Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Belle (2021): o belo poder artístico dos jogos de vídeo game

Bela animação traz elementos do famoso conto de fadas "A Bela e a Fera" para debater o poder da arte na cura de traumas.

Misture “A Bela e a Fera” com “Jogador Nº 1”, tempere com o trauma da morte da mãe e uma animação fenomenal, e temos o ótimo “Belle”, do diretor e roteirista Mamoru Hosoda, que já teve seu filme “Mirai” indicado ao Oscar.

O filme conta a história de Suzu, uma adolescente que mora no interior do Japão e que se retraiu muito após a morte da mãe, o que a traumatizou de um tanto que ela não consegue mais compor ou cantar, algo que era parte integral de sua vida. Com a sugestão de uma amiga, ela acaba entrando no jogo “U”, e nesse enorme mundo virtual, assume o avatar de Belle, e lá consegue cantar, atraindo a atenção do mundo todo.

Essa breve sinopse nem menciona de onde viria a Fera no filme, mas é apenas um exemplo de como o roteiro é um pouco inchado com tantas tramas paralelas. Nem todas fluem da melhor maneira, mas, mesmo assim, Hosoda consegue polvilhar humor e alma em cada cena, e fica difícil não ser cativado.

A construção de mundo é fenomenal e os cenários são de cair o queixo, seja pelo realismo idílico do mundo real ou pela exuberância infinita do mundo virtual. Este ganha, do roteiro, bons debates sobre o como este tipo de arte pode ser bastante benéfico e ajudar pessoas a encontrarem diversas coisas dentro de si, como coragem, inspiração e cura. É como se fosse um poço de possibilidades de epifanias.

Outro bom acerto é a forma com que comentários de usuários do jogo são utilizados para auxiliar a narrativa. Aparecem como balões de fala em volta da protagonista, e nunca é confuso ou excessivo, e vêm com as vozes simultaneamente, gerando quase conversas genuínas.

Hosoda revelou que gostaria de ter feito um musical, mas como eles não são comuns na cultura japonesa, deu uma driblada na situação para entregar sequências musicais bem inseridas na trama. Ajuda muito o fato da atriz Kaho Nakamura ter talento de sobra para atuar e cantar.

Quando um usuário entra no jogo, ele “lê” a biometria da pessoa e cria um avatar único, levando em consideração informações ímpares de cada indivíduo. É um acessório narrativo bem interessante, que faz com que o espectador imagine as personalidades de cada jogador, já que os avatares nem mesmo precisam parecer humanoides. Tal artifício torna a jornada da protagonista mais palpável, trazendo realismo para as situações que ela passa enquanto Belle e como elas refletem em sua própria mente.

Aplaudido por 14 minutos no Festival de Cannes, “Belle” é um ótimo exercício criativo que usa um famoso conto de forma fresca e convidativa. O foco não é no romance, mas em como conexões positivas podem afetar e inspirar uma pessoa. Essa mensagem transmitida por meio de uma animação estonteante e personagens cheios de carisma é mais eficiente… e bela.

Bruno Passos
@passosnerds

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