Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 30 de novembro de 2015

A Visita (2015): M. Night Shyamalan dá sinal de vida

Mesmo fazendo um trabalho competente dentro do gênero que o consagrou, não é dessa vez que M. Night Shyamalan volta à sua melhor forma.

151029.jpg-r_640_600-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxA carreira de M. Night Shyamalan possui um gráfico notadamente decrescente, filme após filme o respeito pelo cineasta ia diminuindo na indústria, este que já foi comparado às lendas Alfred Hitchcock e Steven Spielberg. É realmente difícil acreditar que o criador do jovem clássico “O Sexto Sentido” (1999) tenha feito algo tão pavoroso quanto “O Último Mestre do Ar” (2010). E que no material de divulgação do também irregular “Depois da Terra” (2013), seu nome tenha sido camuflado por receio da produtora em relação à recepção do público.

No entanto, é impossível que o homem que coleciona títulos como “Corpo Fechado” (2000) e “A Vila” (2004) tenha esquecido totalmente o ofício da direção cinematográfica. Shyamalan já havia tido um suspiro na série “Wayward Pines” (2015), o show flertava com os temas já tratados por ele anteriormente, e quando foi divulgado o trailer de seu novo trabalho para cinema, “A Visita” chamava atenção não apenas pela nova empreitada de linguagem found footage, mas por explorar o suspense, ponto que mais se destacava nas obras do realizador.

A trama é bastante simples. Vemos a garota Becca (Olivia DeJonge) e o irmão caçula Tyler (Ed Oxenbould) indo visitar seus avós numa fazendo distante da civilização. Rapidamente os meninos descobrem que há algo de errado com os idosos, indo muito além de hábitos bizarros e afetações psicológicas, os velhos parecem estar envolvidos em coisas profundamente perturbadoras. Tornando a típica rotina dos guris em algo assustador, a dupla é atormentada das mais inusitadas maneiras.

A decisão de filmar o longa no formato de uma câmera de mão por parte dos protagonistas inicialmente parece soar um tanto artificial, principalmente pelos sofisticados enquadramentos e o trabalho fotográfico visto em tela. A iluminação é muito bem tratada, o cenário é favorável e as paletas de cores empregadas pela cinematografa Maryse Alberti são evidentes, apesar de aparecerem positivamente por conferir uma atmosfera frigida e tensa ao local.

Contudo, ao caminhar da trama, entendemos que o elemento found footage está ali basicamente como mais um dos tópicos clichês explorados propositalmente pelo diretor. Aliás, temos aqui um leque de fórmulas já utilizadas em títulos como “Atividade Paranormal” (2009) – a câmera escondida na estante – e “[REC]” (2007) – os closes e uma figura aterrorizante surgindo por trás na escuridão. Ou mesmo quando a garota brinca com citações feitas em “O Grito” (2002) e outras produções do estilo. Uma espécie de parodia que o diretor faz do gênero.

Mas engana-se quem pensa que Shyamalan perde a mão ao se aventurar por esse meio, como especialista em terror, o cineasta não vê problemas quando investe em momentos de maior suspense e geralmente consegue deixar o espectador ligado em tela e tomar alguns sustos. O roteiro também assinado por M. Night é direto e sóbrio. Os estranhos acontecimentos geralmente são justificados por explicações plausíveis normalmente ligadas às doenças e costumes da terceira idade. A história igualmente ganha pontos por trazer alegorias não apenas em relação à trama, mas temáticas e referenciais.

Talvez os maiores problemas do texto estejam em detalhes que são marcas do cineasta, como vemos em “Sinais” (2002) uma criança ter asma e isto ser utilizado como ferramenta para causar maior efeito ao personagem. Aqui ambos os irmãos possuem casos particulares, Tyle não suporta germes e Becca não consegue ver seu reflexo no espelho, novamente fobias utilizadas como artifícios beneficiando a trama, para dar um tom mais delicado à situação. E os momentos explorados dos tais tópicos são um tanto pasteurizados. Assim o característico final “revelador” surge como mais um artifício formulaico, cacoete recorrente que parece ter obrigação de existir nos contos do indiano.

Não podemos dizer que “A Visita” é a produção responsável por trazer M. Night Shyamalan de volta à ascensão na sétima arte, aliás, o filme está longe de ser memorável, é apenas correto. Entretanto devemos estar diante do início da reconstrução artística de um admirável cineasta estrangeiro que como poucos conquistou Hollywood, marcou uma década e inspirou outros profissionais mais jovens, apresentando filmes cinematograficamente ricos, de personagens incomuns e finais estrondosos. Os fãs e apreciadores do bom cinema ainda aguardam este retorno, e agora finalmente podem ter esperança.

Wilker Medeiros
@willtage

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