Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Voando Alto (2019): essa história já foi contada

Uma bonita animação, que tenta ensinar e passar mensagens positivas, mas que não tem o "know-how" para fazer e acaba se tornado repetitiva e sem graça.

Com o lançamento inicialmente previsto para 2017, o primeiro filme animado da Luxx Studio, conhecida pelo seu trabalho de efeitos especiais do sucesso “O Grande Hotel Budapeste”, ficou mais um tempo “cozinhando”, nos fazendo crer que seria algo magnífico. No entanto, quando foi lançado em 2019, “Voando Alto” causou decepção.  

A obra conta a história de Manou. Ele vive com a família gaivota – sua mãe protetora, o pai rigoroso e chefe do bando e o irmão mais novo, que é seu companheiro e o admira muito. Só tem um problema: Manou é uma andorinha, uma espécie de ave que é justamente marginalizada pelas próprias gaivotas. Ele foi adotado depois de ser tornar órfão e cresceu tendo que provar seu valor a todo momento e tentando se encaixar e ser igual aos outros, ainda que fosse impossível, sofrendo exclusão e servindo de chacota dos outros membros do bando. Uma história que lembra o clássico “Patinho Feio” e que, em tempos de discussão de rótulos e de preconceito, poderia dar certo se inovasse na abordagem, mas parece um filme que já foi visto, mais de uma vez. 

Mesmo com todas as dificuldades e diferenças, Manou consegue se destacar ao ganhar uma corrida contra os outros de seu bando e isso lhe rende felicitações e aprovação, mas que duram apenas alguns instantes, já que logo depois é desaprovado e expulso pelo próprio pai. Ele então vai se descobrir e conhecer, com ajuda de novos amigos, as coisas incríveis que o tornam quem é. É reforçada a ideia do famoso ditado de que “uma andorinha não faz verão” e que é preciso trabalhar em equipe, não excluir porque o outro é diferente e ter autoaceitação. São valores legais de serem passados para as crianças, mas não inéditos.

Falando em crianças, o filme é contraditório no que diz respeito ao público alvo. O roteiro é bobo demais, as falas são engessadas e cheias de frases de efeito. Sendo assim, só crianças muito pequenas não iriam se incomodar. Porém, tem cenas bem pesadas como a do pássaro Percival, que está preso numa gaiola e vê, numa feira, outras aves presas, depenadas, mortas e até sem cabeça (inclusive, essa é a cena do primeiro teaser, lançado em 2016). Quando o mesmo pássaro vai para o cemitério numa noite chuvosa, uma trilha sinistra causa desconforto até em um adulto. Dessa forma, é difícil avaliar a faixa etária com a qual o filme pretende dialogar. Inclusive, o próprio papel do Percival fica dúbio – ele que parece tentar ser ora guia da aventura, ora o alívio cômico, mas que acaba não sendo nenhum dos dois. Com um aspecto sinistro, termina só sendo bobo. 

O que salva são as paisagens, muito interessantes. É inegável o detalhismo e a beleza de alguns cenários, panorâmicas de tirar o fôlego e pôr do sol inspirador. Em nenhum momento é falado onde estão geograficamente, mas construíram uma vila bem característica e tipicamente francesa, com elementos como cafés, lambretas e ruas parecidas com as que se vê em Nice, na França. No entanto, ela é pouco explorada e o que mais aparece é o monótono rochedo onde mora Manou, sua família gaivota e, no outro lado, as andorinhas. Ambos os lados têm o mesmo aspecto, o que torna desinteressante e não marca bem a diferença dos grupos. 

No final, uma pessoa extremamente atenta aos detalhes iria perceber uma crítica ecológica, que é quando um bebê gaivota, após comer, fica com um pedaço de anzol preso no bico. Se fosse mais explorado esse aspecto, em tempos de preocupação com o planeta Terra e redução do lixo, teria engrandecido e adicionado mais propriedade ao filme, mas não foi o caso.

“Voando Alto” é um filme que tenta passar mensagens encorajadoras, mas falha na execução do roteiro, montagem e direção. Seus personagens não cativam o espectador, mesmo dublados na sua versão original por nomes grandes como Kate Winslet, Willem Dafoe e Rob Paulsen em papéis coadjuvantes. Infelizmente, o voo da obra é um tanto no raso.

Maduda Freitas
@MadudaFreitas

Compartilhe