Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 04 de dezembro de 2018

Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro (2018): o terror do politicamente incorreto

O humor mordaz de Danilo Gentili encontra o terror ao lado de uma trupe de comediantes num filme sem sustentação, mas que busca ter sua própria personalidade.

Danilo Gentili criou um nome e uma legião de fãs (e haters) por apostar no humor politicamente incorreto. Em nova parceria com o diretor e produtor Fabrício Bittar (“Como se Tornar o Pior Aluno da Escola”), o humorista fortalece seu rastro ácido e distinto no cinema nacional em “Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro”. A desculpa para as piadas de mau gosto consciente dessa vez está na assombração da famosa criatura da mitologia contemporânea brasileira, cuja lenda se confunde com a da fantasma gringa Bloody Mary. Para combater a aparição da Loira do Banheiro, o alter ego de Danilo, o “engenheiro espectral” Jack, atua numa equipe de comediantes Caça-Fantasmas profissionais Caça-Assombrações ao lado da paranormal Caroline (Dani Calabresa, “Desculpe o Transtorno”) e do líder Fred, interpretado por Léo Lins em sua estreia nas telonas.

Decepcionados com a queda das visualizações do seu canal no YouTube, os Caça-Assombrações gastam suas últimas fichas na produção de um piloto de programa de TV sobre seus questionáveis encontros com o sobrenatural. Não há dinheiro nem para pagar o aluguel do escritório para o açougueiro Alcides (Carlos Massa, vulgo Ratinho, “A Grande Vitória”), tio de Túlio, o explorado assistente da equipe, interpretado pelo também humorista principiante nos cinemas Murilo Couto. As autocríticas que a trupe faz ao brincar com a decadência do trabalho dos Caça-Assombrações servem como alusões ao próprio humor sujo de Gentili, cujas piadas chamam atenção para as limitações do longa e sugerem que o filme não seja levado a sério. Essas desculpas espalhadas no roteiro buscam preveni-lo de críticas negativas, porém, acabam diminuindo a obra como um todo, inclusive seus pontos positivos como a unidade visual e a excelente maquiagem necessária para os efeitos do gore crescente. Para sorte (ou azar) da equipe de youtubers, seus serviços são convocados quando o espírito da Loira do Banheiro começa a causar problemas para uma escola, possuindo e atacando quem se atreve a cruzar seu caminho com poderes que deixariam satisfeito o colega vilão Freddy Krueger de “A Hora do Pesadelo“.

Apesar do bom trabalho de produção, Bittar deixa os atores soltos, comprometendo um tom único para o filme. A atuação “canastra” de Danilo e Léo Lins é válida para o estilo autorreferencial, mas destoa da alinhada comédia de Murilo e da veterana do teatro Bárbara Bruno, e também deixa que o domínio das participações especiais do apresentador Sikêra Júnior e do humorista Antônio Tabet (“Porta dos Fundos: Contrato Vitalício”) roubem para eles cenas que não acrescentam nada à história central. O barrigudo roteiro também por vezes cede a citações obscuras, como sobre as personas de Gentili e de Sikêra, e por outras, explica desnecessariamente muitas de suas piadas, subestimando o espectador ligado na cultura popular e prejudicando a diversão de identificar sozinho as referências, como a que conecta o elenco adolescente ao nome da personagem de Bárbara Bruno, “professora Helena”.

Servindo a um humor discutível e escatológico, a ação de “Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro” não é de todo inventiva, mas valoriza um bom e raro exercício tupiniquim de um gênero híbrido difícil de ser realizado. Combinando horror com comédia de gosto duvidoso, Fabrício Bittar possui em suas mãos boas construções de sustos, montagem de cenas e um tratamento diferenciado de som e efeitos práticos, que não possuem coesão nem equilíbrio, mas divertem quem procura o filme de peito aberto. Há uma regra despretensiosa de uma dupla de críticos ingleses que define um filme como boa comédia quando ele provoca pelo menos seis risadas na plateia. Dadas as contra-indicações e bastante cientes que não é possível agradar a todo mundo, os “Exterminadores do Além” passam no teste e configuram uma entrada decente no “terrir” nacional.

William Sousa
@williamsousa

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