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Notícias   terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Alfonso Cuarón, Guillermo Del Toro, Emannuel Lubezki e outros reagem à decisão de não exibir quatro categorias no Oscar 2019

Público cinéfilo, jornalistas de cinema e cineastas não estão nada satisfeitos com a nova medida adotada pela Academia.

Alfonso Cuarón, Guillermo Del Toro, Emannuel Lubezki e outros reagem à decisão de não exibir quatro categorias no Oscar 2019>

Nesta segunda-feira (11), foi anunciado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas que quatro categorias do Oscar 2019 não seriam televisionadas, ou seja, os anúncios e discursos dos vencedores de Melhor Fotografia, Melhor Montagem, Melhor Maquiagem & Cabelo e Melhor Curta-Metragem não seriam exibidos para o público durante a cerimônia, e seriam editados para passarem durante os comerciais.

De acordo com o presidente da Academia, John Bailey, a medida serviria para diminuir o tempo de exibição da cerimônia, que deve contar com três horas este ano, e assim “evoluir” a premiação do Oscar para os novos padrões da atual televisão. Este ano será a primeira vez que a cerimônia será também exibida via stream no site Oscar.com, e as quatro categorias excluídas da exibição televisionadas passariam no streaming, ajudando assim “na conscientização e promoção dessas categorias de prêmios”, segundo Bailey.

Pela lógica apontada por esta medida, a cerimônia do Oscar precisa “se modernizar” para atrair um público mais jovem, e uma cerimônia longa demais seria um impedimento a isso. Então que tal cortar da exibição categorias essenciais para o fazer cinematográfico, e deixar o foco majoritário só em estrelas de cinema? Isso sim atrai público! Desde que a decisão era apenas um rumor, a repercussão nas redes sociais já estavam ganhando espaço. Mas agora, com a oficialização, o público cinéfilo, jornalistas de cinema, e cineastas estão se pronunciando sobre o quão equivocada é a decisão da Academia.

Primeiramente, o presidente da Sociedade dos Diretores de Fotografia dos EUA, Kees van Oostrum, emitiu uma declaração (via Variety) para os membros da associação sobre a questão:

“Depois de receber muitos comentários sobre o assunto pelos membros da ASC, eu creio que falo pela maioria deles em declarar que essa decisão é infeliz. Nós consideramos a arte do cinema um esforço colaborativo, em que as responsabilidades do diretor, do diretor de fotografia, do editor e outras áreas geralmente se interligam. Esta decisão pode ser percebida como uma separação e divisão do processo criativo, e assim minimiza nossas contribuições criativas fundamentais. A Academia é uma instituição importante que representa nosso fazer artístico pelos olhos do mundo. Desde o surgimento da organização 91 anos atrás, o Academy Awards têm honrado o talento dos diretores de fotografia, suas artes e contribuições para o cinema, mas nós não podemos aceitar essa decisão sem protestar”.

Alfonso Cuarón, que está indicado em quatro categorias no Oscar 2019, entre as dez de “Roma”, incluindo Melhor Fotografia, postou no Twitter:

“Na história do cinema, obras primas já existiram sem som, sem cor, sem história, sem atores e sem música. Nem um filme sequer já existiu sem Fotografia e sem Edição”.

Guillermo Del Toro, vencedor do Oscar 2018 de Melhor Direção e Melhor Filme por “A Forma da Água”, também havia se pronunciado sobre a questão, afirmando que a Fotografia e Edição estão no centro do Cinema. O tweet, no entanto, foi apagado depois que o cineasta quis clarificar a estratégia da Academia com outra declaração:

1 – “Importante clarificação – quote da Academia: ‘Ninguém está sendo removido nem da cerimônia dentro do Dolby Theater nem da exibição televisionada. Neste ano, em uma rotação voluntária que irá mudar a cada ano, quatro prêmios serão entregues ao vivo sem interrupção, como sempre'”.

2 – “Eles serão levemente editados offline, retirando a caminhada do assento até o palco, como tem sido feito há anos com a exibição do Tony, e então colocados posteriormente na exibição ao vivo. Será discreto e a maioria do público nem irá perceber”.

3 – “Um anúncio cuidadosamente considerado e expressado foi entregue ontem. A cada ano, a premiação ‘editada’ mudará de categorias que irão ser exibidas sem cortes na cerimônia”.

Del Toro está falando sobre parte do que foi anunciado por Bailey em sua carta para os membros da Academia:

“Os comitês executivos de seis agências generosamente optaram por receber seus prêmios neste período ligeiramente editado para o programa deste ano, e selecionamos quatro. Nos próximos anos, quatro a seis categorias diferentes podem ser selecionadas para rotação, em colaboração com os produtores da mostra. (As categorias deste ano serão isentas em 2020).”

Assim, haveria uma rotação entre as categorias. Em 2020, pode ser que Melhor Trilha Sonora não seja exibida, nem Melhor Edição de Som ou Melhor Mixagem de Som. Mas será que as categorias de Melhor Ator e Atriz entrarão nessa rotação? Parece bastante improvável.

O crítica de cinema Matt Zoller Seitz bem apontou que o Sindicato dos Atores de Hollywood pode tomar ação contra a questão, porque tendo em vista que a estratégia de “atrair” um público maior esteja baseada na popularidade das celebridades e das categorias “que importam”, se os atores se recusam a aceitar que as categorias sejam relegadas a comerciais, a Academia pode mudar de ideia.

“Tudo que precisaria seria Glenn Close ou Rami Malek dizer ‘Eu não vou subir nesse palco para aceitar um prêmio se você vai colocar meus colegas artistas de outras categorias nos comerciais’. Todo ator de sucesso deve algo para as outras categorias, inclusive a de Curta-Metragem”.

Já o jornalista Rhett Bartlett apontou que, caso a medida tivesse acontecido no último ano, por exemplo, o público perderia momentos marcantes acontecendo ao vivo, como a primeira vitória do diretor de fotografia Roger Deakins, depois de 13 indicações ao Oscar. Deakins foi aplaudido de pé por seus colegas, algo que não seria mostrado na exibição, pois o corte indicado para a cerimônia deste ano já começaria no discurso do vencedor.

O jornalista continua na thread, citando os exemplos de Melhor Curta, Melhor Maquiagem e Cabelo e Melhor Edição, e completa:

“Todos os discursos só funcionariam se vistos em sua totalidade. Não em um destaque de 5 segundos. 1 – O alívio de  Deakins finalmente vencendo. 2 – Um discurso inteiro em língua de sinais. 3 – Um escultor que agradece a Gary Oldman, que responde de volta. 4 – Um discurso enrolado com uma observação inteligente de um editor”.

Em outras cerimônias que são televisionadas e que também têm categorias jogadas para os comerciais, o que é exibido é apenas um pequeno corte do discurso do vencedor. Além disso, digamos que você é um ávido fã de cinema, e está torcendo muito para um diretor de fotografia específico, mas só consegue ver a cerimônia pela televisão. Ou você vai ficar sabendo da vitória pela internet, perdendo o fator surpresa, ou vai ter de esperar o comercial que mostrará apenas o destaque da categoria que você tanto esperava.

A estratégia adotada por Bailey assume que todos poderão ver o streaming da cerimônia, e não perderão nada. Mas o público que já acompanha o Oscar sempre, o faria não importa quantas horas a premiação tivesse, e por qualquer meio. O argumento de “conscientizar e promover as categorias em questão” de nada serve se para o público geral, que assiste pela televisão, essas categorias serão exibidas apenas nos comerciais. “Será discreto e a maioria do público nem irá perceber”. De fato, o público nem irá perceber que as categorias sumiram. Como isso é conscientizar alguém sobre a importância de todos os ramos do Cinema?

Como afirmam os roteiristas Scott Beck e Bryan Woods: “Estou tão animado para assistir o Oscar esse ano porque vai ser alguns minutos mais curto! – millennial que ainda assim não vai assistir o Oscar”.

Steve Yedlin, diretor de fotografia de “Star Wars: Os Últimos Jedi” e parceiro de Rian Johnson, também tweetou:

“Programa cujo único propósito é preparar para o consumo do público a celebração das artes do cinema anuncia que a celebração das artes do cinema é muito tediosa para o consumo do público”.

Reed Morano, que além de diretora, também é diretora de fotografia, levou a revolta para o seu Instagram:

“Quando audiência é mais importante que a própria coisa que você está celebrando, claro que a receita é mais importante que a arte (que por sinal faz a receita). Então a coisa mais fácil a se fazer é aceitar os resultados em vez de tomar uma posição pela arte que você cria. Apenas outro dia em Hollywood, pessoal. Eu definitivamente preciso ver todas as CINCO músicas indicadas serem apresentadas completas na cerimônia. Tenho certeza que tendo tempo para todas essas CINCO apresentações, nós poderíamos ter reservado um pequeno espaço de tempo para celebrar OS DOIS ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA TODO FILME JÁ FEITO”.

O diretor de fotografia Emmanuel Lubezki, vencedor do Oscar por “Gravidade”, “Birdman” e “O Regresso”, compartilhou os tweets de Cuarón e Del Toro em seu Instagram. Outros que reclamaram sobre a medida foram os atores Seth Rogen e Russel Crowe:

“Que jeito melhor de celebrar conquistas do cinema do que não honrar publicamente as pessoas cujo trabalho literalmente é filmar coisas”.

“A Academia está removendo Fotografia, Edição e Maquiagem da cerimônia televisionada? Isso é uma decisão fundamentalmente estúpida, eu não vou nem tentar dar um de esperto. É uma decisão burra demais até para palavras”.

O público cinéfilo não está nada satisfeito com esta decisão, que já acumula com o fato de não haver apresentador no Oscar 2019, algo que não acontecia há 30 anos, e a categoria de Melhor Filme Popular que foi cogitada para 2020. Resta aguardar para ver se a Academia voltará atrás, ou se esse Oscar será realmente um dos piores de todos os tempos.

A cerimônia do 91° Oscars acontecerá no dia 24 de fevereiro, às 22h (horário de Brasília).

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Louise Alves
@louisemtm

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