Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 19 de abril de 2013

Ginger & Rosa (2012): o drama do fim atinge dois universos

Com um tom quase melodramático, longa mostra os conflitos da adolescência no contexto da Guerra Fria e tem na atuação de Elle Fanning seu grande trunfo.

Ginger“Assim é a maneira que o mundo acaba. Não num estouro…”, diz uma das protagonistas do novo filme de Sally Potter (“Por que Choram os Homens”, de 2000), lendo T. S. Elliot em busca de alguma esperança. Em “Ginger & Rosa”, a esperança é buscada, já que os grandes estouros nucleares que abalaram cidades japonesas durante a Segunda Guerra são apenas um anúncio do fim do mundo em duas escalas diferentes: global e individual.

O longa acompanha as adolescentes que o dão nome: a ruiva Ginger (Elle Fanning) e a morena Rosa (Alice Englert), que passam pelos dilemas e descobertas naturais desta fase enquanto sofrem os efeitos de uma Inglaterra que ainda se recupera da Segunda Guerra. As duas nascem em famílias próximas e crescem amigas e cúmplices em suas experiências, fumam os primeiros cigarros, realizam descobertas sexuais, encolhem seus jeans em uma banheira e alisam os cabelos. Entretanto, tal amizade torna-se abalada à medida que o mundo de uma delas sofre ameaças de desabar como as cidades atacadas pela bomba.

Apesar de bastante amigas, utilizando figurinos iguais ou bastante parecidos, e de compartilharem problemas (ambas possuem uma relação conturbada com suas mães), suas personalidades são tão diferente quanto a cor de seus cabelos. A ruiva (Fanning) é eloquente e politicamente engajada, abalada pela tensão política da Guerra Fria que se desenvolve com ameaça de um conflito nuclear; enquanto a morena (Englert) é tão romântica quanto a amiga, mas mais impulsiva e busca a estabilidade pessoal, algo que sua mãe não teve, como forma de superar os conflitos da época. A interação entre estas diferentes personalidades é ilustrada, desde os primeiros minutos, de maneira criativa na fotografia que alterna uma paleta mais escura nas cenas com outras de cores mais avermelhadas.

A diretora consegue trabalhar com um elenco de peso enquanto conduz os efeitos de um conflito mundial e da liberação sexual da década de 1960 em suas personagens: Christina Hendricks surge como a infeliz Natalie, mãe de Ginger, sempre apoiada pelo casal de homossexuais, ambos chamados Mark, interpretados de maneira discreta, mas interessante por Oliver Platt e Timothy Spall.  Annete Benning tem um papel um pouco menor do que os de costume, sendo uma ativista americana e referência para a menina ativista, enquanto Alessandro Nivola vive o cínico intelectual Roland, que justifica atitudes duvidosas por meio do ideal de liberdade.

A produção apresenta seu elenco em boa forma, mas é nas protagonistas que encontramos seu verdadeiro brilho. Se Englert torna-se uma calada e introspectiva Rosa, Fanning, aos 14 anos de idade já mostra uma maturidade impressionante ao interpretar sua conflituosa e poética personagem. A atriz mirim com porte de “gente grande” impressiona com as nuances de seu trabalho que, pouco a pouco, mostra uma explosão de sentimentos e decepções, seja em uma tensa discussão com sua melhor amiga ou quando chora guardando um segredo que parece querer sair de qualquer jeito pela boca trêmula no clímax do filme.

Potter segue de perto todas as reações da jovem atriz. A diretora abusa de primeiros e primeiríssimos planos e confere por vezes um incômodo tom novelesco à projeção. A escolha na utilização da câmera na mão em diversos momentos confere um caráter íntimo e pessoal e enfatiza a situação de fragilidade da personagem principal. Redundante, tenta, sem sucesso, criar rimas que são bastante óbvias e dispensáveis, como a de um disco que só termina sua música em uma outra cena na qual uma conversa é terminada com seus pontos de vista reafirmados. Responsável também pelo roteiro, Potter desenvolve um texto com falhas e diálogos repetitivos, além de tornar a narrativa quase melodramática, exagerando em alguns pontos e entediando em outros, como em alguns poemas ou notícias jornalísticas que parecem querer reforçar por repetição o contexto.

A direção de arte revela cores escuras e desbotadas em uma triste e tensa Londres que ainda verá o brilho com os efeitos do movimento hippie alguns anos depois. Fazendo uso de combinações de cores, relações entre personagens são estabelecidas como a de Ginger, sempre vestida em tom complementar ao seu chamativo cabelo, e seus confortantes padrinhos, cuja decoração da casa é realizada em cores também complementares.

Os choques vividos por Fanning ao longo da narrativa são revelados pela fotografia que desfoca situações como se a personagem não quisesse ver o que se passa, enquanto a montagem utiliza de maneira construtiva recursos como o jump cut e cortes mais bruscos em momentos de conflito mais direto com sua  personalidade que, apesar de madura, é bastante jovem para assimilar emocionalmente determinados fatos, cortando parte deles de sua percepção.

Tendo como destaque um elenco com boas participações e uma interpretação (sempre) impressionante de Elle Fanning, “Ginger & Rosa quase chega ao melodrama, mas consegue expor com eficiência os escombros de dois universos bastante danificados.

Mateus Almeida
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