Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Hotel Transilvânia: Transformonstrão (Prime Video, 2021): quatro nem sempre é demais

Seja com a animação exagerada, as caras e bocas dos personagens ou a temática simples, mas fácil de se identificar em qualquer idade, o capítulo final da franquia de Genndy Tartakovski tem algo para fazer todo mundo rir um pouco.

Um dos maiores privilégios que podemos ter na vida é testemunhar o crescimento de alguém em primeira mão. Ciclos começam e terminam e, nesse meio tempo, a pessoa se torna alguém melhor do que era antes. Nesse contexto, dez anos podem até parecer pouco se comparados ao tempo de uma vida, mas o que se pode amadurecer nesse período não está escrito. Para toda uma geração de crianças, um desses ciclos se conclui agora com “Hotel Transilvânia: Transformonstrão“, a última aventura de Drac, Mavis, Johnny e sua turma.

Dono do hotel desde sempre, Drácula (Brian Hull) está cansado. Durante os séculos, ele conduziu bem seus negócios, criou sua filha Mavis (Selena Gomez) com amor e até aprendeu a tolerar seu genro bobo, Johnny (Andy Samberg), em nome da família. Só que, para que as coisas deem certo, é preciso confiança, e isso é uma via de mão dupla. Drac quer descansar e deixar seu maior bem, o hotel, para seu maior amor: sua filha. A capacidade de Mavis nunca esteve em dúvida…

Mas e a de Johnny? O jovem sempre foi o elemento estranho da turma. O humano em um grupo de monstros. Depois de ouvir o sogro falando de seus planos, o rapaz decide que precisa estar apto a ajudar a esposa, e o jeito é claro: se transformar em monstro. Com a ajuda do doutor Van Helsing (Jim Gaffigan), ele elabora um plano que acaba trazendo consequências sérias não só para ele, mas para Drac e todos os seus amigos. Consertar esses erros não será tarefa fácil, mas pode ser o que faltava para que Drac e Johnny finalmente aceitem um ao outro.

Na indústria atual, as coisas boas sempre vêm aos trios. Nos cinemas, as grandes sagas usam três filmes para contar suas histórias. Na televisão, a terceira temporada é onde o desfecho começa a ganhar contornos. Histórias, em geral, têm três partes — começo, meio e fim. Quando algo sai desse formato, normalmente já começamos a torcer o nariz — “lá vem mais uma franquia sendo alongada desnecessariamente”. Surpreendentemente, não é o caso com “Transformonstrão”.

Se considerarmos a máxima dos trios, de fato, talvez algumas histórias poderiam ter sido melhor aproveitadas em outros lugares, ou um dos filmes poderia ter sido cortado… Mas não é bem assim que as coisas acontecem na prática. “Hotel Transilvânia” sempre foi uma franquia voltada para crianças pequenas, um público que não exige uma sofisticação tão grande e nem tem um gosto tão apurado como, por exemplo, seus pais. Mesmo assim, o toque do criador Genndy Tartakovsky sempre foi um diferencial, capaz de conciliar esses dois públicos tão distintos. Ele mesmo já fizera coisas para ambos, de “Laboratório de Dexter” a “Samurai Jack“.

O grande problema de “Transformonstrão” é justamente a falta desse toque. O lendário animador dirigiu todos os três filmes anteriores, e entregou o último aos pupilos Derek Drymon e Jennifer Kluska, que, apesar de razoáveis na direção, não são um Tartakovsky. O clima fica ainda mais acentuado ao perceber que a maior estrela dos filmes também não voltou para sua conclusão, com a voz de Drácula sendo entregue de Adam Sandler para Brian Hull. E, novamente, por mais competente que seja o trabalho de Hull, não é um Adam Sandler. Para animações, a troca de uma voz tão central só é aceita em casos extremos, senão acaba inevitavelmente criando um clima de fim de festa.

Ainda assim, cada família que sentar junta para assistir a “Transformonstrão” certamente irá se divertir. Seja com a animação exagerada, as caras e bocas dos personagens ou a temática simples, mas fácil de se identificar em qualquer idade, o filme tem algo para fazer todo mundo rir um pouco, da criança mais ingênua ao adulto mais sisudo. Afinal, se até Drac acaba aprendendo a aproveitar sua jornada, por que nós também não aproveitaríamos?

Julio Bardini
@juliob09

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