Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 05 de abril de 2020

#RapaduraRecomenda – Um Maluco no Golfe (1996): Sandler em polvorosa

Num de seus primeiros trabalhos como protagonista, um então promissor Adam Sandler desponta como um dos grandes da comédia pastelão com uma história absurda e cheio de exageros engraçados.

Lá pela metade dos anos 1990, o adulto com alma de jovem atrapalhado Adam Sandler já tinha no currículo passagens por programas de sucesso como The Cosby Showe o famoso humorístico Saturday Night Live, um dos mais longevos da televisão norte-americana. Sem esquecer de participações em comédias de baixo orçamento como “Cônicos & Cômicos”, estrelado pelo caça-fantasma Dan Aykroyd, e “Os Cabeças-de-Vento”, com Brendan Fraser e o até hoje parceiro Steve Buscemi. Ainda nesse período ele estreou nas telonas protagonizando “Billy Madison: Um Herdeiro Bobalhão”, filme que arrecadou mundialmente o dobro de seu orçamento e fez barulho entre os jovens. “Um Maluco no Golfe” segue a linha absurda e eloquente do seu antecessor, porém se sai melhor com o ótimo elenco, suas piadas rápidas e rasteiras e, principalmente, ao mostrar que o golfe pode ser um esporte divertido ainda mais se praticado por Sandler.

Escrito por Tim Herlihy (“Afinado no Amor“)  e pelo próprio Sandler, o roteiro acompanha a trajetória de altos e baixos do intempestivo Happy Gilmore. Estabelecendo uma ligação muito forte com o hockey no gelo graças ao falecido pai, Happy passou a vida toda tentando ser bem-sucedido neste esporte. No entanto, jamais conseguiu concretizar o sonho de ser jogador devido a sua pouca aptidão para a patinação e sua, digamos assim, instabilidade emocional. Levando uma vida medíocre enquanto insiste no sonho fracassado de vingar no esporte, ele sofre um baque quando sua adorável vovózinha (Frances Bay) é despejada de casa pelo não pagamento de impostos. Sua única saída para arranjar dinheiro para recomprar a casa é ganhar um campeonato de golfe. A favor de Happy: sua força descomunal nos braços. Contra ele, o fato de nunca ter pisado num campo de golfe e ainda ter como adversário o excelente Shooter McGavin (Christopher McDonald).

A trama é simples e passa longe de ser original, o destino da narrativa é previsível e os recursos técnicos precários. O que faz dele então um clássico da década de 1990 e um dos mais queridos dentro do gênero “filme do Adam Sandler”? A energia, agilidade, carisma e também uma trama honesta. “Um Maluco no Golfe” não engana ninguém. É uma comédia de absurdos, que encontra no excesso seus erros e acertos. Sandler confere a Happy Gilmore uma notável vibração. O temperamento explosivo do protagonista é explorado com muito bom humor pela narrativa e também pelo ator, que demonstra estar se divertindo bem mais do que o próprio espectador. Esse compromisso com um argumento que se revela tão raso supera qualquer ausência de inventividade no desenvolvimento. A motivação que o faz abandonar o sonho de ser um jogador de hockey para se transformar num campeão do golfe mostra-se acessível a qualquer pessoa, consegue despertar empatia e surge totalmente compreensível. Outro ponto que merece destaque e que impulsiona narrativa está no emprego do golfe como pano de fundo. Com o perdão do trocadilho, uma tacada certeira! De maneira inteligente, o roteiro reconhece que o esporte é cultuado por uma sociedade elitizada e praticado sob um silêncio quase que religioso, nada mais justo do que corrompê-lo com a introdução de um desafiante fora dos padrões.

Embora conte com todo o entusiasmo e magnetismo de seu protagonista, “Um Maluco no Golfe” pode se orgulhar das participações especiais de caras conhecidas, um tempero saboroso que serve de ferramenta para alavancar o humor. Ben Stiller, num de seus primeiros papéis no gênero, dá vida ao enfermeiro do asilo onde está a vovó Gilmore. No lugar, ele estabelece um espécie de ditadura, comandando inclusive um serviço clandestino no qual as velhinhas vivem sob um regime de trabalho escravo. Um subtexto impecável que poderia ter recebido mais atenção do argumento. Para satisfação do público, o filme soma em seu elenco Carl Weathers (o Apollo do clássico “Rocky: Um Lutador“), que na pele de Chubbs recebe a incumbência de transformar Happy num golfista profissional. Detalhe: ele largou a carreira como golfista após um jacaré devorar uma de suas mãos. Quando em cena, torna-se impossível segurar a vontade de rir enquanto gesticula com sua mão de madeira. Kevin Nealon e Allen Covert, companheiros frequentes de Sandler, têm seu momento de contribuição. O primeiro distribuindo conselhos repletos de metáforas e o outro sem diálogos, mas com atitudes espirituosas.

Desde o lançamento do filme, o humor tem passado por várias transformações. Por isso, assistir a “Um Maluco no Golfe” agora é, para alguns, correr o risco de mexer o fundo da memória afetiva e talvez se decepcionar com o efeito. Mesmo que diversas piadas percam força, o longa coleciona momentos que permanecem memoráveis graças à harmonia do elenco e à trama esportiva que jamais perde o charme. Desprovido de qualquer tipo de técnica cinematográfica mais apurada, aqui a única preocupação é oferecer o palco a Adam Sandler para que este possa exibir toda a sua jovialidade, animação e desenvoltura com seus parceiros.

A direção de Dennis Dugan (mais um que viria a ser colaborador assíduo de Adam) faz o simples e, auxiliada pela montagem ágil, converte “Um Maluco no Golfe” num filme para curtir no aconchego do sofá. Escrachado, vibrante e sempre pronto para fazer o público ter um bom passatempo, ele exige apenas que você relaxe, tenha o mínimo de apreço pelo protagonista, o qual está cheio de adrenalina, e compre sua jornada ridícula e quase cartunesca. Uma comédia de absurdos exageradamente divertida.

Renato Caliman
@renato_caliman

Compartilhe