Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 23 de dezembro de 2006

Cavaleiro Didi e a Princesa Lili, O

Uma semana depois do fracassado "Xuxa Gêmeas", chega "O Cavaleiro Didi e a Princesa Lili" como mais uma opção cinematográfica para as crianças brasileiras com o mero intuito de fazer o que sempre fez: tentar divertir, sem sair do lugar comum e não apresentar nenhuma excelência técnica.

É inegável o valor do humorista Renato Aragão não só dentro do cenário infantil, mas também perante aqueles que cresceram se divertindo com as impagáveis aventuras dos Trapalhões. Parece que, quando o grupo foi começando a se desfazer, aquela magia de antes não conseguiu se estabelecer, restando apenas ao Didi continuar levar uma vida levemente descompromissada com seu público atual, com um programa televisivo sem graça e repetitivo. Sem largar o que se conhece por "filmes do Didi", o ator que já passa dos 70 anos chega com mais uma produção fraquinha, mas comprovando que seu carisma ainda é um fator chave para divertir as crianças, mesmo dispondo dos jargões de sempre e das mesmas palhaçadas. Diferentemente do que se pôde ver em "Xuxa Gêmeas", Didi dá muito mais movimento ao seu longa-metragem e possui muito mais recursos de entretenimento do que a loira cujo filme não passa de um capricho medíocre da mesma.

Na história básica, Didi é o cavalariço e melhor amigo do Rei da Landnóvia, posto invejado por Jafar, irmão do Rei. Lili é a princesa protegida do reino, filha única dos reis e futura rainha. Desde o primeiro momento em que Didi e Lili se conheceram, uma ligação de amizade se estabeleceu entre eles. Jafar está disposto a tudo para tomar o trono, mas Didi está sempre em seu caminho, aconselhando e protegendo o reino. Em uma tentativa de livrar-se do cavalariço, quem acaba levando a pior é seu irmão, o Rei Lindolfo. O principal plano de Jafar é casar Lili com seu filho Galante, porém a moça conhece o plebeu Juan e uma paixão pueril surge entre os dois. Os anos passam. Lili, agora uma linda jovem, retorna do exterior, onde foi completar sua formação para assumir o trono. Jafar planeja mais uma vez se apoderar do trono e se conscientiza que Lili deve se casar com Galante, mas Didi fará de tudo para isto não acontecer, desmascarando a ambição do vilão.

Quatro foi o número de responsáveis por compor o roteiro de "O Cavaleiro Didi e a Princesa Lili", mas parece que não foi o suficiente para fazer dele um filme bom. Um dos primeiros pontos que percebemos logo de cara é que Didi agora está praticamente um coadjuvante e sua presença não é requisitada em quase nenhuma cena importante, a não ser nos momentos finais. Mesmo assim, quando ele aparece com aquela cara engraçada é quase sempre certeza de uma travessura divertida para as crianças. Digo "quase sempre" porque algumas piadas não funcionam em sua totalidade e os clichês e jargões já utilizados antes pelo comediante já não conseguem fazer gracinhas. Outro ponto esquisito dentro do roteiro é ver que, em certos momentos, ele se perde e o objetivo dele já entra em colisão com o que foi apresentado na trama. Mesmo usando um recurso diferente em quebrar a linearidade para contar a história (narrada por Lili adulta), percebemos que muito do que é dito não interfere no plano de fundo principal da trama, e isso é praticamente uma saída desesperada de enrolar a platéia e causar momentos de risinhos, usando sempre as quedas, os arrotos, os "pums" que caracterizam o cansaço da história e falta de criatividade em inová-la.

As atuações são deploráveis. Renato Aragão já criou seu estilo próprio e sua fisionomia sofrida, porém a grada continua a mesma, então não tem muito que exigir uma versatilidade maior, já que sempre ele atua como ele mesmo. A vontade de atuar ao lado da filha Lívian Taranto Aragão foi tão grande que Didi abriu mão da qualidade do elenco. Não que a menina seja uma péssima atriz, mas acredito que não esteja preparada para protagonizar um longa-metragem. Sua atuação é tão forçada que em quase todos os momentos parece que ela está lendo a plaquinha com o texto escrito e não dá o mínimo de emoção ao que sua personagem exige. Isso se reflete também em quase todas as crianças envolvidas na produção e o despreparo acaba atrapalhando um desenvolvimento razoável do enredo. O déficit nas atuações só vai sendo amenizado quando os adultos começam a tomar conta da história, ou seja, quando as crianças crescem. Camila Rodrigues, Guilherme Behringer e Paulo Nigro acabam dando uma disfarçada na péssima qualidade do elenco, mas não é o suficiente. Quem esteve digna de bons elogios o tempo todo foi a experiente Vera Holtz, que fez da Rainha Valentina a única personagem decente do longa. Além dela, é sempre bom ver Werner Schünemann e Sérgio Mamberti em ação, pena que suas participações tenham sido tão curtas.

O diretor Marcus Figueiredo não só aproveitou mal seu elenco como demonstrou pouca disposição em fazer a história convencer. Administrando mal as tomadas, era muito raro conseguir planos bons, ou conduzir a película de forma interessante, e sempre acabava se perdendo junto com o roteiro. Nem o uso do fundo verde para fingir que os personagens estão em uma mata do reino foi bem trabalhado e elementos como um "peixe brigão" que começa a lutar com o Didi são totalmente frustrantes em um filme com tantos defeitos. E se vierem dizer que a tentativa foi de criar um universo imaginário para as crianças que estavam assistindo, tenha certeza que foi frustrada. Ah, e como se não bastasse, o uso dos dublês dispensam comentários ruins. Assista e veja que ali não é o Didi enfrentando um touro ou lutando com fulano. Existe uma coisa chamada fisionomia que faz de Renato Aragão um ícone do cenário nacional, que todo mundo conhece tim-tim-por-tim-tim e um dublê sem semelhanças com ele realmente só poderia resultar em escrachos.

Com uma parte técnica bastante ineficiente, "O Cavaleiro Didi e a Princesa Lili" acaba até sendo uma boa opção para os pequenos, mas exclui os olhares mais críticos dos adultos. Com certeza obtém sucesso ao entreter e fazer das férias escolares mais divertidas, mas somente isso. Sem um elenco decente e com uma história vazia, ainda assim percebemos a vontade de criar um projeto razoável, o que não podemos ver no concorrente "Xuxa Gêmeas". De qualquer forma, levem suas crianças para ver as trapalhadas do Didi, pois ele ainda continua com seu poder incrível de comunicação infantil e não permite que a idade o afaste do humor que esteve presente em todas as épocas de sua vida.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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