Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 08 de março de 2020

Vilões (2019): divertido e inesperado

Filme de Dan Berk e Robert Olsen consegue equilibrar bem o humor ácido com o suspense, resultando numa obra competente.

“Vilões” conta a história de Jules (Maika Monroe) e Mickey (Bill Skarsgård), um casal fora da lei que sobrevive de pequenos assaltos. Dispostos a começar uma nova vida e deixar o crime para trás, seus planos são interrompidos quando seu carro quebra no meio da estrada. Tentando contornar a situação de forma rápida, eles invadem a casa mais próxima para conseguir um novo veículo. Ao invés de uma ação eficiente como planejada, os dois se encontram nas mãos do casal Gloria (Kyra Sedgwick) e George (Jeffrey Donovan) que, inicialmente parecem não querer problemas. Porém, aos poucos, começam a mostrar seu lado sombrio num jogo de gato e rato que pode ter consequências drásticas para todos.

O que poderia ser apenas mais um suspense indie esquecível é elevado pelos seus aspectos técnicos, boas atuações e desenrolar imprevisível. Maika Monroe e Bill Skarsgård apresentam ótimas performances cômicas bastante diferentes de seus outros trabalhos (ela, em sua grande maioria, interpreta personagens introspectivas e ele, em anos recentes, tem escolhido projetos mais voltados para o terror), representando uma dupla de ladrões que se drogam constantemente e tomam atitudes, no mínimo, questionáveis. Eles são completamente despreparados para a vida do crime, mas tem um elo muito grande que os conecta de forma verdadeira. Os atores possuem uma excelente química e o roteiro realmente faz questão de vender o seu relacionamento como grande parte da história, reservando momentos para aprofundar a relação e fazer a audiência compreender a dinâmica entre os dois.

No aspecto central da trama dirigida por Dan Berk e Robert Olsen (ambos de “O Corpo”) há um paralelo possível com “O Homem nas Trevas”, terror de 2016 que traz uma proposta similar com protagonistas que igualmente cometem atos criminosos e encontram surpresas não muito boas. Enquanto o outro filme se leva a sério, esse de 2019 contém comédia em sua narrativa, o que torna mais fácil torcer, de fato, pelos personagens principais apesar de seus comportamentos moralmente errados.

Entregando performances caricatas que contemplam bem a atmosfera do filme, os antagonistas apresentam camadas de desenvolvimento e motivos (apesar de nem sempre tão sólidos) para suas ações. As interações entre os dois casais são sempre interessantes por existir uma dose de imprevisibilidade que parte de comportamentos erráticos, mesmo que de formas diferentes: enquanto os jovens são explosivos por qualquer besteira, os mais velhos querem passar um ar maior de tranquilidade ao passo que suas atitudes podem ser consideradas muito piores. Acompanhar as tentativas de manipulação de parte a parte é um dos momentos mais divertidos da narrativa.

O filme não consegue fugir totalmente dos clichês, principalmente na construção de Gloria e George. Entretanto, o espectador fica sempre se perguntando o que vai acontecer a seguir, tornando a experiência de seguir a loucura dos personagens ainda melhor – talvez a maior realização do roteiro escrito por Berk e Olsen. Em certo ponto, a história se direciona mais para a comédia do que para o suspense, até mesmo com uma trilha sonora que favorece o aspecto cômico. No entanto, as mudanças de tom são equilibradas eficientemente.

Os aspectos técnicos também são dignos de elogios: os quadros são bem centralizados, lembrando o estilo que Wes Anderson utiliza em suas obras (até com uma paleta de cores similar a “Os Excêntricos Tenenbaums”), o que acaba dando um tom fora do convencional para o filme e criando imagens únicas. A fotografia de Matt Michael aposta em enquadramentos que criam paralelos entre os casais e são visualmente interessantes.

“Vilões” pode não trazer nada de exatamente novo para o gênero, porém seu texto bem construído e as atuações precisamente complementares se juntam para trazer uma obra divertida e surpreendentemente emocionante em alguns momentos. Apesar de seus defeitos, continua sendo uma obra atraente a ser conferida pelos fãs do estilo.

Lívia Almeida
@livvvalmeida

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