Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 02 de junho de 2007

Premonições

Após viver um período em ascensão em Hollywood, escolhendo bons projetos para vender sua imagem, a atriz Sandra Bullock investe agora no suspense “Premonições”, um tema que não só soa como clichê, mas se torna um. Seguindo uma linha previsível, a produção demora a ser articulada e, ao final, tenta usar de um melodrama exagerado para fazer valer a pena a abordagem dada ao filme, mas não consegue sucesso.

Bullock interpreta Linda, uma mulher casada que vive infeliz em uma típica casa de classe média. Quando seu marido é morto em um acidente de carro, Linda acredita que sua vida vai tomar rumos completamente diferentes, até que ela descobre que tudo não passou de um estranho sonho . Perturbada com a visão, a precisa saber controlar seus estranhos sonhos e diferenciar da realidade, ao mesmo tempo que surge o medo de que seu marido Jim (Julian McMahon ) realmente possa estar correndo perigo. Neste meio tempo, os problemas conjugais de Linda e Jim vão se revelando mais fortes e arriscados, além de pôr em evidência o lado maternal de Linda com suas filhas. O que a protagonista precisa é encontrar uma forma de ficar consciente de suas ações e evitar que alguma coisa ruim aconteça ao seu marido.

O roteirista Bill Kelly desenvolve uma proposta insuficiente para o tema que pretende abordar. Como já foi visto em outras películas semelhantes, o tema acaba gerando uma certa expectativa para conhecer qual vertente a trama vai seguir para se diferenciar das demais.Consciente disso, Kelly decide envolver elementos demais em um enredo que tem pouco a dizer e não entra em sintonia com a direção, demorando a ganhar um verdadeiro significado. As elipses que intercalam os momentos de sonho e realidade de Linda nem sempre apresentam vigor para convencer o espectador, sem contar que todos os elementos necessários para o desenvolvimento da história são mostrados abertamente ao público, como se este não tivesse a capacidade de interligar os fatos e entender o que está acontecendo. É por entender tanto que “Premonições” vai se desgastando e pouco é feito para melhorar. As reviravoltas procuram confundir ou até impressionar, mas nem sempre conseguem pela falta de harmonia investida no filme.

O diretor Mennan Yapo estréia nos cinemas deixando uma má impressão acerca de seu trabalho. Além de seguir fórmulas prontas dos filmes do gênero, como câmeras nervosas na mão ou momentos que fingem causar susto e não causam, Yapo revela um péssimo gosto em criar um clima de tensão e distúrbio que a personagem vai vivendo. A insistência em pregar peças descaradas durante os sonhos de Linda e depois mostrá-los na realidade não causam nenhum impacto. Além disso, são poucos os planos realmente significativos para a trama, como o que reproduz o acidente de Jim. Outros chegam até ser ofensivos de tão amadores que são. Em um determinado momento, por exemplo, Yapo decide esconder o rosto de um personagem e depois revelar uma leve deformação causada por um acidente, porém não consegue ser eficiente, já que o público entende que ali será revelado algo que atrapalhará a vida da protagonista. Essas tentativas e apelações se aproximam mais ao terror, gênero que talvez Yapo desse certo, porém em “Premonições” não há espaço para isso, diferentemente da franquia “Premonição”.

Na tentativa de atrair publicidade ao filme, Sandra Bullok foi um bom investimento na trama. Por mais que ela ainda não seja uma das melhores atrizes hollywoodianas, é inegável que seu trabalho tem melhorado a cada novo projeto. Em “Crash – No Limite” e “A Casa do Lago”, podemos ver uma Bullock preocupada em construir detalhadamente seu personagem, se entregando por inteiro ao projeto. Isso também acontece em “Premonições”, mas a diferença é que o roteiro não dá abertura para que isso aconteça inteiramente. Não adianta uma boa atriz se envolver em um projeto no qual seu personagem é tratado com superficialidade. Se um filme fosse feito só de atuações, talvez “Premonições” fosse mais razoável, já que o elenco, por mais que não seja espetacular, acaba fazendo uma boa participação. O que prejudicou mesmo veio dessa mistura em suspense “sobrenatural” com melodrama familiar que culmina em uma lição de moral previsível. Nem a obsessão de Linda ao descobrir tais fugas da realidade são bem retratadas pelo roteiro e algumas questões acabam até ficando em aberto ou não convencendo com as justificativas dadas. Para piorar o que já estava amador, a trilha sonora não ajuda em nenhum momento, aparecendo forçadamente em situações específicas.

“Premonições” desagrada por dar a sensação de que poderia sim ser melhor. O despreparo do diretor e a pouca afinidade do roteirista com a história acabam construindo um filme sem graça que talvez deva ser assistido sem compromisso. Sem trazer abordagens novas, o surreal acaba não sendo tão presente na trama e algumas sacadas são até interessantes e dariam um filme bem melhor se tivessem sido melhor realizadas. Nada mais do que um filme comum de Hollywood, feito para vender, a cair no melhor esquecimento geral.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

Compartilhe

Saiba mais sobre