Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 02 de abril de 2022

Hermanoteu na Terra de Godah — O Filme (Telecine, 2022): garantia de boas risadas

Adaptação não acerta em todas as decisões, mas a transição para a sétima arte encaixa o bastante para possibilitar que esta história hilária seja acessível para mais pessoas.

Após o sucesso nos palcos, a trupe de teatro Cia. de Comédia Melhores do Mundo traz sua peça “Hermanoteu na Terra de Godah” para a sétima arte, com lançamento exclusivo no Telecine. Há vídeos de mais de uma década de idade no YouTube que provam a popularidade e a imensa capacidade humorística da obra, que teve os desafios costumeiros ao ser adaptada em uma mídia diferente.

Quem conhece a peça, logo perceberá adições à trama que melhor encaixam-na no formato de filme, com a introdução de novos personagens. Jonas Bloch interpreta o novo Papa, recém-eleito pela Igreja Católica, mas logo após sua escolha, é revelado a ele a história do peregrino Hermanoteu, o 13º apóstolo de Cristo, que ficou de fora da Bíblia. Este é a primeira de outras boas e bem-vindas mudanças.

Para quem já viu a peça (ou alguns vídeos) algumas vezes, é notável – e louvável – a retirada de algumas piadas datadas, evidenciando a evolução da trupe, que também adicionou novas gags e esticaram algumas cenas para gerar mais humor e auxiliar o fluxo narrativo da trama, tudo sem perder o clima da obra original. É uma boa notícia para fãs de longa data, que terão algo novo para desfrutar.

A transição para as telas trouxe outros bons elementos: cenários e locações. As cenas do deserto foram filmadas no Atacama, que é belíssimo por si só, e sua vastidão transmite bem a ideia de uma longa peregrinação. Há também espaços bem projetados que fornecem maior imersão em certos momentos, se valendo das possibilidades ofertadas pelo cinema que não acontecem no teatro. Todavia, há certas decisões estranhas nesse quesito. Algumas sequências ficariam melhores em locais mais limitados ao invés da imensidão do deserto — incluindo o famoso e hilário relato de Isaac (o fantástico Welder Rodrigues) sobre os feitos de Moisés.

O elenco sempre foi e continua formidável. Interpretando os papéis a mais de dez anos, todos sabem, com precisão cirúrgica, onde exagerar numa fala, a expressão certa a fazer, e o que certos acontecimentos representam para seus personagens. Ênfase no S de “personagens”, pois os atores interpretam inúmeras pessoas diferentes — refletindo o que também acontece nos palcos. A exceção é o protagonista, único papel interpretado por Ricardo Pipo, que atua como se estivesse revisitando um velho — e nostálgico — amigo.

Tamanho sucesso e presença de conteúdo nas redes sociais da peça original pode ser uma faca de dois gumes no que diz respeito a conquistar novos fãs, que podem não ter interesse em assistir ao filme por existirem tantas amostras online. Entretanto, o potencial de entretenimento do longa é inegável, e ganha elogios por fazer humor com elementos religiosos sem diminuir ou destratar a crença de ninguém.

E para quem já viu Pipo, Rodrigues, Adriana Nunes, Victor Leal, Adriano Siri e Jovane Nunes em ação, fica impossível não ter carinho não só por este longa, mas por todas as peças já produzidas. Se tem algo que “Hermanoteu na Terra de Godah — O Filme” faz, além de divertir o espectador, é leva-lo a torcer para mais obras da trupe, em qualquer mídia. O riso cura, a comédia acalenta, e em tempos sombrios, isso é ainda mais valioso.

Bruno Passos
@passosnerds

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