Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 26 de outubro de 2020

We Summon The Darkness (2019): nenhuma novidade à vista

Com uma narrativa focada no terror apresentado por uma seita satânica nos anos 1980, filme de Marc Meyers não é eficiente em nenhuma das suas tentativas de surpreender o espectador.

“We Summon The Darkness”  tenta entrar na onda dos filmes de terror que apresentam personagens femininas icônicas, como os recentes “Midsommar: O Mal Não Espera a Noite”, “Nós” e “Vingança”. A história segue três amigas a caminho de um show de rock numa pequena cidade norte-americana, que está ameaçada por uma seita satânica que comete assassinatos em seus rituais. Quando se juntam a três rapazes que encontram no local e então eventos estranhos começam a acontecer, a obra dirigida por Marc Meyers (“O Despertar de um Assassino”) e roteirizada por Alan Trezza (“Enterrando Minha Ex“) tenta talvez evocar o mesmo sentimento que as produções citadas anteriormente conseguem atingir com suas protagonistas femininas. Porém, falha ao não saber identificar o que torna as mulheres dos títulos mencionados tão eficazes.

O problema maior desse projeto está no fato de desejar apresentar um plot twist que não faz sentido de maneira alguma com tudo que é desenvolvido até sua inevitável revelação. Os comportamentos e as interações dos personagens são jogados completamente pela janela em nome de uma descoberta que pode surpreender mais por não fazer sentido do que por ser inesperada. Como a narrativa se divide entre o trio masculino e o feminino, sem revelar muito sobre a história, a abordagem mais eficaz seria se os protagonistas simplesmente fossem, desde o início, o trio de rapazes. Como não é o caso, a trama se desenvolve de forma confusa e sem deixar claro por quem torcer. Não porque aquelas figuras seriam ambíguas, mas porque existe uma falta de desenvolvimento estarrecedora de todos que estão presentes em tela.

O primeiro ato, além de ser desperdiçado quando a revelação acontece, progride completamente sem foco até finalmente chegar ao ponto desejado – assim, o momento não serve tanto quanto um plot twist e mais como “finalmente um plot!”. Em vez de instigar o espectador a continuar assistindo e descobrir o mistério por si só, é mais fácil a obra de Meyers nos convencer a desistir logo no início, já que ela não parece estar caminhando para lugar nenhum. Por conta disso, a narrativa não consegue se reerguer depois de tanto tempo perdido.

Se passando nos anos 1980, a produção nem mesmo entra na tendência de produções que retratam a época com uma boa dose de nostalgia, pois apresenta uma caracterização pobre do período. Como sua premissa já deixa explícita, tenta entrar no “satanic panic” da época para explicar as ações dos seus personagens. Entretanto, com pouquíssimas mudanças em momentos-chave, a história poderia se passar nos dias de hoje sem causar nenhum estranhamento; inclusive poderia até fazer mais sentido e talvez incluir algum tipo de comentário político. Pode-se argumentar que é isso que o filme tenta entregar ao inserir um conflito com a igreja local, mas seus temas mais sérios são tratados de forma tão superficial que o máximo que consegue evocar é um revirar de olhos de quem está assistindo.

Nem mesmo a mistura de terror com comédia se destaca. As mortes são ridiculamente “normais” para um filme que tem algo como o satanismo como parte de seu tema principal. Nenhuma cena causa medo, terror e muito menos choque. Personagens parecem mudar de foco sem nenhum motivo palpável e a personagem feminina que deveria servir como o olhar chocado do público diante do que está acontecendo não é carismática o suficiente para exercer este papel, além de nunca ser explicado o motivo pelo qual está envolvida na situação – trata-se de uma tentativa de colocá-la como uma heroína, apesar de em momento algum ela parecer merecedora dessa imagem.

As performances não são de todo ruim, principalmente de Alexandra Daddario e Maddie Hasson, que são carismáticas na maior parte. A direção de arte e a cinematografia também não chamam atenção: a casa onde a maior parte da ação se passa não é construída como um ambiente que adicione algo de valor à tensão pretendida, assim como os movimentos de câmera e os aspectos técnicos no geral.

Apesar de ter apenas 90 minutos, a obra por vezes parece ter muito mais tempo de tela por conta da falta de foco presente em quase todos os aspectos da produção. “We Summon The Darkness” pode parecer uma boa pedida para o mês do Halloween, porém certamente existem diversas outras obras que merecem mais atenção do que este projeto, que quase certamente irá decepcionar o espectador mais atento.

Lívia Almeida
@livvvalmeida

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