Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Morto Não Fala (2018): entre a vida e a morte

Com excelentes atuações, mas um péssimo uso de efeitos especiais, primeiro longa-metragem do diretor Dennison Ramalho tem boas intenções.

Baseado num conto de Marco de Castro, “Morto Não Fala” é um terror dirigido por Dennison Ramalho, estreante no comando de longas-metragens. Acostumado com o gênero, o diretor tem carreira como roteirista. Ele escreveu “Encarnação do Demônio”, com José Mojica Marins, o Zé do Caixão, e trabalhou nas séries “Supermax” e “Carcereiros”. A obra conta a história de Stênio (Daniel de Oliveira), um homem que trabalha durante a madrugada no Instituto Médico Legal (IML) em um bairro violento em São Paulo.

Stênio tem o dom (ou a maldição) de se comunicar com os mortos. Sua relação com a esposa Odete (Fabiula Nascimento), que já estava desgastada, fica ainda pior quando um morto avisa que sua mulher tem um caso com Jaime (Marco Ricca), dono da padaria do bairro. Ligando as informações ditas pelos mortos que chegavam ao necrotério, Stênio cria um plano para o assassinato de Jaime. Desenvolvendo causa e efeito do acontecimento, o roteiro volta a sua atenção para a nova vida do protagonista, que vive atormentado enquanto tenta cuidar dos filhos do casal, Ciça (Annalara Prates) e Edson (Cauã Martins).

O sofrimento do protagonista demonstra como é exaustiva a vida das pessoas que convivem diariamente com a morte. Entretanto, sem saber lidar com as pessoas, sejam vivas ou mortas, Stênio aguarda que as coisas aconteçam e não toma a frente em nada. Assim, Lara (Bianca Comparato), filha de Jaime, é chamada para cuidar das crianças em casa enquanto ele segue em seu trabalho cada vez mais incomodado.

Ao invés de utilizar maquiagem nos próprios atores, o diretor escolhe usar efeitos visuais para simular as expressões faciais dos mortos com uma voz mixada. Utilizando CGI para apresentar a proposta, a precariedade dos efeitos e a falta de sincronização entre imagem e som causam uma sensação de estranhamento desnecessária.

Apostando no gore e em uma fotografia cinzenta, o filme não se apoia em sustos fáceis. O crescimento de tensão é acompanhado de um progresso dramático, focando na história da família em meio ao terror. Ao mesmo tempo que consegue mais tempo para desenvolver os seus personagens, o filme fica excessivamente longo – são cerca de duas horas para avançar com uma história que acaba se repetindo ao demonstrar os mais diversos níveis de loucura que uma pessoa pode atingir.

Excessivamente explicativo, o texto de Dennison e Claudia Jouvin não dá brecha para o espectador suspeitar de algo. Com excelentes atuações de Daniel de Oliveira e Bianca Comparato, as cenas com interações da dupla são as melhores do filme, ajudando a criar uma tensão para o terceiro ato. “Morto Não Fala” tem boas intenções em um gênero que ainda é pouco representado no Brasil, mas peca ao apostar de forma desnecessária em um CGI ruim em cenas essenciais.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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