Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 06 de agosto de 2019

Meu Amigo Enzo (2019): história bonitinha de cachorro

O filme de cachorro, baseado em um livro premiado, entrega alguns risos e lágrimas, mas é confuso e os personagens não se aplicam totalmente.

Enzo (Kevin Costner) é um narrador-personagem, frustrado por só poder ser observador devido as suas limitações como um cão. Ele é um dourado golden retriever, comprado ainda filhote pelo piloto de corrida Denny Swift (Milo Ventimiglia), com quem cria uma ligação especial de admiração e amor durante toda a sua vida. É impossível não o comparar com o grande sucesso “Marley e Eu”, que inclusive é do mesmo estúdio. Mas diferente de seu “conterrâneo”, “Meu Amigo Enzo” é um drama com ares mais tristes e momentos bem “pesados”, mas que às vezes demonstra pitadas de comédia bem dosadas e eficientes dentro da narrativa, provocando sorrisos e até risadinhas. Enquanto Marley é visto e contado através dos olhos de seu dono, Enzo é o responsável por apresentar a sua versão e visão dos fatos.

Muito embora tenha momentos louváveis e descontraídos, Enzo é um cão muito perfeitinho, e essa excelência o “robotizou” e tornou-o irreal. Ele tenta o tempo todo, mesmo com suas limitações, ajudar, entender e estar ao lado da sua família e esconde qualquer insatisfação que tenha, até quando tem ciúmes ou é gravemente negligenciado, mais de uma vez. O que acaba sendo contraditório com a proposta do filme, afinal espera-se que um cachorro com “alma de homem” não seja tão perfeito como ele se mostra, não criando tanta empatia com o público.

Outro ponto é a voz deslocada de Kevin Costner, que não combina com o personagem e ainda é um tanto monótona, sem muita emoção – característica comum a praticamente todos os demais papéis do filme. As interpretações, em geral, são estagnadas e medianas ou muito caricatas, como no caso dos sogros de Denny, apresentando o estereótipo de pais preocupados com o marido da filha (Eve, Amanda Seyfried) e que querem que ele tenha um emprego “normal”, pois está numa profissão perigosa. Falta carisma por parte de todo elenco, então é difícil torcer ou sofrer pelos personagens durante as crises e problemas enfrentados por eles.

O roteiro não deixa claro se a trajetória principal da história é a de Denny ou a de Enzo. Também é difícil entender qual o evento principal da trama, se é a doença de Eve, a luta pela guarda de Zoe (Ryan Kiera Armstrong), o sonho de Denny de ser um piloto de corrida de Fórmula 1, ou o sonho de Enzo de se tornar humano. O próprio cachorro que dá título à obra fica muitas vezes subutilizado, servindo apenas como narrador, o que torna a fala de Enzo ainda mais cansativa. O filme parece todo contado, não deixando espaço para o público apreciar a imagem e fazer suas próprias interpretações.

A direção de arte também decepciona ao mostrar a passagem de tempo de forma ineficaz por quase toda a duração do filme. Em dado momento, se passam 10 anos e nenhum corte de cabelo ou rugas mudam nos personagens humanos (menos Zoe, que cresce). Em relação aos cenários, são bem naturais, previsíveis e se adequam a narrativa. A fotografia tem momentos bonitos e que valorizam as cenas de velocidade.

O final é um bom e velho clichê, mas que alinhado com uma boa trilha, imagens e flashbacks apelativos, fica difícil segurar as lágrimas. É um filme bem “família” e que serve como entretenimento, principalmente se você é uma dog person . “Meu Amigo Enzo” será um bom companheiro durante quase 2 horas, dificilmente algo mais que isso.

Maduda Freitas
@MadudaFreitas

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