Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de dezembro de 2014

O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (2014): um novo adeus à Terra-média

Entretendo mais pelo impacto de suas cenas de ação que por sua narrativa ou personagens, trata-se de um filme divertido, mas que deixa um gosto amargo na boca por seu potencial desperdiçado.

Hobbit_A_Batalha_dos_Cinco_ExercitosCom este “O Hobbit – A Batalha dos Cinco Exércitos”, Peter Jackson finaliza sua segunda trilogia de Terra-média. Apesar do filme ter 145 minutos de duração (e sabe lá Eru quanto terá em sua versão estendida), não há muito conteúdo, isso porque se trata de um tântrico clímax da história iniciada em Uma Jornada Inesperada, lá em 2012. Apesar disso, este é certamente o mais divertido dessa trilogia, justamente por ser o episódio onde as pontas abertas se fecham, algumas de maneira satisfatória, outras… nem tanto.

Inexplicavelmente, a fita abre com a ira do dragão Smaug (Benedict Cumbetbatch) caindo sobre a Cidade do Lago, após ser “despertado” pelo hobbit Bilbo (Martin Freeman) e pela companhia de Thorin (Richard Armitage), na tentativa do príncipe anão de recuperar sua terra natal, Erebor. Digo inexplicavelmente porque, mesmo a cena sendo absolutamente incrível, não há uma razão sequer para ela não ter sido incluída no capítulo anterior (“A Desolação de Smaug“), onde funcionaria como um fecho muito melhor do que o fraco confronto entre a companhia e o ganancioso lagarto que encerrou aquela fita.

Após o ataque de Smaug, os humanos sobreviventes, liderados pelo arqueiro Bard (Luke Evans), partem para Erebor, para reclamar a parte do tesouro que Thorin os havia prometido, que seria usada para reconstruir suas vidas após a destruição da Cidade do Lago.

Quem também se dirige ao reino dos anões é o Rei Thranduil (Lee Pace), o arrogante elfo que quer recuperar joias que seriam de sua propriedade. No entanto, Thorin se vê acometido pela “doença do dragão”, estando dominado pela cobiça e avareza, para desespero de Bilbo, que vê a nobreza do líder da companhia dando lugar a um sentimento obsessivo de posse (tema recorrente da hexalogia, aliás).

Paralelamente, o Necromante (Benedict Cumbetbatch, novamente) mantém Gandalf (Ian McKellen) preso, enquanto suas hordas também se preparam para marchar sobre Erebor, desejando o local por sua posição estratégica. Todos esses interesses conflitantes acabam desencadeando a batalha que dá título ao longa e que ocupa mais de 1/3 da projeção.

O fato é que todo o conflito em Angmar entre o Necromante, Gandalf e o Conselho Branco (que vinha sendo preparado desde o primeiro filme) é resolvido em menos de cinco minutos, em uma cena com muito fanservice (algo que se repetiria ao longo do filme) e pouco satisfativa, com Jackson desperdiçando as participações de Cate Blanchett, Hugo Weaving e Chistopher Lee, certamente o que se sai melhor dos três, por impor uma presença física invejável no alto de seus quase 90 anos, não só pelas cenas de luta (realizadas por dublês e por computação gráfica), mas pela própria fisionomia severa do veterano ator.

Enquanto isso, a relação entre Bilbo e Thorin, que deveria ser o coração do filme, acaba escondida por trás de toda pirotecnia das batalhas que, por mais impressionantes que sejam (e realmente o são), acabam diminuídas por falta de maiores riscos emocionais do público dentro delas, afinal, sabemos que Bilbo, Gandalf e Legolas (Orlando Bloom) sobreviverão ao conflito para participarem de “O Senhor dos Anéis” posteriormente.

E por melhores que Freeman e Armitage estejam em seus respectivos papéis e exibam uma belíssima química quando dividem a tela, Jackson investiu muito pouco nas virtudes de Thorin nos filmes anteriores para que sua submissão ao ouro aqui se mostrasse surpreendente ou dolorosa, o que tira o impacto do dilema de Bilbo e até mesmo o arco dramático de Thorin neste capítulo final. Martin Freeman está perfeito como Bilbo e brilha quando os holofotes caem sobre ele, mas esses momentos são como pequenas melodias em meio à cacofonia de estrondos de guerra.

Visualmente, trata-se de uma obra de tirar o fôlego e, por mais que Jackson tenha se entregue a alguns vícios exagerados, especialmente no uso do slow motion, é impossível negar sua competência ao oferecer ao público sequências de batalhas que, mesmo complexas e grandiosas, jamais se tornam ininteligíveis (aprenda, Michael Bay) e oferecem momentos bastante divertidos, como o inevitável show do Legolas, que se tornou quase uma tradição em meio à hexalogia do Anel e a troca de cumprimentos entre Thorin e Dain Pé-de-Ferro (Billy Connolly) em meio ao caos.

Mesmo assim, não deixa de ser triste que uma história tão bacana como “O Hobbit” tenha gerado dois filmes medianos e um terceiro que só se destaca dos demais por conta da ação e não de seus personagens, com exceção daqueles que já conhecíamos da trilogia anterior, tendo ainda a trilogia o disparate de se encerrar sem deixar muito claro o destino de Erebor, justamente o objeto de desejo que desencadeou toda a jornada.

É um bom entretenimento que deixa um gosto amargo na boca por conta do potencial desperdiçado, tanto de narrativa, quanto de material humano.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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