Em entrevista ao Collider, os diretores Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles falaram sobre alguns dos temas e alegorias utilizados em “Bacurau“, filme brasileiro que venceu, ao lado do francês “Les Miserables”, o Prêmio do Júri do Festival de Cannes deste ano.

Kleber Mendonça Filho ganhou notoriedade internacional com seus dois últimos filmes antes deste, “O Som ao Redor” e “Aquarius“. Questionado sobre as similaridades temáticas entre o segundo e “Bacurau”, respondeu:

“Sim, eu o desenvolvi com Juliano, que conheço há 16 anos, mas é visual e sensorialmente diferente. A ideia de estar fora do mapa é similar a alguém tentando dizer à mulher em ‘Aquarius’ (Sonia Braga, que também aparece em ‘Bacurau’) para se mudar, que é um prédio fantasma e que ela não deveria estar ali. É basicamente a mesma coisa, remodelar o mundo de acordo com as suas próprias especificações, simplesmente porque se pode, que é uma ideia muito assustadora. Como cidadãos, nós todos podemos desaparecer do sistema um dia.”

Em seguida, os diretores foram convidados a discutir algumas das alegorias que marcam a história do longa, explicando que eles a relacionam ao momento que o país passa atualmente, na visão deles:

Juliano Dornelles: “No Brasil, estamos vivendo um momento político específico que todos estão comentando. Mas a história no filme é uma história que sempre se repete. Na verdade, não é nada muito novo.”

Kleber Mendonça Filho: “Acontece em muitas culturas onde a história sempre se repete do pior jeito possível. No Brasil, o sistema está completamente quebrado pela história em si, e agora com a nova situação política é estranho, porque parece que estamos vivendo em uma distopia. Mas, na verdade, eles estão revivendo os piores aspectos dos últimos 50 anos. Eles são de fato nostálgicos com os anos 1960, quando tínhamos uma ditadura.”

Juliano Dornelles: “Os homens brancos comandam tudo e as pessoas gays estão se escondendo nas sombras. A sociedade está torturada e muito irritada com essa situação, e eu espero que ‘Bacurau’ as ajude a reagir e fazer alguma coisa. O governo está perdendo popularidade todos os dias.”

Mendonça Filho e Dornelles também foram perguntados sobre Silvero Pereira, que no filme interpreta Lunga. Dornelles ressalta que foi interessante acrescentar Lunga no roteiro, pois ele “transita no universo LGBT” e acaba se tornando um fora da lei, vivendo escondido. Mendonça Filho, por sua vez, lembrou dos cangaceiros na história brasileira, seu visual moderno com joias e adereços e como foram caçados e publicamente executados. Dornelles, em seguida, ressalta que Lunga é uma derivação cultural desse conceito e que as decapitações em “Bacurau” vieram desse pedaço da história do Brasil.

A entrevista também questionou a dupla sobre diretores como Alfonso Cuarón (“Roma“), Guillermo Del Toro (“A Forma da Água“) e Alejandro Iñárritu (“O Regresso“), mexicanos que se mudaram para outros países e passaram a trabalhar fora de seu país de origem. Mendonça Filho diz que tem lido alguns roteiros e que adoraria trabalhar fora do Brasil. Ambos disseram já terem considerado uma mudança para outro país por conta da situação brasileira, mas que, por enquanto, permanecerão por aqui.

Por fim, ao ser lembrado de Wagner Moura e sua aclamada atuação como Pablo Escobar na série “Narcos“, Mendonça Filho disse que adoraria trabalhar com ele, e que ambos já estão trabalhando em um projeto, sem detalhes revelados.

“Bacurau” é descrito como “Um western brasileiro. Um filme de aventura e ficção científica. Daqui a alguns anos… Bacurau, um pequeno povoado do sertão brasileiro, dá adeus a Dona Carmelita, mulher forte e querida, falecida aos 94 anos. Dias depois, os moradores de Bacurau percebem que a comunidade não consta mais nos mapas“.

Sonia Braga (“Aquarius“), o alemão Udo Kier (“Minha Filha“) e Karine Teles (“Benzinho“) fazem parte do elenco, composto por dezenas de atores, como Barbara Colen (“Aquarius“), Silvero Pereira (“Serra Pelada“), Thomas Aquino (da série “3%“), Antonio Saboia (da série “O Mecanismo“), Rubens Santos (“Aquarius“) e a cantora Lia de Itamaracá.

“Bacurau” chegará aos cinemas brasileiros ainda em 2019, porém sem data específica definida.

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