Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 03 de março de 2016

Horas Decisivas (2016): uma mistura indigeste de romance e desastre

Um sub-“Titanic” lançado quase 20 anos depois do longa de James Cameron, “Horas Decisivas” é uma mistura esdrúxula de filme-desastre com romance de Nicholas Sparks que tenta bravamente não afundar graças aos esforços de Casey Affleck.

253848Após um 2015 financeiramente perfeito, a Disney começa este ano com um verdadeiro naufrágio. Este “Horas Decisivas” é baseado no livro “The Finest Hours”, de Casey Sherman e Michael J. Tougia, sobre o naufrágio de dois petroleiros em 1952, após uma fortíssima tempestade, e da bravura dos homens da Guarda Costeira americana que tentaram salvar o maior número de vidas possíveis, apesar das dificuldades que tornavam o resgate praticamente uma missão suicida.

Essa trama que, em tese, teria tudo para agradar ao grande público (inclusive é uma das mais famosas missões da Guarda Costeira), se transformou em um emaranhado de clichês no roteiro escrito a seis mãos por Scott Silver, Paul Tamasy e Eric Johnson (trio responsável por “O Vencedor”). Dirigido pelo irregular Craig Gillespie com uma mão extremamente pesada, o filme resolve dividir o seu foco entre o desespero dos homens do petroleiro SS Pendelton e um romance água com açúcar que parece saído das páginas de um livro de Nicholas Sparks.

Chris Pine vive Bernie Webber, tímido membro da Guarda Costeira que se apaixona pela bela e decidida Miriam, vivida por Holliday Grainger. Quando os dois estão prestes a noivar, acontece o desastre e Bernie é enviado por seu superior, o Comandante Cluff (Eric Bana), para encontrar e resgatar o SS Pendelton. Enquanto isso, no petroleiro, o engenheiro-chefe Ray Sybert (Casey Affleck) tenta manter o que restou da embarcação flutuando, tendo de lidar também com o pânico que se espalha entre os seus homens.

Já por essa premissa dá pra ver que existem dois filmes brigando pelo mesmo espaço aqui. Toda vez que a trama protagonizada por Sybert vem à tona, “Horas Decisivas” melhora absurdamente. Não só os personagens e as situações desse plot são mais interessantes como até mesmo o design de produção que retrata os restos do SS Pendelton é mais eficiente e as cenas de ação que mostram seu iminente naufrágio são realmente tensas. Casey Affleck cria uma figura estóica e de poucas palavras com o seu Sybert e o modo como o engenheiro ganha a confiança da tripulação é bem inteligente, conquistando o respeito do público rapidamente.

No entanto, sessenta por cento da projeção é centrada em Bernie e Miriam. Não só o núcleo da Guarda Costeira é deveras monótono, como os próprios dilemas atravessados pelo casal, como o perigo da profissão dele e as inseguranças por um fracasso anterior são extremamente batidos.

A própria química do casal principal não é das melhores. Pine não está em seus melhores dias vivendo o oficial da Guarda Costeira, em uma interpretação excessivamente apagada enquanto Holliday Grainger, por mais que pareça ter saído de uma fotografia dos anos 1950 tem um arco absolutamente dispensável, servindo apenas como um complemento do plot de Bernie.

Conforme a projeção segue, Bernie vai assumindo cada vez mais riscos, ultrapassando a barreira da coragem e chegando na insanidade, em cenas extremamente artificiais, que usam e abusam de efeitos especiais nada convincentes. Enquanto isso, a sobriedade da interpretação de Affleck e o modo pé-no-chão com que a situação-limite que seu personagem é submetido quase redime o filme, que durante boa parte de sua projeção se contenta em ser um sub-“Titanic”.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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