Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 04 de outubro de 2022

A Queda (2022): tensão nas alturas

Tenso e despretensioso, este suspense de sobrevivência é um exercício criativo de extrair o maior número possível de situações a partir de uma premissa simples, mas intrigante.

Dirigido e coescrito pelo cineasta Scott Mann, “A Queda” é o típico thriller de baixo orçamento, mas impressionantemente bem produzido, no qual nos perguntamos o tempo todo: “o que eu faria nessa situação?”. E justamente por isso, fechamos os olhos para os diversos clichês e estereótipos que tornam certas reviravoltas e o desfecho previsíveis. Afinal, neste caso, a jornada importa mais do que a chegada.

Um ano após uma tragédia nas montanhas, as melhores amigas Becky (Grace Caroline Currey) e Hunter (Virginia Gardner) decidem escalar uma enorme torre de TV abandonada. Ao chegar ao topo, a escada envelhecida desmorona, deixando a dupla presa enquanto lutam desesperadamente para sobreviver aos perigos, à falta de suprimentos e à altitudes que causam vertigem.

Bem, a essa altura, talvez você já tenha notado uma certa familiaridade com tantas outras histórias que giram em torno de personagens tentando sobreviver a situações extremamente adversas. Obras como “127 Horas”, de Danny Boyle, e “Águas Rasas”, de Jaume Collet-Serra, são bons exemplos desse gênero capaz de despertar o máximo de interesse com o mínimo de recursos. E a direção de Mann e a fotografia de MacGregor (“Vivarium”) conseguem explorar essa característica de maneira espetacular.

Embora os primeiros vinte minutos estabeleçam de forma protocolar a origem do trauma de Becky e sua complicada relação com o pai, interpretado por Jeffrey Dean Morgan, o que vem a seguir faz todo o resto valer a pena. E, de fato, é admirável ver como algo tão trivial como subir as escadas de uma velha torre ganha ares cinematográficos. A cada rangido e tremor, a estrutura metálica parece ganhar vida própria, em parte graças à alternância de close-ups e planos panorâmicos que, além de dar ritmo e senso de escala, também antecipa o desastre que está por vir.

Então, quando Becky e Hunter finalmente se encontram isoladas a uma altitude equivalente ao dobro da Torre Eiffel, elas realizam uma série de tentativas de se salvarem, que exigem não apenas coragem e habilidade, mas sobretudo inteligência. Entretanto, devido à displicência do roteiro de Mann e Jonathan Frank (“Refém do Jogo“), é necessário manter um alto nível de suspensão de descrença para ignorar as inúmeras falhas e inconsistências do enredo, visto que uma mera corda mais longa seria suficiente para resolver o conflito que se estende além do necessário.

Apesar das ressalvas, “A Queda” é uma experiência intensa e imersiva, capaz de prender a atenção do público mesmo com poucos artifícios. Ao invés do habitual uso exagerado do CGI, a produção opta por efeitos práticos misturados com o uso sutil da técnica digital. Além disso, há uma boa combinação entre a bela fotografia de MacGregor com a direção dinâmica de Mann que, juntas, compõem uma atmosfera tensa e vertiginosa, em que a cada tentativa fracassada resulta em um novo desafio ainda mais arriscado e emocionante.

Alan Fernandes
@alanfdes

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