos e familiares, um pequeno bolo envolto em fita vermelha com a mesma caligrafia caprichosa que ele tinha a sua frente.

Procurando sanar a dúvida que cresce dentro de si, ele passa a responder para o Outro no lugar de sua mulher. Durante meses, os dois trocam cartas e à medida que o tempo passa Bengt se vê mais e mais furioso e frustrado. Procura, numa tarde, a filha, com quem não tem um relacionamento feliz devido ao excesso de trabalho, e pergunta-lhe se saberia de algum caso extraconjugal da mãe. Ofendida pela ideia que o pai passara a fazer da mãe, ela termina a conversa de forma brusca e o manda embora.

Decidido a esclarecer tudo, e sabendo que as cartas não são mais o suficiente, acaba indo em busca do Outro. Logo ele se vê observando atentamente a rotina do Outro, pensando em algum modo de chegar até ele para descobrir quem era aquele homem quem encantara tanto a sua mulher.

Bastam apenas alguns dias para que ele descubra que o Outro mora em um endereço respeitável, mas que sempre aparece com o mesmo terno, o mesmo sapato, mudando apenas a camisa, para o café da manhã em um pequeno restaurante, onde aparentemente é freguês assíduo e onde costuma jogar uma partia de xadrez. Toda a imagem de galã bem sucedido, que ele vinha construindo ao longo das trocas de cartas, cai e o que ele encontra é um bon vivant. Falido, fracassado e de boa aparência. Alguém que, na sua opinião, não teria nada a oferecer a sua mulher, uma violinista famosa e cuja delicadeza e educação não combinariam com aquele sujeito.

Com o tempo, a convivência e as cartas, Bengt vai descobrindo cada vez mais do Outro e tem que lidar com o seu desejo de vingança. A oportunidade surge quando, impulsionado pelo ciúme, escreve uma última carta ao Outro relatando a chegada de sua mulher na cidade. Com a notícia, ele logo se vê as voltas com os preparativos de um jantar que seria oferecido a ela pelo Outro, mas que seria financiado por ele. É aqui que surge outro ponto delicado do livro: a vingança seria o suficiente? Ele levaria seus planos adiante?

Ao longo das curtas páginas que compõem seu romance, Schlink trata de forma delicada o assunto, que se desenrola ao longo do livro de forma surpreendente, culminando em um final encantador e digno de sua narrativa. O longa-metragem baseado no romance homônimo chegou aos cinemas em 2008 e trouxe em seu elenco os atores Liam Neeson (“As Crônicas de Nárnia: A Viagem do Peregrino da Alvorada”), Laura Linney (“O Exorcismo de Emily Rose”) e Antonio Banderas (“Jogo Entre Ladrões”).

Leilane Soares
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