Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 12 de janeiro de 2019

Cidade dos Anjos (1998): um romance atemporal [CLÁSSICO]

Envolto pela trilha emocionante e atuações complacentes, "Cidade dos Anjos" é raro no gênero por fugir do piegas e nos agraciar com um drama de entrega.

Co-produzido entre Estados Unidos e Alemanha, Cidade dos Anjos é a refilmagem americana de “Asas do Desejo”, filme alemão lançado em 1987. A versão noventista é estrelada por Meg Ryan (“Ithaca”) e Nicolas Cage (“Mandy”), com o diretor Brad Silberling (“Um Homem Comum”) marcando o cinema com a tocante trilha de Gabriel Yared e cravando o romance como o melhor filme de sua carreira.

Acompanhamos a narrativa pelo ponto de vista de Seth (Cage), um anjo que vaga por uma Los Angeles invisível aos olhos humanos. Sua função, como a dos demais anjos, é influenciar as pessoas a fim de evitar fatalidades. Eles tocam os homens para o bem, mas sem que percebam. Quando alguém morre, um dos anjos se torna visível e age como seu companheiro de viagem para o além. O protagonista passa a maior parte do tempo num hospital de Los Angeles protegendo os pacientes. É no centro cirúrgico que ele descobre o sofrimento de Maggie (Ryan), uma dedicada cirurgiã que o faz questionar sua existência.

Toda manhã e tarde os anjos se reúnem na praia para ouvirem o som celestial. O filme aborda de uma maneira poética a relação entre os anjos e Deus, embora não entre em detalhes divinos. Visualmente, os anjos não são como as figuras comumente associadas a eles, aqui usando sobretudos pretos e não possuindo asas. Eles falam entre si e caminham calmamente pelas ruas, ou observam do alto dos prédios. Nicolas Cage tem muita química com Meg Ryan, e seu olhar apaixonado foge das habituais caretas do ator. Seth se encanta pelo altruísmo inocente de Maggie, que o inspira a tentar abrir mão de sua imortalidade para viver na Terra com a jovem médica.

Enquanto os demais anjos rodeiam todos os indivíduos igualmente, o protagonista começa a dar mais atenção à médica. É aí que o paciente Nathaniel (Dennis Franz, de “We Believe”) revela para Seth que já foi um anjo, que abdicou da sua imortalidade para viver como homem ao lado de sua mulher. Mesmo relutante de início, como é abordado em suas conversas com Cassiel (Andre Braugher, da série “Brooklyn Nine-Nine”), o personagem de Cage decide experimentar a dor humana e seguir seu coração. Do momento que Maggie começa a desconfiar da verdade por trás de Seth, a narrativa se desenrola melhor, e ela toma para si o olhar curioso do romance.

“Cidade dos Anjos” continua relevante por fugir do melodrama, afinal, a proposta é criativa e o filme é bem executado. As constantes câmeras lentas embaladas pela trilha dão um clima de videoclipe, mas funciona pelo carisma dos protagonistas. O longa aborda a morte e a consequência dela. E nesse quesito, a história é concisa por levar o tema até o fim, fugindo da fórmula batida dos finais felizes. Pois, da mesma maneira que Maggie se entrega aos pacientes, Seth faz o mesmo por ela. Fica a mensagem de que ser bom não é o suficiente, o amor é doar. Talvez seja isso que falte nos romances contemporâneos. E na carreira de Nicolas Cage.

Jefferson José
@JeffersonJose_M

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