Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Umbrella (2020): comovente conto sobre empatia

Os diretores Helena Hilario e Mario Pece entregam uma bela obra sobre empatia, com uma carga narrativa rica em emoções que ainda consegue tecer comentários sobre problemas mundiais que causam imensas dores em familiares.

Mesmo com o título em inglês “Umbrella” (guarda-chuva), este curta é uma produção brasileira dirigida por Helena Hilario e Mario Pece. A estratégia visa tornar a obra mais abrangente para o público mundial e funciona, afinal o filme está na corrida para ser indicado ao Oscar de melhor curta de animação.

Disponibilizado na íntegra no canal do estúdio Stratostorm no YouTube até o fim de janeiro de 2021, o curta abre com um menino desenhando um adulto segurando a mão de uma criança na janela embaçada de um quarto, que logo se revela ser de um orfanato. Vestido com um cachecol amarelo, ele se anima quando vê a chegada de uma mãe com sua filha trazendo brinquedos para doação, mas seu sorriso nasce mesmo ao ver o guarda-chuva da menina, também amarelo.

Isto tudo acontece no primeiro dos quase oito minutos de duração do filme, que tem uma animação de qualidade estupenda: personagens se movimentam suave e organicamente, objetos e construções possuem texturas bem feitas e cuidados com os mínimos detalhes se revelam, por exemplo, num tapete levemente amassado na entrada da casa. Este tipo de artifício dá forças à narrativa, pois são elementos como esse que fazem um lugar parecer real, vívido e que há pessoas morando lá. Tudo ajuda na imersão.

A premissa é baseada numa situação real vivida pela irmã da diretora. Moradora de Palmas, no Paraná, ela levou brinquedos a uma instituição, onde conheceu um garoto que pediu um guarda-chuva, justificando seu pedido com a seguinte frase: “Quando meu pai me deixou aqui, estava chovendo, então acho que se eu tiver um guarda-chuva, meu pai vai me buscar”. Se isso não arrebenta o coração de alguém, pouco mais conseguirá fazê-lo.

E assim uma bela e singela obra sobre empatia encanta os olhos a cada quadro, sendo difícil não se emocionar. Apesar do título e de algumas poucas palavras escritas em objetos na casa estarem em inglês, a produção não possui falas. Ao focar nas expressões e nos olhares, a comunicação se dá por sentimentos e emoções, o que a torna universal. Não é exagero também dizer que esse objetivo é atingido com louvor, pois ainda conta com o auxílio da magnífica trilha sonora, que pontua cada momento de tristeza, saudades, irritação e até humor.

A direção é afiada, sabendo usar artifícios visuais para aumentar os efeitos de cada cena. Por exemplo, o momento em que personagens são capturados por janelas distintas é certeiro em passar a sensação de abandono e solidão necessária. Destaque também para a sequência de memórias do garoto, que é iniciada por uma lágrima caindo numa folha de papel e tem imagens belíssimas com o estilo de animação levemente mudado, eternizando momentos em quadros encantadores e melancólicos. Ainda vale mencionar a presença da cor amarela em praticamente todas as cenas, realçando a importância da conexão que aquela cor tem com os sentimentos do garoto, além de pincelar pontos distintos do filme que levam o público a uma boa jornada de emocional.

Com poucos minutos, “Umbrella” consegue criar um universo inteiro que leva o espectador a conhecer uma criança e, por meio de sua história, ponderar sobre problemas pelos quais pessoas ao redor do mundo passam numa escala maior. É um convite a um exercício de empatia, de levar a trajetória de outra pessoa em consideração, de se colocar em seu lugar. É lindo, inúmeros sentimentos transbordam pela tela e, assim, atingem corações com a força de um tsunami emocional. É impossível não sentir certo orgulho ao ver algo de tamanha qualidade ser criado por brasileiros nesse cenário.

Bruno Passos
@passosnerds

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