Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Cliente, O

Seu começo demonstra alguns tons de suspense, imprimindo até alguns pequenos suspiros, mas nada demais. Vale a pena assistir, mas não perderia muita coisa se fizesse o contrário. Mesmo que a capa do DVD seja bem sugestiva, não se atraia por ela.

Quando vamos fazer um bom bolo, precisamos de vários ingredientes. Se um desses desagradar o paladar de quem o provar, é um fracasso. Às vezes nem um fracasso completo, mas quando não se tem o que esperava, então de alguma forma se torna um fiasco. Talvez a essência esteja até boa, mas no todo, você não conseguirá falar bem dela para outra pessoa. Alguém pode até se sentir atraído por tal, entretanto, para a pessoa que aquilo foi feito, não surtirá nenhum efeito agradável.

Eu sou um ávido expectador das projeções de suspense. Elas começam como quem não quer nada e quando você nota, está envolvido e coisa alguma o fará tirar o olho do local onde a dita cuja esteja passando. Esse é o real trabalho do suspense, prender a atenção do espectador, de uma forma tão suave que nem esse mesmo sinta o que está acontecendo. Para isso, da mesma forma como um bom bolo, todos os ingredientes têm que estar proporcionalmente relativos. Se, por ventura, algum faltar, algum outro terá de compensá-lo, de maneira que, a ausência do primeiro passe despercebida. Um filme de suspense é feito para um público exigente. Os quais enxergam qualquer furo e, por isso, torna-se uma missão difícil agradar esses admiradores de maneira plena. A mínima brecha, um clímax falho ou algo do tipo, já os frustra.

‘O Cliente’ é uma película agradável, se olhada de longe ou assistindo-o por assistir, sem estar a procura de algo intrigante. Ele conta a trama de um garoto e seu irmão ao presenciarem um suicídio. O mais velho, Mark Sway (Bad Renfro), é deveras teimoso, dificultando a missão de alguém interessado em convence-lo de algo contrario ao que ele pretende seguir. Já o mais novo, Ricky Sway (David Speck), é frágil, entrando facilmente em choque com a cena presenciada. Após o desenrolar, aparecem ainda o personagem de Tommy Lee Jones, Roy Foltrigg, um promotor público que, tentando arrancar a verdade do garoto Mark, não sai da cola dele. A fim de garantir seus direitos, entra em cena a advogada Reggie Love, que fora encarnada por Susan Saradon. Tal personagem tem alguns traumas do passado, os quais são revelados em um flashback oral no momento certo, entretanto, antes disso, não são bem explorados, sendo assim menos um ponto da receita do suspense.

O direto Joel Schumacher deixou a desejar bastante. Esse vinha de O Dossiê Pelicano e sabe do que é preciso para se ter um filme intrigante e envolvente. Mas, por provável incompetência sua, ele falha. Incompetência essa despojada pelo fato do filme ter um bom roteiro e bons ou razoáveis atores, o que em equipe poderia ser compensado facilmente. Como havia dito anteriormente, a falta de algo deve ser compensada. Joel peca por demais no momento fundamental, o clímax. Era para, antes de demonstra-lo explora-lo melhor e ter colocado uma boa trilha sonora, com a finalidade de envolver completamente.

Por falar em trilha sonora, essa também fica para trás. Só a percebi porque não agüentava mais ver uma cena e comecei a me tocar o quanto ela é ruim. Tão ruim que passa totalmente despercebida. Nenhum ‘tchaaan’ na hora certa. Nada para causar suspiros intrigantes e uma falta de acompanhamento musical na hora do clímax, que venhamos e convenhamos, já estava cheio de erros de continuidade perceptíveis a olhos um pouco mais atentos.

Voltando ao assunto Joel Schumacher, até que ele deu mostras de um bom suspense pelos quadros iniciais. Sua trama estava sendo conduzida paulatinamente e sem furos, mas do nada isso piora e, um pouco depois do meio da projeção, nos perdemos quanto aos fatos. “Como aquilo foi parar ali? Como isso apareceu? Como ele consegue fazer isso?”. Esperei até que fosse esclarecido, mas me liguei que não dava pra ser, pois não era algo do ápice. Eram falhas sobre falhas, que, quando tentavam ser consertadas, desconsertavam de vez. Vale ressaltar que o filme se caminhava para dois focos. Um para a mãe de Mark e seu filho mais novo no hospital e o outro para a encruzilhada triangular entre Mark, Foltrigg e Reggie. O que seria interessante, logo, quando um dos dois estivesse irregular o outro poderia compensar. Infelizmente, houve um trágico corte no foco coadjuvante, o da mãe de Mark, que de uma hora para outra eles somem e não sabemos como fica a situação de Ricky no hospital (os médicos deram dois dias para voltar ao normal).

O elenco não justificou seus nomes, com exceção de Brad Renfro, estreando nas telonas. Ele protagoniza um papel complicado, inclusive vindo a dar algumas tragadas em cigarro – para um menino de 11 anos, é de se chamar atenção. Pareceu mesmo um garoto revoltadinho que gosta de aparecer e com a virtude da inteligência. O que não tornou seu papel melhor foi o fato de não parecer ter 11 anos. Digo, fisicamente. Tommy Lee Jones, quando surge, faz sua parte. O que não deveria ter acontecido, pois o ator vinha de um Oscar por O Fugitivo e deveria, além de fazer a sua parte, salvar um pouco a de quem não fez, no caso Susan Saradon; fraca. Não impressiona de forma alguma. Algo que não é justificável por ela passar muito tempo em cena, hajavista que sua personagem era simples. Ela se complicou nos momentos mais simples. Anthony LaPaglia, Barry ‘Lâmina’ Muldano também tropeça em si mesmo. De forma passível J.T. Walsh e Ossie Davis aparecem na história e cumprem bem o que lhes foi resignado. O primeiro é o gangster Jason McThune e o segundo o juiz Harry Roosevelt.

Apesar dos pesares o filme não é algo que se jogue fora completamente. Alterna muito e, mesmo que se colocasse numa balança, o equilíbrio prevaleceria. As vezes um começo ruim culminando com um final bom é mais marcante do que um começo agradável e um final deprimente.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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