Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 31 de maio de 2023

Fantasma e CIA (Netflix, 2023): sem sustos, aventura surpreende de maneira criativa

Com uma atmosfera leve, o diretor Christopher Landon desenvolve uma história divertida para David Harbour brincar de atuar.

David Harbour já provou ser um ator que curte projetos diferentões, a começar por “O Monstro do Monstro de Frankenstein”, em que ele interpreta o próprio pai, Frankenstein e ele mesmo. Em outra obra mais recente, fez “Noite Infeliz”, em que encarna o Papai Noel no melhor estilo “John Wick”. Da Netflix, seu novo projeto nesse estilo peculiar é “Fantasma e CIA”, em que interpreta… um fantasma! É péssimo ter que explicar piada, mas a tradução em português do título foi feita para brincar com um trocadilho entre a CIA (Central Intelligence Agency) com a versão abreviada de “companhia”. Por curiosidade, o título original é “We Have a Ghost”, algo como “Nós Temos um Fantasma”, que era milhões de vezes melhor.

A trama gira em torno de Kevin (Jahi Di’Allo Winston), um menino cuja família foi obrigada a se mudar para uma casa aparentemente assombrada. Seus pais, Frank (Anthony Mackie) e Melanie (Erica Ash), estranham o baixo valor, mas decidem seguir com a mudança mesmo assim. Na casa, Kevin encontra Ernest (David Harbour), um fantasma que mora no local. Ele não fica com medo, dá risada e consegue gravar o espírito com o seu celular. Eventualmente, sua família descobre o conteúdo e publica no YouTube, que viraliza rapidinho nas redes sociais. O local logo vira um ponto de encontro de curiosos e da imprensa (lembrei de você, “A Mulher da Casa Abandonada”). Ao se aprofundar sobre o passado de Ernest para tentar libertá-lo dessa vida (ou morte?), Kevin acaba virando alvo da CIA, que reinicia um programa governamental que busca capturar fantasmas para estudo.

O longa é dirigido e roteirizado por Christopher Landon, que já tinha trabalhado com essa mistura de horror com comédia em “A Morte Te Dá Parabéns”. Ele também tem vasta experiência com fantasmas após cinco filmes da franquia “Atividade Paranormal” — obviamente com outra abordagem. Em uma rápida cena já são estabelecidas algumas regras para Ernest: ele não consegue falar, não se lembra do seu passado, pode tocar nas pessoas, mas as pessoas não podem tocar nele. Harbour claramente se diverte nas gravações, tem um olhar bondoso e precisa se virar com uma linguagem corporal bem evidente para compensar a dificuldade do personagem de se comunicar.

Fica a dúvida sobre o motivo de Jennifer Coolidge aceitar papéis tão bobos como o da médium Judy Romano. Se ela participa de cinco minutos do filme é muito, ainda por cima em uma cena que não diz nada, feita apenas para a mais pura comédia pastelão. O roteiro brinca com a capacidade de viralizar um conteúdo hoje em dia e como este material pode ser abordado em diversos caminhos, como uma dancinha para o TikTok, hashtags que viram trends do momento, um depoimento a favor dos “direitos dos fantasmas”, entre outros.

Além de uma boa trilha sonora, que moderniza a estética anos 80/90, o CGI é bem feito. Ernest solta um tipo de ectoplasma que torna mais fluida sua movimentação, assim como facilita o entendimento quando ele interage com as pessoas e objetos. Esses efeitos possibilitam oportunidades interessantes para o roteiro, como por exemplo, o fato do personagem sumir e aparecer a qualquer momento, que acaba gerando uma criativa sequência de ação em uma perseguição de carro.

O terceiro ato, no entanto, fica corrido, com pouco desenvolvimento de um vilão que surge nos acréscimos do segundo tempo. Não dá tempo de odiar o personagem, o que seria resolvido com mais tempo de tela. “Fantasma e CIA” é um filme com uma atmosfera leve e com uma proposta criativa. Assim como Ernest, a Netflix de vez em quando assusta com algumas novidades, mas acaba ganhando o nosso coração quando acerta.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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