Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 04 de novembro de 2017

Depois Daquela Montanha (2017): Romance fraco numa situação improvável

As situações vividas por Kate Winslet e Idris Elba teriam todo o potencial de indicações a prêmios. Porém o roteiro fraco e o excesso de clichês tornam o filme mais cansativo do que interessante.

Filmes de pessoas perdidas em ambientes isolados não são novidades. Isso, porém, não significa que esse tipo de enredo esteja esgotado. Afinal, sempre podem surgir boas histórias que, com bons atores, nos comovem e se mostram verdadeiramente interessantes. Porém, quando a história não é bem contada, nem o elenco tem como fazer milagre.

“Depois Daquela Montanha”, adaptação do livro homônimo de Charles Martin, está nessa segunda categoria. O filme conta com uma dupla de protagonistas que não deixa dúvida com relação à habilidade na atuação (Kate Winslet de “Beleza Oculta” e Idris Elba de “Thor: Ragnarok”). A história, que poderia entregar um ótimo filme, não é bem executada.

Na trama, a jornalista Alex (Winslet) e Ben (Elba) o médico Ben iriam pegar o mesmo avião, mas o voo é cancelado por conta de uma tempestade. Alex decide fretar um jatinho e chama Ben para dividir os custos e a viagem. Durante esse vôo o piloto sofre um ataque cardíaco, fazendo o avião cair numa região montanhosa e deserta.

O filme tem um começo bem construído, apresentando os protagonistas de forma direta, com conversas pelo celular. Assim, o roteiro não perde tempo em nos dizer quem é quem. As informações que faltam, logo são entregues, antes ainda do acidente. Dessa forma, após a queda do avião, quando Ben demonstra saber o que está fazendo, fica fácil para o público aceitar, pois já sabemos que ele é um médico. Porém os méritos do roteiro não vão muito além dessa introdução de personagens.

As situações criadas são pouco prováveis. A começar com a sequência do acidente. A tentativa de criar uma situação problemática fica exagerada quando o piloto tem uma parada cardíaca no mesmo momento que o avião passa por uma turbulência. Qualquer uma das duas condições já seria suficiente para justificar a queda, mas o exagero forçado é mais uma tentativa de nos obrigar a acreditar. Não seria necessariamente um problema, caso o filme não se levasse tão a sério. Porém, ao tentar criar uma situações de emergência, reforçada pela fotografia do filme que consegue enquadrar muito bem o cenário das montanhas, fica evidente a tentativa de passar a sensação de realidade. Essa tentativa se perde ao longo da execução.

O diretor Hany Abu-Assad (“Omar”) entrega um filme tão difícil de convencer o público do problema vivido pelos personagens, que quase todas as situações criadas acabam se perdendo ao longo da narrativa. Desde a barba de Ben, que parece não crescer, e o cabelo de Alex, sempre bem arrumado, até a aparência física de ambos. Numa condição de isolamento, numa montanha congelada e com pouca comida era de se esperar que ambos fossem emagrecendo, o que não acontece. Isso faz com que o público não encare aquela situação com a agressividade que deveria.

Cabe, então, a Kate Winslet e Idris Elba a função de cativar o público através de seus personagens. Winslet é convincente como uma jornalista teimosa e motivada. Sua personagem tem uma boa construção ao longo do filme o que, somado à boa atuação, reforça a condição de alguém que está há algumas semanas perdida numa montanha. Da mesma forma, Idris Elba consegue passar bem a insegurança de Ben nos momentos em que precisa tomar uma decisão para sobreviver, mas exita com medo das consequências de tentar descer a montanha.

O filme ainda brinca com o extracampo para causar um certo incômodo. Em diversas cenas a câmera começa a fazer um movimento quando um dos protagonistas enxergam alguma coisa no cenário. Porém o movimento termina enquadrando apenas o personagem, deixando o público sem saber o que foi visto, se é algum abrigo ou um animal selvagem.

Ao fim, o que temos é uma história de sobrevivência que não convence na sensação de perigo e emergência, da mesma forma como o romance entre os personagens oscila entre o aceitável e o forçado. É uma história que desperdiça o potencial do elenco principal e se perde numa execução ruim e nos clichês de um subgênero que precisa ser renovado.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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