Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 21 de maio de 2006

O Código Da Vinci (2006): um filme interessante e um bom divertimento

Finalmente um dos filmes mais esperados e polêmicos do ano chega às telonas mundiais e continua causando divisão de opiniões acerca do conteúdo da produção. Apesar da adaptação da obra de Dan Brown se encaixar na categoria dos blockbusters, pode ser que não ganhe a simpatia de todos, principalmente dos que leram o livro.

O Código da Vinci conta a história de Robert Langdon, um simbologista e professor que é chamado ao Museu de Louvre onde o curador do lugar foi assassinado, deixando, antes de sua morte, vários enigmas e símbolos. Nesse meio tempo, Robert conhece Sophie Neuveu, criptógrafa da polícia e neta da vítima. Juntos e guiados pelos símbolos misteriosos, os personagens descobrem mensagens nas obras de Leonardo da Vinci que levam a uma sociedade secreta cuja missão é proteger um segredo sobre Jesus Cristo que poderia mudar a história que a Igreja Católica construiu há mais de 2.000 anos.

Saí particularmente satisfeito do filme. Digo isso porque além de eu não ter lido a obra, já estava esperando algo que não prendesse minha atenção, o que não aconteceu. Como não li o livro, procurei me informar antes sobre tudo que ele trata e li algumas polêmicas que ele vem causando. Sem poder comparar muito, fiquem cientes que minha análise aqui será basicamente a respeito da produção cinematográfica, não sendo alvo de comparações literárias. Como todo bom blockbuster feito para vender e arrastar milhões de pessoas às salas de projeção e arrecadar horrores, O Código da Vinci já ganhou desde o primeiro momento: milhões de livros vendidos e a atenção da imprensa quando soube da adaptação às telonas. A partir daí, a Igreja tem sido perturbada pelo conteúdo controverso e polêmico que será mostrado para a população, além do medo que a fé religiosa das pessoas sejam abaladas. Fora isso, antes mesmo de estrear mundialmente, O Código foi inevitavelmente alvo de tantos burburinhos que só arrastou mais e mais curiosos para os cinemas provocando lucro certo.

Acredito que O Código não seja um daqueles filmes que vá ter opiniões muito parecidas. Cada um tem sua base religiosa (ou não) e tem suas crenças, ficando difícil ter uma homogeneidade acerca da produção, mas o mais importante que a película (assim como o livro) vem mexer em todos no geral é para gerar discussão. Por mais que acreditemos em uma história já contada sobre a Igreja e o seu Salvador, ficamos inquietos quando vemos a possibilidade de termos sido criados com um segredo que desmentiria toda essa história. Daí chega a hora de sentarmos e nos conscientizarmos que o filme é uma ficção; ele mostra uma possibilidade que não precisamos aceitar. Talvez seja esse o desgosto de muitos críticos e espectadores: achar que o imposto pelo filme é para ser aceito, contradizendo toda sua bagagem religiosa construída até hoje. É muito complicado falar de religião, então prefiro sempre me abster de conversas do tipo para não causar mal estar. Em relação ao Código, vemos que tanto os crentes e não-crentes na história que é contada têm sua participação e seus argumentos.

Uma vez que seja mais uma adaptação, temos que assistir cientes que muito do livro será descartado e que apenas o importante será exibido. Apesar de não ter lido o livro, observei que o roteiro teve um caráter muito informativo, deixando os personagens meio soltos e sem uma análise psicológica tão profunda. Com diálogos que visam instruir o público ao que será trabalhado, pode ser que aqueles que não tenham conhecimento da história ou se confundam ou fiquem boiando, apenas deslumbrados com o encaminhamento dos fatos. Imagino também que aos que leram a obra de Brown, o filme pareça menos interessante, cansativo e sem emoção, pois essas pessoas já sabem das reviravoltas que acontecerão e não ficam na expectativa acerca do que está para acontecer. Isso não significa que os leitores se decepcionarão por completo, mas acredito sim que essa (grande) parcela de pessoas terão a tendência a achar o filme apenas mediano. O roteiro foi muito sucinto, expondo logo seus objetivos e deixando o público em meio a um tratamento de choque. Claro, as horas que dispõe nos cinemas não são suficientes para que tudo seja dito detalhadamente, mas acho que algumas partes do filme poderiam ter sido excluídas por serem dispensáveis e serem substituídas por algo mais importante. Sem falar do final angelical, onde parece que tudo que foi apresentado se disfarçando de anti-herói, tenta amenizar o conteúdo e fica, digamos, do lado da Igreja. Além disso, o uso de flashbacks foi bem encaixado, esclarecendo rapidamente os diálogos que estavam sendo traçados, mas acaba sendo muito superficial e aparentando uma facilidade dos fatos que nos questionamos se realmente existiu. Como muitas produções cinematográficas, O Código acaba seguindo uma linha que torna-se previsível, o que acredito firmemente que no livro não deva existir.

A direção de Ron Howard foi competente. Várias sacadas foram bem empregadas e a câmera brinca com diversas possibilidades de enquadramento. Dispondo de cenários verdadeiros como o próprio Museu de Louvre, a produção ganhou bastante realidade, apesar de não ter tido autorização para filmar no interior da Abadia de Westminster, em Londres, se conformando apenas com as imagens feitas pela parte de fora. Howard veio abrir espaço para si no cinema internacional e deixar suas marcas registradas, semelhantes a alguns trabalhos anteriores, conseguindo lidar bem com os momentos de ação e drama de forma bem desenvolvida.

Tom Hanks está apenas bem. O ator já conseguiu uma estabilidade profissional abrindo espaço para Audrey Tautou, a eterna Amelie Poulain. A moça consegue atrair atenção e carisma do público, apesar de ser uma atuação meio irritante e da sua leve inexpressão em algumas cenas. Ninguém é perfeito, nem ela. Mas talvez o grande destaque tenha sido o monge assassino Silas, interpretado por Paul Bettany. Ele, juntamente à direção, conseguiu montar o personagem mais sombrio e verdadeiro da trama. Silas conseguiu passar medo e ao mesmo tempo mostrava sua fragilidade ao se torturar para pagar os pecados. Todas as seqüências com Bettany são dignas de aplausos e mostram o talento do ator. O sarcástico Sir Leigh Teabing, personagem de Ian McKellen é outro que nos traz bons momentos, arrancando sorrisinhos tímidos de alguns.

Mesmo sendo muito compacto e apenas informativo, O Código da Vinci vem para mexer com a sociedade em todos os âmbitos. Mas antes que tenhamos uma opinião, tenhamos argumentos para defendê-la e não nos apoiar apenas no “não gostei”. E lembrem-se: o filme é uma ficção, você não está ali para acreditar, e sim para presenciar uma hipótese de algo que foge totalmente aos padrões históricos e religiosos que o mundo conhece. Sem olhar crítico, o máximo que você vai fazer é sair do cinema, desgostar do filme e ir embora. Enfim, no geral o filme é interessante e um bom divertimento. Peca um pouco, mas agrada. E digam o que disser, oito estrelas!

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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