Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 30 de março de 2020

Jonas (Netflix, 2018): romance intenso e verdadeiro

Apesar de pecar em alguns aspectos, filme de Christophe Charrier consegue entregar um romance satisfatório numa narrativa que trata o tema com o respeito necessário.

“Jonas” conta a história do personagem título, um adolescente introvertido e solitário que é atraído por Nathan (Tommy-Lee Baïk), o aluno novo e confiante da sua escola. Com o tempo, o relacionamento dos dois vai se tornando mais do que apenas uma amizade. Além de acompanhar o desenvolvimento da relação entre os rapazes, a narrativa alterna entre a vida do protagonista no passado (interpretado por Nicolas Bauwens) e no presente (interpretado por Félix Maritaud), quando se tornou um adulto briguento e sem rumo, bastante diferente de quem era mais jovem.

Dirigido e roteirizado por Christophe Charrier, o filme faz um trabalho eficiente em montar a dinâmica entre Jonas e Nathan, apesar de cair um pouco no clichê do estudante novo e desinibido que não tem medo de se arriscar e quebrar as regras, que chega para corromper o bonzinho que nunca se mete em encrencas. A diferença aqui, que eleva o patamar da trama para algo mais verdadeiro, é que o recém-chegado realmente se importa com o outro garoto e não está simplesmente usando-o para seu próprio divertimento, como acontece em vários romances do gênero.

Mesmo dando um bom background para os personagens, em alguns momentos a sensação que fica é a de que estão faltando cenas ou que elas foram cortadas pela metade, além de ser possível sentir falta de um aprofundamento maior do relacionamento amoroso. Tendo pouco menos de uma hora e meia de duração, esse é o tipo de obra que se beneficiaria de um tempo de execução maior para aprofundar as ligações emocionais entre aquelas figuras e a audiência. Apesar disso, todas as atuações são satisfatórias, com os atores entregando aquilo necessário para fazer o espectador ter empatia (mesmo que, em partes, apenas superficial) com seus personagens.

Existe uma revelação no terceiro ato que explica o porquê de Jonas ter mudado tanto entre a adolescência e sua vida adulta, algo que teria se saído melhor se tivesse acontecido antes e se desenvolvido numa narrativa mais abrangente. Por isso, é mais fácil se importar com a versão adolescente do que com seu eu adulto, ainda que este se envolva em situações mais bizarras e perigosas do que no passado. Em determinados momentos, independentemente da curta duração, o roteiro parece que está enrolando demais para chegar no ponto. Nesse meio termo entre longo e curto demais, existe uma ótima história que estão tentando contar, que carece de um pouco mais de foco para decidir quais aspectos precisavam de mais desenvolvimento e quais poderiam ter ficado na sala de edição.

Um ponto positivo é que a produção fala sobre sexualidade e homossexualidade sem tabu, como algo natural do qual os rapazes não sentem vergonha. Os assuntos são tratados de forma leve, mas com sua devida importância. Os momentos mais memoráveis são, de fato, enquanto o romance de Jonas e Nathan está em primeiro plano. E como mais tarde percebemos como Nathan foi uma pessoa crucial para quem o outro se torna.

O filme também acerta na construção do background dos dois rapzes, desenvolvendo na medida certa suas dinâmicas com as famílias (a de Nathan sendo mais aberta e a do protagonista mais fechada, porém ainda amorosa). Esse fator também ajuda a audiência a entender melhor os comportamentos de cada um deles fora do seio familiar.

Apesar de poder melhorar em alguns pontos, “Jonas” ainda se prova como um romance elogiável pela forma natural que trata seu tema principal e o belo desenvolvimento de seus personagens.

Lívia Almeida
@livvvalmeida

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