Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 12 de maio de 2021

Twister (1996): desastre de entretenimento

Produção conturbada não impediu que um dos filmes de desastre com mais poder de entretenimento chegasse às telas e levasse o espectador a um tornado de adrenalina.

Lançado em 1996, “Twister” é um filme de desastres naturais. Com nomes de peso envolvidos, como produção de Steven Spielberg, roteiro de Michael Crichton e Anne-Marie Martin e direção de Jan de Bont, o longa conta a história de um time de caçadores de tornados que querem soltar um equipamento perto de um para que, assim, eles consigam dados que auxiliariam a um sistema de aviso mais eficiente.

O filme todo se passa em torno de 24 horas, em que Bill Harding (Bill Paxton) viaja com sua noiva Melissa (Jami Gertz) para encontrar sua ex, Jo Harding (Helen Hunt) e pedir para que ela assine os papéis de divórcio. Ao fazer isso, encontra seu antigo time de caçadores e cientistas com quem costumava trabalhar, num clima de tensão e empolgação pela promessa de ser um dia com inúmeras tempestades e várias chances de usar o promissor equipamento.

É uma boa introdução que dita a dinâmica entre os personagens. A camaradagem entre os membros do time, as saudades que todos sentiam, o carinho ainda existente entre o casal separado e a nítida empolgação que ambos sentem por esse trabalho. É essa empolgação que faz com que Bill se lance numa caçada que repentinamente se apresenta, e assim o roteiro segue até o final, não dando muito tempo para que os personagens respirem. Sempre que algo importante começa a ser debatido, um tornado chega para interromper, esta é a forma do filme esconder um texto não muito bem construído para ilustrar as relações interpessoais do triângulo amoroso. Há tentativas de humor que estão bem fora de tom com a maioria da obra, principalmente quando o casal principal bate boca.

Mas se é para emendar sequência atrás de sequência de ação e tensão com tornados, que seja bem feito. E aqui, é MUITO bem feito. Demora poucos minutos para o filme por o pé no acelerador, e não tira até o final. Com uma boa variação de planos, o visual é sempre dinâmico, mesmo quando tudo o que tem para mostrar é um grupo de carros se locomovendo para o local onde deve ser melhor para interceptar o tornado. Além do mais, o vento e os efeitos sonoros (que incluem até sons de camelos com velocidade reduzida) criam uma ótima sensação de “monstro à espreita”, como se a qualquer momento a ameaça pudesse aparecer e destruir tudo.

O clima de tensão é sempre muito bem construído e acerta com as pausas humorísticas advindas da interação do grupo (exceto o casal principal). Os efeitos especiais – que, juntamente com efeitos sonoros, renderam ao filme indicações ao Oscar – aguentam o tranco mesmo 25 anos depois.

Quanto aos personagens, o time de caçadores é um tufão de carisma. Mesmo não sendo apresentados a fundo, fica uma clara sensação do quanto eles são íntimos e da personalidade de cada um. Quanto ao triângulo amoroso, as coisas não funcionam tão bem e nota-se a clara e excessiva conveniência narrativa de querer enfiá-los em situações – literalmente – tempestuosas, e é aí que o roteiro engasga. Melissa pouco faz diferença para a trama, e Bill e Jo só são interessantes quando seus diálogos giram em torno de trabalho, nunca dá certo quando é sobre o passado dos dois. Há ainda o time rival comandado por Cary Elwes, que rapidamente cria o nível certo de antipatia para você torcer contra.

Apesar do massivo sucesso de bilheteria e das ótimas injeções de adrenalina que esse filme oferece, foi uma produção complicadíssima. O roteiro foi reescrito por outras três pessoas, a última trabalhando nele no set durante as filmagens. Caótico.

O céu precisava estar nublado para fazer sentido no filme, mas estava claro e ensolarado pela maior parte das filmagens. Muito do visual tempestuoso foi acrescentado posteriormente por efeitos especiais da Industrial Light & Magic. Em uma cena específica, uma luz forte foi usada para auxiliar nessa ilusão e acabou resultando em danos nos olhos de Paxton e Hunt, que precisaram de tratamento. Uma das cenas mais famosas tem os dois também numa vala embaixo de uma pequena ponte, mas o terreno ali estava tão imundo que precisaram se tratar contra hepatite. Isso tudo sem contar duas fortes batidas na cabeça de Hunt, uma vinda da porta de um carro.

Alguns funcionários também simplesmente abandonaram a produção porque De Bont era babaca e explodia com geral, chegando a derrubar um assistente de câmera, fazendo com que o diretor de fotografia fosse embora com seu time. Outro foi chamado, mas dois dias antes das filmagens acabarem, ele entrou num cenário de uma casa construída com um sistema hidráulico que iria derrubá-la e alguém sem querer ativou a máquina e a casa caiu em cima dele, que teve lesões na cabeça e nas costas e precisou ser internado. O próprio De Bont precisou assumir a função para terminar as gravações

Apesar do ambiente tóxico, inúmeros problemas e um roteiro falho, “Twister” é uma baita pedida para uma sessão de entretenimento, prendendo a atenção do início ao fim e criando um clima tormentoso que mantém a tensão tão alta quanto um tornado.

Bruno Passos
@passosnerds

Compartilhe