Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 22 de janeiro de 2019

O Menino Que Queria Ser Rei (2019): não fede nem cheira

A clássica história do Rei Arthur é recontada numa versão atualizada e focada no público infantil. Uma "Sessão da Tarde" que deve entreter as crianças e dar sono nos pais.

Sagas infantojuvenis não têm como requisito essencial a pretensão de tornarem-se grandes épicos. Fatalmente algumas obras alcançam tal posto, porém tais histórias raramente extrapolam seu próprio universo. “O Menino Que Queria Ser Rei” é um exemplo simples de como uma aventura pode se limitar dentro de si e não ambicionar ser o próximo “Harry Potter” de uma geração, seja tanto para o bem quanto para o mal.

Alex (Louis Serkis, de “Mogli: Entre Dois Mundos”) é um garoto que precisa lidar com os constantes ataques dos valentões Lance (Tom Taylor, de “A Torre Negra”) e Kaye (Rhianna Dorris, da série “Secret Life of Boys”) contra seu melhor amigo Bedders (Dean Chaumoo). Um dia, ao fugir da dupla, ele encontra a lendária espada Excalibur, que como seu novo portador, precisa agora enfrentar a meia-irmã do rei Arthur, Morgana (Rebecca Ferguson, de “Missão: Impossível – Efeito Fallout”), que está prestes a retomar seu poder. Para isso, ele deverá convencer seus agressores a se unirem a ele e ao mago Merlin (Angus Imrie), e assim salvar a Inglaterra.

Joe Cornish (“Ataque ao Prédio”) parece não ter grandes ambições como diretor. Seu filme não arrisca ir além do formulaico básico do cinema de aventura. Em especial, Cornish (que também assina o roteiro) segue à risca a jornada do herói, um formato de narrativa já bem desgastada, mas que pode funcionar muito bem para o público-alvo de sua obra. E essa consciência que o diretor demonstra ter é de longe o maior acerto do longa. Sem se preocupar em construir uma trama complexa e se beneficiando da boa e velha suspensão de descrença (a passividade com que a mãe de Alex encara toda a situação beira ao patético), o filme acaba resultando em momentos de muita emoção frenética que consegue balancear a jornada excessiva e desnecessariamente longa dos protagonistas.

Sugando o essencial das lendas arturianas, a obra se beneficia da ingenuidade que um público mais jovem costuma carregar para transpor a mitologia fundadora da Inglaterra para um contexto mais próximo de quem está assistindo a obra. O bullying, ameaça constante na vida de uma criança, é o gatilho onde tudo começa. E a honra demonstrada pelo jovem Alex em lidar com a situação traça o paralelo com a influência principal do filme.

Contudo, “O Menino Que Queria Ser Rei” sofre em se manter atrativo durante as desnecessárias duas horas de projeção. Em especial pela necessidade que Cornish tem de se prender demais à jornada do herói, fazendo com que Alex precise passar por todas as etapas, o que gera alguns momentos arrastados e que terminam em lugar nenhum. O segundo ato, por exemplo, parece uma soma de pequenos arcos, muitos dos quais não colaboram para a construção da narrativa, nem para a fazer a trama principal avançar. Servem apenas para forçar uma imagem de líder carismático em Alex, resultando num excesso de exposição enquanto ele ou Merlin precisam contar cada detalhe da jornada e de qual a sua real importância.

Merlin, por sua vez, surge como o pior personagem da trama. Os trejeitos exagerados que Angus cria para sua versão do mago soam bobas e ele trava a história, mesmo sendo o responsável por convocar o grupo para a missão principal. Nas poucas ocasiões em que sua participação se torna fundamental, ele é utilizado como um simples Deus ex machina, tirando o peso dos heróis.

Longe de ser um clássico, “O Menino Que Queria Ser Rei” é uma aventura simples, que não inova e se abraça no básico da jornada do herói para recontar a história do Rei Arthur. Focada no público-alvo, o longa acerta na forma e na linguagem, com alguns exageros que podem incomodar um espectador um pouco mais exigente. O resultado é um filme que não se destaca nem pelos méritos nem pelas falhas.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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