Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 08 de abril de 2007

Família do Futuro, A

A realização de "A Família do Futuro" chega como primeiro produto após a conturbada compra da Pixar pelos estúdios da Disney e apresenta-se como uma animação que, apesar do que aponta no título, não traz aspectos realmente novos e interessantes sobre o futuro, sofrendo um pouco com o desenrolar arrastado de sua trama, porém acaba sendo uma boa diversão para os jovens.

Adaptada de "A Day With Wilbur Robinson", obra de William Joyce, a trama conta a história de Lewis, um garotinho nerd e órfão de 12 anos que sempre está inventando novas máquinas e equipamentos estranhos em seu quarto, mesmo local onde espera que entrevistas sejam marcadas com famílias que pretendem adotar um filho. Porém sua genialidade acaba afastando alguns desses casais, que acham Lewis fora do protótipo do filho perfeito. Desiludido que possa finalmente construir sua família, o garotinho decide inventar um scanner de memória que resgataria a pouca vivência que tivera com sua mãe biológica, o que poderia ser útil ao encontrá-la nos dias de hoje. Com a máquina pronta, o que Lewis não esperava era que um estranho sujeito a roubaria durante uma exibição na feira de ciências de sua escola, fazendo com que conheça Wilbur, um menino que diz ter vindo do futuro e leva Lewis em uma máquina do tempo para uma época avançada. Lá, meio a carros voadores, construções futurísticas e personagens exóticos, a dupla tentará caçar o Cara do Chapéu-Coco, resgatar e invenção e desvendar mistérios acerca do futuro e da família de Wilbur.

Durante os noventa e poucos minutos de projeção, percebemos uma forte instabilidade no desenrolar dos acontecimentos da trama. Intermediando momentos bons e ruins, "A Família do Futuro" começa com uma boa intenção que nasce naturalmente de seus personagens, que são apresentados de uma forma eficaz e importante para o entendimento final da história. Utilizando de boas piadas no começo, parece que, ao começar a engatar as idéias principais do enredo, o cunho divertido dá lugar às excessivas aventuras da dupla que perdem vigor e causam momentos de tédio no meio do longa. Claro que tais aventuras foram bem encaixadas para dar um sentido maior ao filme, mas é inegável que a má administração e o erro do timing de diversas cenas atrapalhem o andamento da história que, nos minutos finais, tenta se reerguer e acaba conseguindo, apresentando uma interpretação plausível e interessante, porém causando uma exclusão no entendimento de algumas crianças espectadoras, por se portar de forma mais madura do que o convencional. Esses níveis errôneos de clímax transformam a animação em meras demonstrações sacais que tentam dar um sentido às aspirações de seu protagonista, o pequeno Lewis que, por sinal, poucos momentos parece tão determinado quanto o roteiro tenta mostrar que é. De qualquer forma, o carisma dele e dos outros personagens, principalmente os exóticos que vivem no futuro, dão uma melhorada na aceitação geral do filme.

Seguido de uma trilha sonora pouco agradável, os traços da animação deixam um pouco de lado a tecnologia excessiva do 3D tão utilizado pelos estúdios e dão uma nova roupagem à proposta do longa. Mesmo assim, vale ressaltar a pouca eficácia ao retratar um mundo futurístico, repleto de clichês que mostram meios de transportes voadores e construções esquisitas. A pouca riqueza de refino ao realmente fazer o público compreender que aquilo é o futuro acaba tendo que compensar na personalidade e habilidade dos familiares de Wilbur, sempre esquisitões com roupas diferentes e inteligência tecnológica. O que mais tarde também acaba sendo desconstruído ao entender que todo aquele novo mundo foi desenvolvido com uma justificativa pouco aceitável. Mesmo assim, existem momentos bem interessantes no que condiz ao relacionamento familiar e nas tendências às mudanças de personalidade das pessoas ao entrar em choque com um mundo regido pela tecnologia onde tudo é possível, até viajar no tempo e trazer um dinossauro particularmente engraçado e carismático, que rendeu um dos melhores momentos da animação. Momentos estes que tratam de esconder quando o enredo mais precisa entreter os espectadores e causam uma falsa sensação de aceitação completa da história, por seu conteúdo pragmático e parcialmente interessante.

Apesar de não agradar como um todo fica óbvio a tentativa da Disney em não trabalhar somente em animações com teor infantil, mas também começar a mexer com a imaginação dos infanto-juvenis. É importante também começar a crescer junto com seu público e trazer eventualmente animações com um pouquinho mais de maturidade e não somente idéias infantis em excesso. Mesmo com o desgaste que "A Família do Futuro" sofre em sua realização, ainda continua sendo uma boa pedida para conquistar a empatia dos jovens que procuram bons momentos de entretenimento no cinema. Mexendo com o já cansado jogo de passado e futuro, não abandona o ensinamento de lições fraternais, que acabam sendo as mesmas em qualquer geração, mesmo com o advento da tecnologia, além de gerar a identificação do público com os acontecimentos vistos em cena, como as casuais brigas de irmãos e problemáticas entre pais e filhos, que culminam em uma interessante discussão sobre os problemas familiares que os espectadores podem levar para fora do cinema e começar a se entender melhor. Enfim, uma boa animação e ponto.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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