Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 04 de janeiro de 2007

Tudo Sobre Minha Mãe

Um autêntico exemplar de Almodóvar, que traz todos os seus elementos já consagrados conduzidos de forma espetacular. O longa acaba por constituir um dos melhores filmes do diretor em sua fase madura.

Almodóvar é sinônimo de divergência de opiniões. Não porque seus filmes em si sejam o motivo principal de estranhamento do público não-simpatizante de seu estilo, mas a escolha de temas, por vezes "desconfortáveis" e a abordagem peculiar que o diretor exerce sobre eles acaba por gerar tantos fãs quantos críticos severos de sua obra. No entanto, até os que torcem o nariz diante dos filmes e roteiros do cineasta têm que admitir que seu nome já é um tópico da história do cinema, e "Tudo Sobre Minha Mãe" é, definitivamente, um exemplar notável de sua admirável filmografia.

Novamente se faz presente a figura feminina como centro de uma trama que envolve os já conhecidos elementos patológicos, por assim dizer, freqüentemente escolhidos pelo diretor para habitar suas tramas. Esteban é um jovem que ganha como presente de aniversário uma ida ao teatro com sua mãe. Ao esperarem a atriz principal na saída para pedir um autógrafo, Esteban é atropelado e morre, justamente após sua mãe prometer que contaria a verdade sobre o pai que o jovem nunca chegou a conhecer. Após o acontecimento trágico, Manuela, a mãe do garoto, parte em busca de seu ex-marido, procurando uma espécie de catarse pela morte do filho ao mesmo tempo em que procura resolver pendências do passado.

Logo de cara, uma das características principais de Almodóvar se faz notar. Uma sinopse que possui todos os preceitos para ser desenvolvida como um verdadeiro drama é classificada de comédia. Não é erro. O diretor faz com que um roteiro potencialmente denso ganhe ares cômicos, como se desejasse mostrar que nada é tão grave assim. Dessa forma, se desenvolve mais uma vez nesse filme, assim como em inúmeros outros da carreira do diretor, uma trama envolvente, surpreendente e instigante. A impressão que o diretor deixa no espectador é que ele está no domínio total da obra, talvez justamente porque é ele a assinar também o roteiro. Almodóvar parece o único capaz de poder materializar as cenas que escreve com tanta maestria.

Outro ponto destacável do longa está na escolha do elenco – que, como na maioria dos filmes do diretor, conta com grandes atrizes em papéis de destaque. Para começar, dois nomes de peso do cinema espanhol: Cecília Roth e Marisa Paredes. A primeira como a protagonista Manuela, mãe do jovem atropelado; a segunda como a atriz da peça assistida por Manuela e seu filho, que acaba por ganhar mais espaço à medida em que o filme se desenvolve. As duas parecendo extremamente à vontade em seus papéis. Penélope Cruz, em sua segunda parceria com Almodóvar, também exerce bem sua função na trama.

A espanhola Antonia San Juan, no entanto, é quem constitui um episódio à parte em relação ao elenco. Na pele da travesti Agrado, a atriz dá simplesmente um show de interpretação, tornando seu personagem um ponto forte do filme. O único pecado do diretor em relação a esse papel talvez tenha sido transformá-lo em algo um tanto quanto caricato. De qualquer forma, a competência da atriz faz com que isso seja apenas um detalhe menor.

Quanto à fotografia, faz-se presente novamente aquela que é uma das marcas registradas de Almodóvar: as cores fortes. Tanto no figurino quanto no cenário, esse é um aspecto que costuma chamar bastante atenção em seus filmes e com "Tudo Sobre Minha Mãe" não poderia ser diferente. O resultado é a peculiar atmosfera almodovariana, resultado da fotografia casada com a trilha sonora carregada de ritmos hispânicos.

Ganhador de vários prêmios em festivais pelo mundo todo, "Tudo Sobre Minha Mãe" é parada obrigatória para qualquer fã de cinema, seja admirador de Almodóvar ou não. Um filme que, definitivamente, vale a pena ser conferido.

Amanda Pontes
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