Cinema com Rapadura

Entrevistas   terça-feira, 26 de julho de 2022

O Telefone Preto | Diretor Scott Derrickson fala sobre o filme e sua relação com o terror

Filme já está em cartaz nos cinemas do país.

O Telefone Preto | Diretor Scott Derrickson fala sobre o filme e sua relação com o terror>
(Imagens: Getty Images, Universal Pictures)

Há muito se percebe uma mudança de abordagem em filmes de terror. Abordagens mais maduras, voltadas ao que constitui o medo em si, têm sido a fórmula do sucesso nesse tipo de cinema, seja de público ou de crítica. “O Telefone Preto” chega aos cinemas com a promessa de trabalhar ainda mais a fundo essa nova proposta, comandado pelo veterano no terror Scott Derrickson.

Em entrevista exclusiva concedida ao Cinema Com Rapadura pela Universal Pictures, Derrickson falou de sua abordagem em relação ao conto original de Joe Hill, do trabalho com os protagonistas mirins Mason Thames e Madaleine McGraw e a influência de Ethan Hawke na versão final do vilão Sequestrador que foi à tela.

Leia a entrevista abaixo.

Como esse projeto foi concebido?

Bom, ele surgiu como o resultado de algumas coisas. Faço terapia há alguns anos, em maior parte lidando com a minha infância, e aí fiquei empolgado com esse projeto quando associei o conto de Joe Hill à minha própria experiência de crescimento no norte de Denver no final nos anos 1970. O roteiro é essencialmente sobre isso.

O que te atraiu na história?

Eu acredito que Joe é um autor muito original. Não consigo pensar em outro autor de terror que pode abordar um material tão obscuro do ponto de vista do amor, com grande compaixão e empatia. E ele não compromete o medo por causa disso. Eu li o conto ‘O Telefone Preto’ quando foi publicado inicialmente há 18 anos, e sempre me marcou. Então eu pensei que seria ser uma ótima ideia para um filme porque eu nunca tinha visto nada que combinasse um serial killer e sequestrador com o sobrenatural, mas também por causa do empatia que senti na escrita. Eu realmente senti que o autor se importava com o garoto na história. Então, um aspecto muito importante para mim ao fazer este filme foi manter esse ponto de vista de compaixão e amor, ao mesmo tempo em que conta uma história aterrorizante e verdadeiramente sombria.

E você tem um vilão aterrorizante com o Sequestrador. O que um ator do calibre de Ethan Hawke traz para esse papel?

Eu não escrevi o roteiro com Ethan em mente, mas quando o terminei com meu parceiro de escrita C. Robert Cargill, ele foi a primeira pessoa para quem eu quis enviá-lo pela singularidade de sua voz, que é muito distinta e tem variar. Ele pode fazer uma voz baixa e grave, mas também alta e leve, movendo-a sem esforço, e eu senti que poderia ser muito importante e um aspecto valioso do personagem. E ajustar para ele a máscara era importante também. Inicialmente, acho que tudo o que escrevemos no roteiro foi que era uma velha máscara de couro com o diabo pintado nela, sorrindo ou franzindo a testa; mas assim que Ethan assinou, me senti inspirado a fazer algo mais elaborado com a máscara, como dividi-la ao meio para que ele pudesse mostrar apenas olhos ou boca. Para mim, esses aspectos foram interessantes, mas, no final, como o Sequestrador realmente funciona no filme é tudo graças a Ethan. Ele veio ao set com uma compreensão do personagem que excedeu a minha.

É inquietante como sua máscara muda constantemente…

Sim, e fomos muito específicos sobre como e quando ele a usa. Então, houve uma revisão do roteiro assim que tive a ideia de dividir o máscara, tentando imaginar em cada cena qual ele usaria e por que, e como isso afetaria o que ele diz e faz. As máscaras são assustadoras e obviamente um grande componente icônico de muitos filmes de terror, e eu estava tentando expandir isso. Eu apenas tentei fazer algo que parecesse uma evolução da ideia do assassino mascarado. Essa era uma das ambições deste filme.

E Ethan teve um desempenho extraordinário, garantindo que o Sequestrador fosse um vilão complexo.

Ele definitivamente entendeu a complexidade do personagem que estava no roteiro, e ainda adicionou algumas camadas extras. E eu dou a ele o crédito por confiar na máscara para fazer o que o Sequestrador queria, porque usar uma máscara era uma forma do personagem ser ele mesmo e honesto com o que sentia e fez.

Depois de ter sequestrado várias crianças na cidade, com consequências fatais, o Sequestrador tem como alvo o adolescente Finney Shaw [Mason Thames], que luta para sobreviver e ser mais esperto que ele. Há um relação de gato e rato fascinante e aterrorizante acontecendo aí, certo?

Sim, e muito maior do que o Sequestrador pretendia que houvesse. Acho que Finney o surpreendia constantemente com sua inteligência e teimosia, e também com os fantasmas das crianças que o estão chamando neste misterioso telefone preto. Acho que o que faz esse tipo de filme funcionar é que depende de como ele usa o suspense e o medo do público, porque não há garantia nesse gênero de que o herói vá conseguir escapar. Às vezes, filmes de terror podem terminar muito mal; então, uma das coisas que aumenta o suspense de ‘O Telefone Preto’ é que você não sabe para onde tudo está indo.

Mason Thames entrega uma atuação poderosa como Finney.

É muito raro encontrar um ator tão jovem quanto ele com esse tipo de talento bruto, que envolve uma compreensão real poderosa, completa e emocional do que um personagem pensaria e faria em uma determinada circunstância. Muitas vezes eu não precisava dar nenhuma direção, pois ele apenas sabia como processar os pensamentos de Finney na câmera. Quando você o observa, percebe que ele
não tem nenhuma batida falsa o filme todo. Assim, em cada cena você consegue ver o que está acontecendo lá dentro: como ele está pensando sobre a situação, como está reagindo às coisas, como ele está tramando as coisas. E quanto mais eu trabalhei no filme em pós-produção, mais me maravilhava com sua atuação. É impecável.

E a conexão de seu personagem com sua irmã também é fundamental para a história.

Ah, sim. Mais do que qualquer outra coisa, o filme é realmente sobre o vínculo entre Finney e Gwen. E a pressão que eu sentia tinha a ver com o fato de que nós só os vemos juntos em cena nos primeiros 25 minutos do filme, porque eu tinha que garantir que o público se importasse com eles como personagens e também com seu relacionamento. O maior desafio do filme foi conseguir que isso funcionasse, para que, quando eles se separassem, você sentisse o impacto disso e a importância do papel de Gwen.

O que você pode dizer sobre Madeleine McGraw e sua atuação nessa função?

Madeleine é uma jovem estrela. Ela era astronomicamente melhor do que qualquer outra atriz que testou para esse papel. Fiquei tão impressionado com o teste dela que mudei toda a produção para ela, depois de descobrir que ela não estaria disponível para nossa agenda de filmagem inicial. Então, liguei para o produtor Jason Blum e disse a ele que teríamos que filmar mais tarde porque eu precisava dela para interpretar Gwen, e, embora ele provavelmente tenha pensado que eu era louco, ele me apoiou e concordou.

Os irmãos têm seus próprios problemas em casa com o pai, interpretado por Jeremy Davies, que é outra parte importante da história.

É, sim. Há um monte de coisas acontecendo lá sobre superação de traumas e a resiliência da infância, pois eles têm que sobreviver ao pai, aos valentões da escola, e a este sequestrador e serial killer.

Você claramente nunca ouviu aquele velho ditado da indústria, sobre tentar evitar trabalhar com cães ou crianças. Você tem ambos no filme.

Adoro trabalhar com crianças! O importante é encontrar o ator mirim certo, e dedico muito tempo a entrevistá-los e conhecer seus pais também, pois preciso saber que a criança tem o apoio emocional certo. Eu apenas amo como as crianças são honestas e verdadeiras, e eu nunca as diminuo. Em relação às cenas com o cachorro, deixei para minha querida diretora da segunda unidade, Maggie Levin. Então, eu dirijo as crianças, mas os animais vão para a segunda unidade – que neste caso fez um ótimo trabalho.

Este filme é realmente assustador, sem precisar depender de sustos fáceis para prender a atenção do público.

Adoro um bom susto, mas é como algodão doce, no sentido de que cria um pequeno pico em sua boca e depois desaparece sem deixar um impacto real e duradouro. Acho que o que torna um filme de terror eficaz é o tom e o suspense, porque eles criam experiências duradouras que ficam com você depois que o filme acaba. Não há jump scares ou muito sangue ou mesmo violência, que eu lembre, no filme ‘A Bruxa‘, de Robert Eggers, mas eu levei dias para me livrar da sensação dele. É assim que você sabe que viu algo notável.

Então você acredita que assistir a um filme como ‘O Telefone Preto’ pode nos ajudar catarticamente a navegar nossos medos?

Sim, e é justamente por isso que trabalho nesse gênero. O bom terror toca no medos não expressos e indizíveis que carregamos, e acredito que vivencia-los através de um filme leva a uma espécie de inoculação ao vivo, ajudando seu sistema construir imunidade para enfrentar a coisa real, se você um dia encontrá-la. Acho que a arte do terror e o cinema funcionam assim, porque podem reforçar a sua capacidade de sobreviver aos males reais. Falando do lado catártico disso, Wes Craven disse que bons filmes de terror não causam medo, mas, na verdade, ajudam a liberá-lo, e eu concordo e gosto muito dessa ideia. Tem tem sido minha relação com o gênero tanto como espectador de cinema quanto como cineasta.

Aquele misterioso telefone preto que continua tocando no porão onde Finney está sendo mantido em cativeiro, embora o Sequestrador insista que está quebrado, aumenta o suspense e traz o elemento sobrenatural do história em jogo.

Sim, era essa a ideia de Joe Hill, e lembro que, quando li a história pela primeira vez, pensei que só um telefone preto sozinho em um porão já era algo simples e assustador. Curiosamente, logo após a estreia do filme em um festival de cinema no outono passado, me mudei para uma nova casa em Los Angeles, e quando eu estava na sala de estar com Jason Blum, ouvi um telefone tocando no porão e pensei: “Meu Deus! O que está acontecendo?” Então, eu desci e descobri que Jason tinha instalado um telefone preto lá, para o qual ele estava ligando…

Você ficou com ele?

Ah, sim, ainda está lá. É ótimo!

O produtor Jason Blum e sua empresa Blumhouse Productions continua, ano após ano, a ser uma voz chave neste gênero. O que você pode dizer sobre ele?

Jason provavelmente se tornou meu amigo mais próximo neste negócio. Ele simplesmente ama
o gênero e é muito protetor com seus diretores. Acho que tudo que ele foi capaz de realizar vem de sua paixão por assistir e fazer filmes.

Então, o que o público deve esperar de ‘O Telefone Preto’?

Um thriller sobrenatural carregado de suspense e original, cheio de alma e coração.

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“O Telefone Preto” já está em cartaz nos cinemas do país.

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Julio Bardini
@juliob09

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