Netflix responde Steven Spielberg em debate sobre presença do streaming no Oscar
Os diretores Afonso Cuáron, Ava DuVernay e Dee Rees também falaram sobre o assunto.
Na última semana foi noticiado que a Academia poderia mudar as regras para filmes que sejam elegíveis ao Oscar, dificultando assim indicações de produções feitas pelos serviços de streaming. Agora foi a vez da Netflix se posicionar sobre o assunto. Em seu Twitter, a empresa postou em sua defesa de sua posição que seu serviço proporciona igualdade e acessibilidade. Confira abaixo:
“Nós amamos cinema. Aqui estão algumas coisas que também amamos:
– Acesso para pessoas que nem sempre podem pagar, ou moram em cidades sem salas de cinemas.
– Deixar que todos, em todos os lugares, desfrutem de lançamentos ao mesmo tempo.
– Dar aos cineastas mais formas de compartilhar arte.
Essas coisas não são mutuamente exclusivas.”
A cineasta Ava DuVernay, que esse ano lançará via Netflix a minissérie “When They See Us“, que conta a história de cinco jovens negros e latinos condenados injustamente pelo estupro de uma mulher branca no Central Park, em Nova York, também usou o Twitter para se posicionar a favor do streaming:
“Uma das coisas que eu valorizo no Netflix é que ele distribui o trabalho negro para longe. 190 países receberão ‘When They See Us‘. Aqui embaixo está um vídeo promocional para a África do Sul. Eu tive apenas um filme distribuído internacionalmente. Não foi ‘Selma’. Não foi ‘Uma Dobra no Tempo’. Foi ‘A 13ª Emenda’. Pela Netflix. Isso importa.”
A cineasta já havia mostrado seu descontentamento com a ideia anteriormente, afirmando que falta à Academia ouvir os dois lados:
“Cara Academia, esta é uma reunião do Conselho Diretor. E os membros regulares dos ramos técnicos não podem estar presentes. Mas, espero que, se isso for verdade, vocês tenham cineastas na sala ou leiam declarações de diretores como eu que se sintam de forma diferente em relação a isso. Grata, Ava DuVernay.”
Ao Slashfilm, a diretora Dee Rees (“Mudbound – Lágrimas Sobre o Mississipi”) também elogiou o serviço de streaming, por seu compromisso com um filme que a maioria dos estúdios não exibiriam. Seu próximo filme, “The Last Thing He Wanted“, adaptação do livro “A Última Coisa Que Ele Queria“, de Joan Didion, protagonizado por Anne Hathaway, também será distribuído pela Netflix.
“Acho que os outros estúdios estavam com medo desse filme, pareciam não querer nem encostar nele. É um grupo muito bom. O rosto de quem que vai para o pôster? Quanto vocês estão dispostos a dar por isso? A Netflix me apoiou demais enquanto artista. Nunca me senti com tanto apoio em termos de marketing de um filme e de participar desse processo, sabe, colocando tantos rostos em um pôster! A maioria dos estúdios não faria isso, acabariam escolhendo talvez dois rostos.”
Vencedor de três Oscar com “Roma” – fato que inspirou a última onda de ataques de Spielberg -, o diretor Alfonso Cuarón também se pronunciou:
“Quantos cinemas você acha que um filme mexicano em preto e branco, nos idiomas espanhol e mixteco, que é um drama sem estrelas, qual o tamanho que você acha que teria como um lançamento convencional? Por que você não pega a lista de filmes estrangeiros este ano e compara o lançamento nos cinemas com essas coisas e por quanto tempo elas estão em exibição? Veja quantos foram exibido em 70 [milímetros]”.
O diretor acrescentou:
“Algo que devemos estar muito conscientes é que a experiência cinematográfica tradicional tornou-se muito gentil para um tipo específico de produto. Neste momento, é inquestionável que você tem todos esses cineastas, cineastas interessantes, fazendo filmes com diferentes plataformas, porque essas plataformas não têm medo de fazer esses filmes. E como ‘Roma’, eu espero que muitos outros tenham a liberação cinematográfica e maiores lançamentos.”
O sucesso de “Roma” no Oscar poderia ter sido ainda maior já que vários eleitores admitiram anonimamente que votaram intencionalmente contra o filme de Cuáron, porque odiavam a ideia de um filme da Netflix vencedor do prêmio de Melhor Filme.
Quase um embaixador da cruzada anti-streaming, Steven Spielberg sempre foi contra aos serviços e segundo informações publicadas pelo The Hollywood Reporter, o cineasta pretende se dirigir ao Conselho Diretor da Academia em abril para propor mudanças nas regras. Entre elas, que os longas devem ser exibidos, com exclusividade, por no mínimo quatro semanas nos cinemas, e que a bilheteria desses filmes sejam divulgadas.
Caso aconteça, não seria a primeira vez que uma mudança de regras prejudicaria os novos formatos. Em 2017, após o documentário de cinco partes produzido pela ESPN, “O.J.: Made in America”, vencer um Oscar, a Academia modificou o regulamento, passando a proibir a participação de uma série dividida em várias partes. Recentemente, a Netflix brilhou no Oscar 2019, conquistando três prêmios para “Roma” e seu diretor Alfonso Cuáron (Melhor Fotografia, Filme Estrangeiro e Direção), além de vencer na categoria de Melhor Documentário de Curta-Metragem com “Absorvendo o Tabu“. A Netflix, no entanto, almeja conquistar prêmios ainda maiores.
O serviço de streaming sempre admitiu, publicamente, que tem como objetivo vencer o prêmio máximo: o Oscar de Melhor Filme. Para isso, a Netflix já negociou sua integração com a Motion Picture Association of America e planeja investir em sua próxima grande produção, “O Irlandês”, que será lançado em 2019, também nos cinemas. Dirigido por Martin Scorsese (“Silêncio“), o longa teve seu primeiro teaser divulgado durante a exibição do Oscar no último domingo (24/2) e conta com um elenco estrelado, com os nomes de Robert De Niro (“O Comediante”), Al Pacino (“Não Olhe Para Trás”) e Joe Pesci (“Rancho do Amor”).
Segundo fontes ouvidas pelo THR, a derrota de “Roma” no prêmio de Melhor Filme no Oscar 2019 foi uma forma encontrada pelos membros da Academia para punir o modelo de negócio da Netflix. Desta forma, o serviço está enfrentando uma enorme pressão para se adaptar as regras tradicionais de Hollywood. Além de “O Irlandês”, a Netflix também planeja investir em outras cinco obras, como “The Laundromat”, do diretor Steven Sodenbergh, e “The Pope”, do brasileiro Fernando Meirelles. Essas obras também devem ganhar um lançamento nos cinemas.
Scorsese já manifestou sua vontade de que o filme seja lançado nos cinemas tradicionais, e segundo a publicação, a Netflix está providenciando para que isso aconteça. Segundo uma das fontes do THR:
“A Netflix quer deixar uma grande marca com ‘O Irlandês’. Ao apoiar esse tipo de cineasta, eles se colocaram em uma posição na qual têm que lidar com o modelo de negócio das exibições de cinema e como isso funciona.”
No último ano, o Cinema com Rapadura discutiu acerca dessa nova abordagem de negócios da Netflix e como essa mudança pode impactar a participação de seus filmes em premiações e como o serviço de streaming pode se tornar cada vez mais presente nos cinemas tradicionais. Você pode ler a coluna clicando aqui. O sucesso dos filmes de 2018 da Netflix também foi pauta do RapaduraCast 560 – ouça aqui.
Saiba Mais: Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, Alfonso Cuarón, Ava DuVernay, Dee Rees, Netflix, Oscar, Steven Spielberg