Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 19 de junho de 2010

Toy Story 3 (2010): Pixar não se cansa de produzir obras-primas

Sem esquecer as risadas e as aventuras, a Pixar entrega seu longa-metragem mais melancólico em continuação perfeita para uma franquia já histórica.

Nunca é demais exaltar a Pixar. A cada ano uma nova animação salta aos olhos da crítica e do público. Cinéfilos das mais diversas idades correm para a sala escura para conferir o que John Lasseter e companhia prepararam dessa vez. A expectativa é sempre alta para assistirmos a mais um filme com o selo de qualidade do estúdio, e dificilmente eles decepcionam. Mesmo em “Carros”, um dos longas mais fracos da Pixar, ainda há muito a ser apreciado. E quando eles acertam em cheio, como em “Wall-E”, o deleite visual é apenas parte da irretocável história que eles têm para nos contar.

Resgatar “Toy Story”, dez anos depois do segundo filme, reforça que arriscar também é uma das virtudes do estúdio. Significa o retorno à franquia que marcou época no cinema mundial, tendo alçado a Pixar ao status que hoje mantém com folga. Mas eles sabem definitivamente onde estão pisando. Conhecem os passos que devem ser dados para alcançar o mesmo sucesso e, melhor ainda, os que devem ser dados para superá-lo. Isso mesmo. “Toy Story 3” é melhor que seus antecessores e encerra com lágrimas de felicidade o que já era histórico.

A genialidade já começa na premissa da trama. A passagem de tempo em relação ao último filme é respeitada e agora Andy está prestes a ingressar na faculdade e deixar sua casa. Woody, Buzz Lightyear e todos os outros brinquedos há tempos lutam por um momento ao lado de seu dono. Estão abandonados no baú do quarto, mas logo terão seus destinos modificados. Andy deve decidir o que fazer com eles e acaba optando por deixá-los no sótão, com exceção de Woody. Um confusão, porém, leva-os para uma creche cheia de brinquedos, onde encontram amigos, inimigos e aventura, sempre na busca por um novo lar para viver.

Dirigido por Lee Unkrich (co-diretor de “Procurando Nemo” e “Monstros S.A”), em substituição a John Lasseter, “Toy Story 3” toca facilmente o coração do espectador, especialmente de adultos e adolescentes. É um filme melancólico, triste, que emociona por abordar temas universais, como a amizade, o amor, a despedida e até mesmo a morte. É impossível não se afeiçoar com a trajetória de vida dos brinquedos, apaixonados por seu dono, mas cientes de que o adeus é praticamente inevitável. Eles irão se separar para sempre, com a dor profunda que essas duas palavras trazem consigo.

No entanto, não falta humor. O roteiro de Michael Arndt (“Pequena Miss Sunshine”) sabe como transitar de suas mais altas pretensões humanísticas para a comédia. Novos personagens cumprem muito bem essa função, como o hilário e vaidoso Ken (responsável por uma das melhores cenas de todo o filme), enquanto os “veteranos” também fazem suas piadas, como o Sr. e a Sra. Cabeça de Batata, ou mesmo Buzz, sempre com seus problemas funcionais não menos engraçados.

Os vilões assustam como poucos. Colocar Lotso, um urso rosa com cheiro de morango, para liderar um exército do mal funciona com eficiência, principalmente depois que suas frustrações são reveladas para o público. Um bebê gigante como seu comparsa traz um horror extra para os atos maléficos da trupe. A aventura decorrente do confronto gerado por essas diferenças de caráter também é das mais empolgantes, com direito a planos meticulosamente combinados e executados com o mais alto grau de originalidade.

Os diálogos podem até nem ser dos melhores construídos pela Pixar. E nem poderiam. Afinal, os personagens principais são brinquedos infantis. Mas o roteiro busca responder a cada frase dita aparentemente sem explicação ou  justificar a inserção de algo ou alguém despudoradamente. Aqui, então, encontra-se o diferencial do estúdio. Nada é por acaso. A intenção está em cada palavra dita e ação montada. Até mesmo boa parte das piadas trazem algum significado. O detalhe do gosto musical do lixeiro é apenas um exemplo de quão meticuloso é o roteiro.

Tecnicamente, o filme vibra. É uma mistura de cores fortes que hipnotizam nossos olhos e não nos deixam desgrudar da tela. Já havia sido assim há quinze anos, quando “Toy Story”, o primeiro longa-metragem da história feito por computação gráfica, foi lançado. E nada mudou. Uma cena ilustra bem a magia que os produtores conseguem empreender no filme. Ao chegarem à creche pela primeira vez, Woody e companhia avistam uma série de outros brinquedos ainda “desacordados” devido a presença de um humano. A expectativa para conferirmos todos eles com vida já nos maravilha, e, assim que o humano deixa o quarto, a expectativa é superada. Faltam adjetivos para definir a sequência.

Faltam também palavras para explicar porque “Toy Story 3” é tão bom. É uma mistura de sentimentos puros que nos envolvem a cada cena protagonizada pelos brinquedos de Andy. Um desfecho perfeito encerra o filme e não se espante se ao final dos créditos seus olhos estiverem marejados. É simplesmente o resultado da harmonia de um longa-metragem pertencente a um estúdio que, felizmente, não se cansa de produzir obras-primas da animação. Mais uma vez, palmas para a Pixar.

Darlano Didimo
@rapadura

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