Cinema com Rapadura

Colunas   quinta-feira, 30 de junho de 2011

O Menino do Pijama Listrado mostra a amizade à época da 2ª Guerra

Com uma narrativa simples e personagens cativantes, o romance atinge seu propósito e toca na alma do leitor do começo ao fim.

Bruno tem nove anos e vê seu mundo virar de pernas para o ar quando, ao chegar em casa, se depara com Maria, a empregada, mexendo em suas coisas, inclusive naquelas que ele havia escondido no fundo do armário. Em poucos dias, ele vai precisar se adaptar à realidade da nova casa, em Haja-Vista, e ao fato de que é lá que ele  e a família deverão morar, longe de seus três amigos da vida toda, durante o futuro previsível. O motivo da mudança? A promoção do pai à Comandante do Posto em Haja-Vista.

É assim, de forma delicada e quase despercebida, que somos apresentados ao cenário da Segunda Guerra Mundial. Em “O Menino do Pijama Listrado“, os acontecimentos são narrados a partir do ponto de vista de um menino superprotegido, que é arrancado de sua rotina e não faz ideia do que realmente está acontecendo fora dos muros que o cercam. O romance flui por meio dos questionamentos de Bruno: quem são aquelas pessoas? O que elas fazem o dia todo? Por que estão sempre vestidas com seus pijamas listrados? Mas, principalmente, por que mesmo com tantas crianças por perto ele não tem ninguém com quem brincar?

Obrigado a viver em um lugar onde as opções para se distrair são escassas e as respostas para suas perguntas são tão confusas quanto às mesmas, o menino se vê obrigado a usar da imaginação para buscar alternativas para se distrair. E é graças ao espírito aventureiro de Bruno que conhecemos Pavel, o senhor polonês que corta os legumes para o jantar e está sempre lá para servi-los à mesa. Durante uma tarde em que está entediado em seu quarto, Bruno resolve fazer um balanço na árvore que fica em frente à casa, mas algo dá errado e ele acaba sofrendo um pequeno acidente. Como único adulto por perto, e o único a presenciar o ocorrido, Pavel se vê ajudando e cuidando do ferimento do menino, que agradece, mesmo sem entender porque ele não pode contar ao pai que o senhor o havia ajudado. Apenas mais tarde, quando Bruno se encontra novamente com ele na cozinha, mas agora na presença de Maria, é que descobre o porquê Pavel estaria encrencado se soubessem que ele havia tocado no menino: ele era judeu.

Mas o tesouro mais precioso encontrando por nosso menino aventureiro é Shmuel, um menino judeu nascido no mesmo dia e ano de Bruno e que vive no lado oposto ao da cerca. Uma amizade que parece impossível ganha espaço seu espaço na vida de Bruno, e é durante as conversas com o amigo que ele descobre como é a vida do outro lado da cerca. Além de saciar a curiosidade de Bruno, a amizade entre os meninos nos mostrar que até mesmo no terreno mais arenoso de uma guerra, pode nascer um bom fruto como a amizade, um sentimento sem interesse, nascido do convívio e consolo que um buscam no outro para a situação em que se encontram e que ambos não entendem muito bem.

John Boyne nos traz em seu romance ao cenário inóspito dos Campos de Concentração de Auchwitz II ou Haja-Vista, como costuma dizer Bruno ao pronunciar a palavra de forma errada. Mas só nos damos conta disso, de fato, quando o menino, em uma tentativa de ajudar Shmuel a encontrar seu pai perdido à multidão de poloneses, passa para o outro lado da cerca, vestido exatamente igual e com o mesmo corte de cabelo, sem saber que estava indo para a última grande aventura de sua vida.

É nesse ponto que os sonhos do menino sobre o mundo além da cerca caem a sua volta e a realidade desaba sobre a sua cabeça, juntamente com uma chuva pesada: não há campinho de futebol, não existe nem ao menos uma bola, não existem crianças brincando felizes, nem pessoas felizes, nem café, nada daquilo que ele imaginava existir além da cerca. Tudo o que ele encontra e vê são pessoas tristes, tão magras quanto o amigo, algumas com o rosto como se não estivessem mais ali e o corpo fosse apenas um recipiente vazio do que outrora fora um ser humano.

O romance de John Boyne ganha seu lugar ao sol em um mercado literário repleto dos mais variados títulos por esse toque na alma, por essa abordagem simples de um assunto tão delicado. Mas acima de tudo, por passar adiante aquela velha lição de que o que realmente importa está muito além daquilo que os nossos olhos podem enxergar como cor, raça ou religião.

“O Menino do Pijama Listrado” chegou aos cinemas em 2008 e contou com a produção de David Heyman (“Harry Potter e o Enigma do Príncipe”), além de trazer em seu elenco astros como Vera Farmiga (“Os Infiltrados”) e David Thewlis (“Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 1”).

Leilane Soares
@

Compartilhe

Saiba mais sobre


Conteúdos Relacionados