Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 22 de julho de 2016

A Última Premonição (2015): terror que não aterroriza

De um lado, acerta no roteiro: mesmo longe da inteligência desejável, foi elaborado sem preguiça e com a preocupação de ser coerente. De outro, a direção é lastimável: não assusta ninguém (a não ser a protagonista).

O espectador comum que busca nos filmes de terror momentos de tensão e saltos da poltrona (literalmente) possivelmente ficará decepcionado com “A Última Premonição”, que não tem êxito neste quesito. Contudo, o esmero na construção de um roteiro que não deixa pontas soltas merece atenção.

O nome original (“Visions”) se revela mais apropriado: após um traumático acidente de carro, Eveleigh passa enxergar eventos que as demais pessoas não enxergam. Com o passar do tempo, seu marido David passa a exigir que ela volte a tomar antidepressivos (que iniciou a ingerir em razão do acidente), pois as visões se tornam cada vez mais graves e ameaçam até mesmo sua gravidez. Por outro lado, sua amiga Sadie acredita que as visões são reais, e não alucinações resultantes da abstinência do remédio. Defende ainda que são resultado de um sexto sentido aflorado, que não poderia ser desperdiçado.

Tudo que foge do usual que Eveleigh vê a assusta: barulho de chaleira vindo do nada, personagem aparentemente possuída, metal que se mexe sozinho, pessoa usando capuz à noite, moedas que ficam “de pé”, garrafas que explodem, vidro que se quebra, e assim por diante. O que pode assustar o público é o perigoso foco de dengue que ela encontra em seu terreno – é preciso convir que este perigo é maior que uma moeda que não cai. De resto, nada amedrontador (exceto para a protagonista).

Partindo de tal argumento, o roteiro brinca com a noção da realidade ao não deixar claro se o que acontece é resultado da paranormalidade que paira no local ou se são alucinações em razão da cessação do uso dos medicamentos. O que se sabe é que são visões que apenas Eveleigh enxerga, e que a assustam profundamente. O desfecho eclético é um alento ao fugir do lugar-comum no gênero terror, retomando de forma bastante coerente e crível (dentro daquele universo diegético, é claro) as visões da protagonista. Vale dizer, a narrativa foi construída para dar verossimilhança ao terceiro ato, ficando clara a preocupação em dar credibilidade ao conjunto. Afinal, atribuir as visões ao “mommy sense” ou à abstinência medicamentosa seria solução fácil e mesmo simplista. Em apertada síntese: o plot não é uma sequência sem reflexão, mas um conjunto pensado para ter coerência interna.

Um roteiro pensado não costuma ser virtude no terror, logo, cabe elogiar. Inclusive, isso quase apaga a falta de habilidade do diretor Kevin Greutert para elaborar uma imersão satisfatória no terreno do medo. Cabe, porém, fazer uma ressalva quanto ao desserviço prestado em relação ao uso de medicamentos: Eveleigh crê que o uso pode afetar seu bebê, quando caberia ao longa cumprir uma função pedagógica de mostrar ao espectador que, mediante acompanhamento médico, não há razão para temer a ingestão de tais drogas lícitas, inclusive antidepressivos. Trata-se de um tabu enraizado em muitos setores sociais e que, se o filme optou por abordar, poderia ter sido quebrado.

Embora o elenco conte com o famoso Jim Parsons como médico de Eveleigh, é Isla Fisher (como protagonista) quem recebe os holofotes, parecendo um pouco desconfortável com a responsabilidade neste longa. Não que Fisher tenha desempenho ruim, mas não convence como mocinha amedrontada – no drama, ela até vai bem; no terror, fica apagada. Até mesmo Anson Mount, que interpreta seu marido, aparenta maior desenvoltura.

“A Última Premonição” possui a virtude de não ser mais um terror de roteiro preguiçoso e incoerente. Porém, como filme de terror que é, mostra-se aquém do desejável ao não conseguir assustar.

Diogo Rodrigues Manassés
@diogo_rm

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