Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 04 de dezembro de 2020

LEGO Star Wars – Especial de Festas (Disney Plus, 2020): melhor que A Ascensão Skywalker

Com a leveza e irreverência características de tudo produzido pela LEGO, o "Especial de Festas" acerta em cheio ao usar a cultura dos fãs para criar uma história que, apesar de típica de Natal, seria uma conclusão melhor para a saga que "A Ascensão Skywalker".

Nos últimos anos, o campo dos video games evoluiu muito. Dos gráficos às próprias histórias, os jogos estão cada vez mais sofisticados e atraentes para o público. É de se surpreender, portanto, que alguns dos jogos mais queridos da indústria sejam da LEGO. Indo na contramão desse movimento, a marca dinamarquesa de brinquedos sempre se destacou nesse meio por adaptar grandes franquias do cinema – como “Star Wars“, por exemplo – no formato de seus bonecos de brinquedo, contando exatamente as mesmas histórias dos filmes, mas abraçando a estranheza de seu molde e acrescentando uma irreverência e ingenuidade que dobram qualquer marmanjo. Com “LEGO Star Wars: Especial de Festas“, essa tradição passa para as telinhas.

Lançado pela plataforma Disney Plus, o “Especial de Festas” de “Star Wars” retoma uma tradição já consolidada entre os fãs: sempre que um filme novo da franquia é anunciado, espera-se de imediato que um novo jogo da LEGO seja lançado junto (sem falar nos brinquedos, claro), pois sempre há garantia de diversão. Mas aqui não estamos falando dos jogos, e sim de um programa feito para o formato televisivo. Para alcançar um público ainda maior, a estratégia foi certeira: buscar inspiração no infame “Especial de Natal” original, de 1978, e tentar utilizar ao máximo diversos personagens da saga criada por George Lucas.

A trama começa com os heróis da nova trilogia no planeta Kashyyyk, prontos para celebrar o Dia da Vida com a família de Chewbacca. Antes, contudo, é preciso preparar a Millennium Falcon para receber os convidados e, bem, a situação não está tranquila nem favorável: Rey está tentando treinar Finn nos caminhos da Força, mas vem tendo dificuldades, Poe não consegue se concentrar em meio a tanta animação, e Rose vem fazendo o possível. Frustrada com tudo, Rey resolve buscar sabedoria nos textos sagrados do Jedi – ser professor já não é fácil, em meio a esse caos, então… Sua busca por sabedoria acaba levando-a ao planeta Kordoku em pleno Dia da Vida, onde ela encontra um antigo templo Jedi e entra em contato com um cristal especial, capaz de abrir portais para diferentes pontos do passado.

A partir daí, a aventura de Rey a leva a momentos-chave da Saga Skywalker (e até dá um pulinho em Nevarro para ver o Mandaloriano e a Criança). O grande problema é ela ter acabado na sala do trono do imperador Palpatine um pouco antes dos acontecimentos de “O Retorno de Jedi” e ser vista pelo Sith e por Darth Vader. Agora ela precisa dar um jeito de voltar à sua própria linha do tempo enquanto foge de Vader e leva diversos outros personagens consigo, de Kylo Ren até Darth Maul, passando por diversas versões Han Solo, Obi-Wan Kenobi e mais. Tudo isso enquanto, na Millennium Falcon, a família de Chewbacca chega para a festa, com direito a porgs, karaokê e até a Max Rebo Band tocando música ao vivo.

Para contar essa história caótica e hilária, o especial traz de volta diversas vozes conhecidas como James Arnold Taylor como Obi-Wan Kenobi, Matt Lanter como Anakin Skywalker, Dee Bradley Baker como os clones do exército da República, Billy Dee Williams como Lando Calrissian e Kelly Marie Tran como Rose Tico. Por mais que o trio principal de atores da nova trilogia não esteja presente, essa falta mal é sentida, pois suas novas vozes encarnam os personagens com todas suas idiossincrasias e as elevam ao máximo: Helen Sadler com a insegurança e jeito maravilhado de Rey, Jake Green com a empolgação até um pouco irritante de Poe Dameron e Omar Benson com o tom calmo e pacificador de Finn, a cola que mantém todos juntos. Uma menção honrosa não poderia faltar para o Kylo Ren de Matthew Wood, dono de algumas das melhores cenas do programa.

O grande trunfo do “Especial de Festas”, contudo, não está exatamente na história, mas no tom utilizado para contá-la. Qualquer obra de LEGO tem como marca registrada humor, leveza e irreverência, e aqui não é diferente. Mesmo havendo conteúdo original e contando a primeira história ambientada após “A Ascensão Skywalker“, o principal atrativo aqui é a sátira e as piadas que “Star Wars” faz consigo mesmo a partir de coisas cotidianas e presentes na cultura dos fãs, como memes da internet. Todos os personagens são caricaturas de si, e é exatamente isso que todos querem ver. De três Obi-Wans falando “hello, there!” um para o outro, passando por Luke Skywalker tomando leite azul em caixinha em Tatooine até Rey ver os espíritos de Luke e Leia Organa durante a festa de Dia da Vida. Tudo está lá para acalentar os corações dos fãs num 2020 já tão atribulado – e também remediar um pouco do trauma deixado por “A Ascensão Skywalker“, claro.

A LEGO já havia produzido paródias dos filmes de “Star Wars” antes e tem até uma série, “LEGO Star Wars: The Freemaker Adventures“, com participação de diversos personagens das séries de televisão da franquia. Mesmo assim, nunca o escopo de suas obras foi tão grande e um público tão amplo fora alcançado quanto agora pelo Disney Plus. Lidar com o estigma do “Especial de Natal” original e com a ressaca causada pelo final anticlimático da Saga Skywalker não é tarefa fácil, mas a equipe por trás deste “Especial de Festas” tira o desafio de letra. Pelo menos por alguns minutos podemos esquecer que Exegol sequer existe.

Julio Bardini
@juliob09

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